O poeta e filósofo Antonio Cicero, deixou uma carta de despedida aos familiares e amigos antes de ser submetido a um procedimento de morte assistida na Suíça, nesta quarta-feira (23/10). O membro da Academia Brasileira de Letras (ABL) disse que estava com Alzheimer e que a vida dele tinha se tornado "insuportável". Antonio morreu com 79 anos.
"Não me lembro sequer de algumas coisas que ocorreram não apenas no passado remoto, mas mesmo de coisas que ocorreram ontem. Exceto os amigos mais íntimos, como vocês, não mais reconheço muitas pessoas que encontro na rua e com as quais já convivi. Não consigo mais escrever bons poemas nem bons ensaios de filosofia", afirmou o poeta.
"Pois bem, como sou ateu desde a adolescência, tenho consciência de que quem decide se minha vida vale a pena ou não sou eu mesmo. Espero ter vivido com dignidade e espero morrer com dignidade", continua a carta.
Quem era Antonio Cícero?
Antonio escreveu as letras das músicas Fullgás, Pra começar e À francesa – as duas primeiras em parceria com a irmã, Marina Lima.
Nascido no Rio de Janeiro, em 6 de outubro de 1945, Antonio estudou filosofia na PUC do Rio de Janeiro e, depois, no Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Em 1969, devido a problemas políticos, foi para Londres, onde conclui o curso de filosofia na Universidade de Londres. Em 1976, Cicero foi fazer pós-graduação na Georgetown University, nos Estados Unidos, onde estudou grego e latim, o que lhe permitiu ler no original clássicos como Homero, Píndaro, Horácio e Ovídio. Depois, ele deu aulas de filosofia e lógica, em universidades do Rio de Janeiro.
Veja a carta na íntegra:
Queridos amigos,
Encontro-me na Suíça, prestes a praticar eutanásia. O que ocorre é que minha vida se tornou insuportável. Estou sofrendo de Alzheimer.
Assim, não me lembro sequer de algumas coisas que ocorreram não apenas no passado remoto, mas mesmo de coisas que ocorreram ontem.
Exceto os amigos mais íntimos, como vocês, não mais reconheço muitas pessoas que encontro na rua e com as quais já convivi.
Não consigo mais escrever bons poemas nem bons ensaios de filosofia.
Não consigo me concentrar nem mesmo para ler, que era a coisa de que eu mais gostava no mundo.
Apesar de tudo isso, ainda estou lúcido bastante para reconhecer minha terrível situação.
A convivência com vocês, meus amigos, era uma das coisas – senão a coisa – mais importante da minha vida. Hoje, do jeito em que me encontro, fico até com vergonha de reencontrá-los.
Pois bem, como sou ateu desde a adolescência, tenho consciência de que quem decide se minha vida vale a pena ou não sou eu mesmo.
Espero ter vivido com dignidade e espero morrer com dignidade.
Eu os amo muito e lhes envio muitos beijos e abraços!"
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