Literatura

Poeta Anderson Braga-Horta celebra 90 anos com livro sobre a infância

O poeta Anderson Braga-Horta completa 90 anos com homenagens em um sarau e livro sobre os anos felizes da infância

Escritor Anderson Braga-Horta, um poeta à moda antiga -  (crédito: Arquivo pessoal)
Escritor Anderson Braga-Horta, um poeta à moda antiga - (crédito: Arquivo pessoal)

Anderson Braga-Horta começou a escrever os versos de Iniciações meio sem compromisso, mas com aquela sensação de que mergulhava no passado. Quando viu, uma coisa puxou a outra e o poeta trouxe para o papel uma série de memórias aquecidas pelo afeto e por boas lembranças. Como não sabia ao certo do que se tratava, escreveu logo o poema Advertência, no qual questiona: "Ao pensar em como oferecer ao leitor os textos aqui enfeixados, ocorre-me uma dúvida: serão eles poemas? crônicas?". Mais adiante, ele avisa: "Faça o leitor a leitura que lhe parecer. Soberanamente./Mas que fique registrado que teve o autor a pretensão de dar a estes breves relatos/de sua pequena trajetória humana/uma aura, ao menos, de poesia." E assim, está posta a dúvida, que em nada atrapalha a leitura desse livrinho delicado e afetuoso, o mais recente do poeta.

Anderson Braga-Horta nasceu em Carangola, no interior de Minas Gerais, mas passou parte da infância na Cidade de Goiás, onde chegou por volta dos 7 anos. Ficou, mais ou menos, até os 11 anos. "Pouco, mas foram anos muito intensos e especiais da infância, um período muito bom de minha vida, um período rico", lembra. "Era uma cidade encantadora, rica em natureza, antiga, relativamente pequena, mas com uma riqueza arquitetônica e urbanística." Vila Boa foi um dos primeiros poemas escritos para o livro. Quando viu, Braga-Horta havia escrito um livro inteirinho sobre a cidade. 

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O novo livro, ele diz, é diferente de tudo que já escreveu. "São memórias em versos", avisa. "Mas versos meio prosaicos, muito narrativos, de modo que eu mesmo me perguntei: é poesia, crônica? É um pouquinho de cada coisa. Acho muito diferente de toda a poesia que publiquei até então. Quando dei por mim, vi que estava fazendo um livro sobre minha infância em Goiás", confessa. É uma boa maneira de celebrar os 90 anos, que o poeta completa hoje e que serão celebrados no Sarau Pedra 90, organizado pelo amigo e poeta José Sóter. A intenção é reunir 90 poetas de Brasília para recitar os versos de Braga-Horta em um encontro na Biblioteca Nacional de Brasília marcado para as 17h do dia 21. 

Iniciações, de Anderson Braga-Horta
Iniciações, de Anderson Braga-Horta (foto: Divulgação)

Autor de, pelo menos, seis livros de poesia, incluindo este Iniciações; participação em antologias de poemas e contos e alguns livros de ensaios sobre a arte de escrever versos e de traduzir livros, Braga-Horta é um poeta à moda antiga, com uma formação clássica, que o fez passar por todas as escolas. Românticos, parnasianos, simbólicos, pré-modernos, ele bebeu em todos eles em um exercício que chama de "imitação", mas que desembocou em uma poesia consistente e estruturada. 

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Primeiro com versos bem medidos, respeitando métricas e formas, depois com mais liberdade, como os versos livres de Iniciações, o poeta se dedicou à prática de dominar as ferramentas para depois desconstruí-las. "Comecei imitando, até me familiarizar e entender o modernismo. Deixei de imitar toda aquela turma para imitar modernista também. E depois veio a 'desimitização', que é um aprendizado e pode ser negativo também", brinca. Em entrevista ao Correio, Anderson Braga-Horta fala sobre a funcionalidade da poesia e sobre as mais de seis décadas de dedicação aos versos. 

Entrevista//Anderson Braga-Horta

 

Em Iniciações, você se entrega ao verso livre e faz questão de notar isso. Por quê?

Eu pratico, indiferentemente, o verso medido e o verso livre. Minha formação é tradicional, então, meus primeiros anos, passei praticando verso medido. Quase todos. Fiz umas poucas tentativas no livre. E acho que só aprendi a manejar quando fui de Minas para o Rio de Janeiro. Mas Indicações não tem versos medidos, é tudo verso livre. Me parece que pus a tônica deste livro na memória, na narrativa. Mas é uma narrativa lírica, então, em relação a minha obra anterior, está mais perto da prosa. É o que pensei na ocasião. É um livro bem diferente do que queria escrever. E a diferença se resume também no tom confessional. É difícil falar sobre a própria obra porque o autor pensa uma coisa, e o leitor discorda. 

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Nesses anos todos escrevendo poesia, ocorre de vez em quando pensar para que servem os versos?

Tenho respondido, de vez em quando, a essa pergunta. Não serve para nada de útil, nada de prático. Mas tem serventia, sim. Descobri que o poema pode conter pensamento, elevado ou rasteiro, e pode conter música, beleza. Quando descobri isso, fiquei encantado, especialmente com os poemas românticos. A poesia serve também como veículo do belo. Para mim, pessoalmente, foi a razão maior de continuar escrevendo. E serve ainda como veículo de pensamento filosófico e político. Para que serve, afinal, a poesia? Ela tem uma função, sim, no âmbito da cultura, da inteligência, da vida humana. Serve para refinar o espírito, refinar a capacidade de pensar e a capacidade de sentir. É veículo de sentimento e de pensamento. Menosprezar a poesia é menosprezar uma das criações excelentes do homem.


O que te estimula a escrever?

O que me estimula a escrever poesia é o belo, o amor, o sentimento, a tentativa de entender a vida e a morte, mas também a raiva. Daí a poesia de sentido social, que também pratiquei, porque houve tempo para isso. Hoje, estou velho para isso, e o mundo está muito degringolado. 

Está trabalhando em algo agora?

Tenho uma poesia que andei escrevendo, em prosa mesmo, também como Iniciações, mas mais prosa do que poesia. São textos pequenos que têm o poético e também o testamental. São pequenos textos completos em si mesmo. 

Qual a fronteira entre a prosa e a poesia para você?

A prosa tem um sentido discursivo evidente, às vezes não se aproxima, dependendo. Prosa e ficção podem atingir certas qualidades poéticas. A fusão do narrativo com o poético pode ser um estrago, e talvez na maioria das vezes seja, mas pode produzir trabalhos geniais. É muito difícil. Mas, basicamente, a prosa literária se destaca pela narrativa, principalmente. Há prosas em que você não distingue a poesia. 

Você já se aventurou no conto, mas nunca no romance. Por quê?

Tentei e até comecei, mas descobri que não tenho convicção para escrever romance. Não tenho vocação. A minha vocação literária foi despertada pela poesia, por poetas de alto nível. Alarguei meu percurso poético para abranger também os clássicos, desde pré-Camões.

Serviço

Iniciações

De Anderson Braga-Horta. Tagore Editora, 78 páginas

 


  • Livro D&A
    Livro D&A Foto: Livro D&A
  • Capa livro Iniciações, de Anderson Braga-Horta
    Capa livro Iniciações, de Anderson Braga-Horta Foto: Divulgação
  • Escritor Anderson Braga-Horta, um poeta à moda antiga
    Escritor Anderson Braga-Horta, um poeta à moda antiga Foto: Arquivo pessoal
  • Iniciações, de Anderson Braga-Horta
    Iniciações, de Anderson Braga-Horta Foto: Divulgação
  • Escritor Anderson Braga-Horta, um poeta à moda antiga
    Escritor Anderson Braga-Horta, um poeta à moda antiga Foto: Arquivo pessoal
  • Livro Iniciações, de Anderson Braga Horta
    Livro Iniciações, de Anderson Braga Horta Foto: Divulgação
  • Livro Iniciações, de Anderson Braga Horta
    Livro Iniciações, de Anderson Braga Horta Foto: Divulgação
postado em 17/11/2024 06:00
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