Morreu, nesta quarta-feira (30/10), Arthur Moreira Lima, um dos maiores pianistas brasileiros. Com 84 anos, o artista estava internado no Hospital da Caridade, em Florianópolis, e lutava contra câncer de intestino há um ano.
Moreira Lima nasceu no Rio de Janeiro, em 1940, e começou a estudar piano ainda na infância, aos seis anos de idade. Dois anos depois, tocou Mozart junto à Orquestra Sinfônica Brasileira.
O velório dele será na quinta-feira (31/10), no cemitério Jardim da Paz, em Florianópolis, das 12h às 16h.
A carreira e o sucesso no Brasil e no exterior
Prestigiado internacionalmente, o músico ficou em segundo lugar, aos 25 anos, em uma das mais antigas competições de piano do mundo, a Fréderic Chopin, na Polônia. Aos 30, garantiu terceiro lugar na Internacional de Tchaikovsky, na Rússia.
Além dos países europeus, o pianista tocou nos Estados Unidos e na América Latina. Além da carreira internacional, ele também foi um renomado intérprete de clássicos da música popular brasileira, do choro e samba.
Em 1975, ele fez sucesso com um LP duplo em que interpretava canções de Ernesto Nazareth no piano, a quem reavivou na memória nacional.
Moreira Lima foi um dos responsáveis, também, pela democratização da cultura erudita, ao criar e participar de projetos sociais. De autoria dele, o projeto "Piano pela estrada" levava música, em um caminhão, a diversos lugares do Brasil.
"Um piano pela estrada"
Durante o projeto "Um piano pela estrada", Arthur Moreira Lima se apresentou para mais de 2 milhões de pessoas em praças públicas pelo Brasil. Com o piano de cauda a bordo de um caminhão, ele percorreu todas as unidades da federação e chegou a tocar para público de mais de 10 mil pessoas de uma só vez. A filosofia era divulgar a cultura pelo país.
Em entrevista ao Correio, publicada em maio de 2019, ele colocou em palavras a importância do projeto. "Foi maravilhoso ver como o brasileiro responde imediatamente a qualquer estímulo e como se sente honrado de você ter ido lá tocar pra ele. Não tem isso de que o povo não entende, ele entende o gesto, agora tem que escolher um programa acessível. Por isso, fico muito apreensivo de ver como o país está sendo mal manipulado. Está todo mundo meio perdido, até eu. Isso é sinal dos tempos, não é culpa da direita, da esquerda, do centro. É culpa do progresso material, que foi enorme sem haver um progresso espiritual e intelectual equivalente", disse.
Mesmo levando o piano para os mais diversos cantos do Brasil, Arthur era realista ao reconhecer que o gênero não fazia parte do universo brasileiro. "E não adianta fingir que faz, porque não faz. É uma cultura europeia e, como fomos colonizados com isso e nossos compositores beberam muito nessa fonte, eles são bastante sofisticados. A música clássica faz parte da cultura de uma pequena elite que é voltada para fora do Brasil. A gente precisa ser muito forte culturalmente para resistir à invasão de música estrangeira de qualidade duvidosa", acredita.
Um humanista
Na entrevista ao Correio em 2019, o artista destacou as preocupações com o futuro da humanidade e as mudanças na sociedade. "Preocupo-me muito com os rumos que o mundo está tomando. Não é só o Brasil, o mundo inteiro está assim, muito perturbado, sem encontrar uma fórmula de sobrevivência. Havia um equilíbrio muito difícil, precário, mas havia. Hoje em dia, a gente sente enorme desequilíbrio em tudo e é isso que me preocupa", diz
O artista reclamou da falta de diálogo generalizada no Brasil nos últimos tempos, tema capaz de fazê-lo parar de falar de música. "Não é que me ache essas coisas, mas, de vez em quando, me sinto muito mal cercado. Me dá uma tristeza. Não sei se é por causa da velhice, mas é difícil porque as pessoas não dialogam, não querem falar, não querem despertar para a realidade, não querem ver. Impressionante como as pessoas estão cada vez mais centradas no mundinho delas", lamenta.