Em seu primeiro longa-metragem, o diretor Guilherme Bacalhao estreia Pacto da Viola, filme selecionado para a Mostra Competitiva Nacional no Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, a ser exibido hoje, às 21h no Cine Brasília. O filme conta a história de Alex, músico sertanejo fracassado que sonha em se tornar um músico igual seu pai, Lázaro. Alex retorna ao interior, em Urucuia, para cuidar do pai que está doente. Lázaro é capitão de folia e acredita que uma dívida com os santos garante a sua saúde, mas a cidade acha que a ligação é com o diabo.
Pacto da Viola é uma história que narra transformações de crenças pessoais em uma região do sertão que também está mudando. "As tradições e a cultura local estão sendo ameaçadas pela expansão do agronegócio, a música tradicional disputa com ritmos estrangeiros e a fé dos idosos perde espaço para o ceticismo dos jovens", descreve o diretor Guilherme Bacalhao. A inspiração para a produção vem de duas experiências de Guilherme, a sua vivência no interior e um estudo antropológico de Luzimar Paulo Pereira.
"Quando eu era criança e ia visitar meu pai no interior da Paraíba, era comum ouvir histórias fantásticas, como por exemplo, a história da cobra que mama no peito da mulher e coloca o rabo na boca do bebê para ele não chorar, mas que quando narradas com a credibilidade e a seriedade dos contadores de história do local me deixavam confuso entre a fé e a dúvida", conta o diretor sobre o que inspirou a criação do filme.
Além das suas vivências, o roteirista Roberto Robalinho apresentou a Guilherme o artigo As vicissitudes da fama: os dons divinos e os pactos demoníacos entre os tocadores de viola 10 cordas do Norte e Noroeste mineiro, que investiga histórias de pactos de violeiros no interior de Urucuia, município de Minas Gerais. "Essas histórias instigaram meu interesse e me encheram de perguntas: como as narrativas sobre pacto ainda resistem no mundo contemporâneo? São histórias tidas como lendas ou como fatos reais? De que forma essas crenças se comunicam com a fé cristã da Folia de Reis? Porque grande parte dessas narrativas estão ligadas à viola?", relata Guilherme.
A região é dividida entre grandes fazendas de soja de um lado e pequenas vilas com uma forte tradição cultural e religiosa que, muitas vezes, são formadas por pessoas da mesma família. Neste sentido, o filme também traz um viés político de resistência ao abordar um sertão em rápida transformação em que o "progresso" e o agronegócio da soja ameaçam a vegetação do sertão e a agricultura familiar, colocando em risco o universo narrativo no qual habitam esses violeiros e suas fabulações", destaca o diretor.
Guilherme tem sua experiência audiovisual marcada por documentários e pesquisa realizada para o filme foi semelhante a seu trabalho como documentarista. Apesar das questões fantásticas e de ser uma ficção, o filme tem um tom documental. A equipe realizou viagens de pesquisa para conversar com violeiros, capitães de folia e contadores de história. "Essas viagens serviram para incorporarmos as histórias e sugestões dos violeiros com quem conversamos", conta. A primeira viagem foi acompanhada pelo violeiro Cacai Nunes e, depois, a equipe retornou para aprofundar laços, escolher as locações de gravação e ouvir mais histórias.
Guilherme mora em Brasília desde 1991 e a equipe do filme é toda brasiliense. A fotografia, a montagem, o som e a atuação do filme contam com nomes de Brasília. Sobre o festival, o diretor comenta que o Festival de Brasília é fundamental para a formação de realizadores na cidade e que sempre esteve presente nas edições. "Então, é uma alegria poder exibir o filme no festival, onde já passaram tantos filmes e cineastas que a gente admira", destaca.
O diretor ainda comentou sobre as homenagens a Vladimir Carvalho, como o nome da sala de cinema criada para a 57ª edição. "As homenagens ao Vladimir são extremamente merecidas. Além de ser um importante e histórico documentarista brasileiro, Vladimir Carvalho tem uma importância enorme para o cinema de Brasília. Vladimir sempre foi extremamente generoso e incentivador dos novos realizadores", finaliza Guilherme Bacalhao.
57º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro
No Cine Brasília (EQS 106/107), nesta segunda, às 21h, Pacto de Viola (longa), com ingressos a R$ 20. Exibição ainda dos curtas Inflamável (de Rafael Ribeiro Gontijo, DF) e Javyju - Bom dia (de Kunha Rete e Carlos Eduardo Magalhães, SP). A partir das 20h, na Cia Lábios da Lua (Gama), no Complexo Cultural de Planaltina e na Faculdade Estácio (Taguatinga — Pistão Sul), a mesma programação tem entrada franca.