Com Ainda estou aqui (de Walter Salles) e Baby (de Marcelo Camelo), que arrancaram aplausos e prêmios em festivais pelo mundo neste ano, o cinema nacional está em alta e uma das apostas para 2025 é Ruas da Glória, filme de temática LGBTQIAP+, do diretor Felipe Sholl, que explora a realidade de garotos de programa no Rio de Janeiro. Ainda sem data de estreia no cinema, o longa teve sua estreia internacional no Tallinn Black Nights Film Festival, na Estônia, e foi muito bem recebido, mesmo em um contexto politicamente desafiador para questões LGBTQIAP+ na região.
"Foi transformador exibir o filme em um lugar tão próximo da Rússia, considerando os processos políticos homofóbicos da região. A reação do público foi extremamente positiva e mostrou como a arte pode tocar camadas profundas, mesmo em contextos de resistência", comenta Caio Macedo, que interpreta o protagonista Gabriel e contracena com Alejandro Claveaux.
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"Eu costumo falar que foi praticamente um Cristiane F. brasileiro, sabe? Drogado e prostituído", brinca Caio, que, para construir o personagem Gabriel, um garoto de programa que vive em meio a drogas e sexo, dedicou-se a um intenso processo de laboratório. Ele visitou locais de prostituição, entrevistou trabalhadores do sexo e mergulhou em suas histórias para trazer autenticidade ao papel. "Foi revelador. Esse estudo me fez quebrar preconceitos e entender a complexidade dessas pessoas. É um filme que fala sobre hipocrisia social, mas também sobre família, amor e amizade", explica.
Caio celebra o crescimento do cinema nacional, impulsionado pela presença em festivais internacionais e pela expansão das plataformas de streaming. "O audiovisual brasileiro se tornou referência mundial. Hoje, temos produções de altíssima qualidade sendo reconhecidas em Cannes, Berlim e Veneza. Isso é reflexo das leis de incentivo e do investimento em narrativas mais diversas e críticas", avalia.
Ele também reflete sobre a importância de ter produções brasileiras com temática LGBTQIAPN+, como Ruas da Glória, Baby e Motel Destino (de Karim Aïnouz), em festivais pelo mundo. "Para mim, é sempre importante falar sobre política e sobre a existência das pessoas LGBTQIAPN+, e seus contextos. Falar sobre essa questão é tocar na ferida e expor a crítica que queremos dizer, é dar voz a essas pessoas, sabe? E fazer com que elas falem sobre suas vidas e sobre as alegrias e dores de defender quem são. É muito importante entendermos que há uma diversidade imensa sobre o que é ser gay, sobre o que é ser trans, sobre o que é ser um garoto do programa, por exemplo", defende.
Engajamento social
Aos 30 anos, Caio é um rosto que se deve observar mais de perto. Ainda desconhecido do grande público, o rapaz transita por diferentes gêneros e plataformas, tendo participado de novelas, filmes de horror e séries como Lama dos dias (Globoplay), que aborda o surgimento do movimento Manguebeat.
Caio Macedo começou sua trajetória longe dos grandes centros de produção artística. Nascido em São José do Egito, no interior de Pernambuco, uma cidade marcada pela riqueza da cultura popular, onde a poesia e o cordel predominam, ele teve seu primeiro contato com a arte por meio de projetos culturais itinerantes. "O primeiro cinema que vi foi em uma praça. Era uma projeção de Central do Brasil, e aquilo me emocionou profundamente", relembra o ator.
Mesmo sem acesso a teatros ou cinemas formais em sua infância, o rapaz encontrou inspiração nas tradições culturais de sua terra natal, algo que ainda influencia suas atuações.
Além de sua atuação, Caio também utiliza a arte como ferramenta de transformação social. Ele é professor de teatro no projeto Encenando, que leva arte-educação a escolas em comunidades rurais de Duque de Caxias, no Rio de Janeiro. "É um projeto de resgate social. Venho de um contexto de vulnerabilidade e me vejo nessas crianças. Ensinar teatro é necessário porque a arte nos ensina a ser humanos melhores e mais empáticos", afirma.
O ator também é reconhecido por sua contribuição ao cinema de horror brasileiro, tendo atuado em produções como A noite amarela e O cemitério das armas perdidas. Ele está no elenco de Pedágio, de Carolina Markovicz, recebeu ótima aceitação de público e crítica, incluindo a trindade principal do Prêmio Grande Otelo do Cinema Brasileiro: melhor direção, roteiro e filme. Seu próximo trabalho no gênero, Prédio vazio, deve estrear em festivais nacionais no início do próximo ano. Para ele, é uma escola que estimula as capacidades interpretativas dos atores.
Embora ainda mantenha sigilo sobre seus próximos projetos, ele confirma que há novas produções em andamento, incluindo novelas. "A gente está encaminhando agora para projetos muito bons em 2025", finaliza ele, que participou da novela Terra e paixão (TV Globo), contracenando com grandes nomes como Tony Ramos e Cauã Reymond.