"É uma ideia que existe na cabeça e não tem a menor pretensão de acontecer." O verso escrito por Lulu Santos faz uma explicação simples do amor platônico, um amor que até existe, mas é inalcançável. Essa forma de amar é a sina de Bia e Victor, personagens de Bruna Marquezine e Sergio Malheiros, na série Amor da minha vida, estreia da semana na Disney+, que conta inclusive com uma nova versão da faixa de Lulu na abertura.
O seriado nacional acompanha esse casal de amigos em desventuras amorosas. Enquanto a protagonista de Marquezine não consegue se apegar e pula entre relacionamentos curtos, o personagem de Malheiros vive uma desilusão em namoro longo e o medo de voltar a uma vida sem rotina. Porém, a amizade que os dois cultivam pode guardar um amor romântico.
A ideia da série é trazer uma visão real para os relacionamentos, uma comédia romântica apegada às nuances, fácil de se relacionar e fincada na realidade. "O segredo da nossa série, sobre tudo e todos os tópicos dela, é tentar sempre ser real e identificável nos pequenos detalhes e não nos clichês", afirma o criador Matheus Souza.
A série se inspira em histórias distintas, tanto de Matheus quanto dos atores para quem escreveu os papéis. "A Bia é uma personagem muito rica, é basicamente um presente que o Matheus me deu", afirma Bruna Marquezine em entrevista à Revista. A intenção é trazer os questionamentos reais.
Uma dessas perguntas mora dentro da amizade entre Bia e Victor. "Quando você ama muito alguém, é quase inevitável você pensar: 'mas e se? Será?'. Isso não invalida em nada a amizade. É um questionamento possível", avalia Marquezine, que não descarta que haja amizade entre homens e mulheres. "Eu acredito muito que é possível ter uma amizade entre homem e mulher. Muitas vezes, ela evolui para um amor romântico e as pessoas perdem um pouco a crença, mas é possível. Só não é o caso da Bia e do Victor", pontua.
O único núcleo que os protagonistas não se relacionam romanticamente é com o casal de amigas Erika e Helena, vivido por Agda Couto e Pamela Morais. Agda é de Brasília. Nascida e criada em Taguatinga, a atriz está na segunda produção com a Disney — ela fez parte do elenco de Dois tempos. Agora, vive essa jovem passional que auxilia os protagonistas na caminhada em direção ao amor.
Agda entende que Amor da minha vida faz diferente em mostrar o que é possível e não um ideal utópico. "Tem uma coisa que eu gosto muito da série, ela tira um pouco essa visão de que o amor é uma coisa perfeita. Sendo que não é. Não é perfeito e não é fácil", diz a atriz. "Quando a gente escolhe amar uma pessoa, e eu não falo só de um amor romântico, falo de amizade e de família, a gente acorda todos os dias escolhendo amar aquela pessoa. Amar exige trabalho e esforço também. É preciso manter essa relação, e a outra pessoa também precisa querer", reflete.
A brasiliense também elogia o fato de a série colocar Erika e Helena como o casal modelo para os protagonistas. "Muito bonito que façam isso com um casal sáfico. Normalmente, esses romances são representados por amores impossíveis ou grandes tragédias", analisa.
Amor por Brasília
Além de Agda, três candangos são cruciais para a série. O criador Matheus Souza e os diretores René Sampaio e Tatiana Fragoso também nasceram ou foram radicados na capital. Portanto, a escolha foi que Bruna Marquezine vivesse uma protagonista brasiliense que acha Brasília entediante e tenta a vida no Rio de Janeiro como atriz. "Para mim, foi muito natural trazer Brasília para a série, tinha muita ligação de todo mundo com a cidade, e pareceu fazer sentido", conta René.
A vontade de se apegar aos detalhes, inclusive, não se ateve apenas à comédia romântica. A capital também foi representada de forma distinta. "A série não está nos lugares clichês em nenhum aspecto. Fugimos do cartão postal. Tem um frescor que a gente busca de ir para o real e o natural", diz Tatiana. "É a Brasília que as pessoas fazem parte", completa Matheus.
Para a única atriz de Brasília no elenco, a escolha por essa abordagem trouxe o coração brasiliense para perto da história por meio dos olhos. "A gente, brasiliense, é um povo muito orgulhoso. A gente gosta de ver pessoas saindo daqui e conquistando o mundo, então, eu me sinto completamente preenchida, feliz e satisfeita de estar num projeto deste tamanho, que é mostrar um pouquinho da nossa cidade também, e sai um pouquinho do eixo Rio-São Paulo que a gente conhece", comenta Agda Couto. "Eu acho que as pessoas têm uma visão muito deturpada do que é Brasília. A gente é muito apaixonado pela cidade. Então, mostrar um pouquinho do nosso quadradinho é muito especial", complementa.
Bruna, contudo, viveu a vida inteira no Rio e conheceu efetivamente Brasília durante a série. Porém, foi na cidade que ganhou outra mãe. "Eu não tenho uma relação com Brasília, eu criei uma memória especial quando a gente filmou aí. Era Dia das Mães, estava sem minha mãe e peguei a do Matheus emprestada. Almocei na casa deles e criei um amor por Brasília que não sei explicar", lembra. "Eu não sei o que eu faço no próximo Dia das Mães. Minha avó gosta mais da Bruna do que de mim", brinca o criador.
Vida de atriz
Para além do amor e de Brasília, um terceiro ponto é central na série: a metalinguagem. Amor da minha vida não é só sobre o romance, mas sobre amar a atuação. Bia tenta de toda forma emplacar, e todas as emoções que envolvem esse processo transbordam a tela. "Eu acho muito importante mostrar esse lado da profissão, a grande maioria dos atores vive isso, e só isso. É muito difícil acreditar nisso e viver só para isso em um país que não tem tanto investimento e incentivo à cultura", acredita Marquezine.
"A indústria lucra muito vendendo uma imagem glamourizada do que é a profissão. Isso não é uma verdade", critica a responsável pela protagonista. Mesmo já muito bem posicionada no mercado, com atuações em produções internacionais, Bruna sente isso na pele. "Eu vivo disso, mas a maior parte do tempo eu ainda faço um monte de teste, e sofro muito. Esses dias eu tive uma baita crise de ansiedade por causa de teste", confessa.
Se para uma atriz que cresceu na televisão, com grandes papéis, é difícil, para Agda, que está dando os primeiros passos agora, parece um monstro. "Eu me senti muito contemplada com todas as questões da Bia", recorda Agda. "Ver a personagem da Bruna Marquezine com as mesmas questões que eu, que as minhas amigas e que tantas pessoas traz um conforto no coração, de pensar que eu não estou sozinha", destaca. "Eu não sou a única que fica com crise de ansiedade para fazer teste. Eu não sou a única que não me sinto suficiente. Não me sinto bonita o suficiente, ou engraçada o suficiente. Eu acho que a gente se sente acolhida mesmo", completa.
Em outra posição na carreira, Agda detalha o que sente: "É um confronto diário entre desistir ou não desistir. Porque é uma vida muito instável, a gente não sabe o dia de amanhã. Tem uns dias de glória, que são muito legais, que eu acho que fazem tudo valer a pena. Porém, tem uns dias de luta, que a gente fica se perguntando se vale a pena mesmo".
"É uma realidade muito difícil o ator, que acredita na arte, entender a própria vocação. Eu entendo esse ofício como dom. Faço isso, porque só sei fazer isso, preciso fazer isso", explica Bruna, que tem um discurso muito alinhado com Agda, mesmo tendo começado em cidades e contextos diferentes. "Fui amadurecendo e vi que atuação era o que eu melhor sabia fazer, sou atriz porque não tinha nada que eu amasse e quisesse ser", diz a brasiliense.