Cinema

‘Terra de ciganos’, de Naji Sidki, chega aos cinemas

Foram mais de 10 mil quilômetros percorridos para a produção do filme, rodado em Minas Gerais, Paraíba, Alagoas, Bahia, Rio Grande do Norte e São Paulo

Reza a lenda que, antes da divisão em rom, sinti e calon, os ciganos eram privados da luz do sol, habitando o interior da Terra, no qual comiam raízes e batatas. A disposição a conviverem junto a borboletas, pássaros e flores foi condicionada à realidade de se tornarem nômades e adivinhos. "Mesmo hoje, eles vivem de modo extremamente tradicional, como no Brasil de 150 anos atrás. Os movimentos feministas, por exemplo, não chegaram neles. Não há registro de linguagem escrita. No domínio oral dos ciganos — que 'não falam a língua do P', diverte-se o cineasta Naji Sidki — o som é aportuguesado. "Aprendi o suficiente para, em meio à comunidade, cismarem que eu fosse cigano", conta o diretor brasiliense à frente do recém-lançado longa Terra de ciganos.

Entre casamentos arranjados, jovens mulheres com papéis sociais definidos e uma força na resistência de cultura, em número estimado de 800 mil, os ciganos no Brasil passam (no filme) pelo crivo dos consultores da Embaixada Cigana do Brasil, Ingrid e Nicolas Ramanush, para além das pesquisas do diretor realizadas junto com Kátia Coelho. "O filme acaba documentando a derradeira comunidade que, em 2018, em número pequeno ainda morava em barracas. Tinha visto grupos em Goiás, pessoas da etnia calon (que falavam o dialeto chibi), e fiquei intrigado com a cultura que vive no Brasil há tanto tempo", observa o realizador.

Foram mais de 10 mil quilômetros percorridos para a produção do filme, rodado em Minas Gerais, Paraíba, Alagoas, Bahia, Rio Grande do Norte e São Paulo, conta o cineasta, que é morador do Lago Norte e, aos 52 anos, se vê produto de três culturas, já que o pai Said é palestino, e a mãe Kathlyn é norte-americana. Com acessos a estudos acadêmicos na UnB, universidade em que os pais foram professores, no filme, Naji não endossa preconceitos e estereótipos. "Nos chamou a atenção o envolvimento da cultura com a execução musical e o canto."

Ex-aluno da New York University e de curso do Polo de Cinema de Sobradinho, em que teve aulas com o diretor de fotografia de O bandido da luz vermelha (1968), Carlos Ebert, Naji se afirmou como diretor de fotografia em mais de 20 curtas e foi codiretor de Afonso é uma Brazza (2015), filme vencedor do juri popular no Festival de Brasília do Cinema Brasileiro.

Ao custo de R$ 900 mil, o novo filme, que está em cartaz na Cinesystem do CasaPark, foi selecionado em edital da Ancine (2018). "Se há potencial limitado nas salas de cinema para documentários, acho que joga a favor do filme, ele não ser algo parado, de puro depoimento", reforça o cineasta.

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