No último dia 24, a novela Quatro por quatro, um dos maiores sucessos do horário das 19h dos anos 1990 na Globo, completou 30 anos. Um dos destaques do elenco desta produção foi Cristiana Oliveira que, no papel de Tatiana, umas das quatro mulheres que se unem para se vingarem dos ex-companheiros, consolidou o seu nome como atriz — que ganhou projeção internacional ao interpretar Juma na primeira versão de Pantanal (1990) — e inaugurou a nova faceta do humor na carreira, gênero pelo qual passou em comédias românticas das sete antes de embarcar no universo sombrio das vilãs de horário nobre Alicinha e Araci, de respectivamente, O clone (2001) e Insensato coração (2011).
Novela de Carlos Lombardi, Quatro por quatro fez um sucesso tão imenso que foi prolongada, chegando a 233 capítulos, uma das mais longas da história da emissora. O público aumentou, a audiência não caiu e, para os envolvidos, entretanto, não foi um processo nada desgastante, segundo Cristiana.
"Eu adorava!", ela declarou ao Correio, em uma entrevista feita por telefone dentro de um carro de aplicativo enquanto se deslocava de casa a uma reunião, em São Paulo. Na capital paulista, ela está em cartaz na peça Cá entre nós, ao lado de Suzy Rêgo e Eduardo Martini.
"Sempre fui muito feliz fazendo novela, na interpretação em geral, o trabalho me preenche. A novela foi uma experiência maravilhosa, e fazer várias personagens em uma era divertidíssimo", observa a atriz, que, além de Tatiana, compôs a Maria das Dores, em que a protagonista se passava por uma mineirinha de Curvelo para concretizar uma das vinganças.
Divisor de águas
Para a artista, que estreou na extinta Manchete cinco anos antes em Kananga do Japão, Quatro por quatro — o terceiro trabalho na Globo, onde estreou como a mocinha Paloma, de De corpo e alma (1992) e depois fez Memorial de Maria Moura (1993) — foi um divisor de águas. "Foi meu primeiro trabalho de comédia e, ali, eu percebi que eu podia fazer coisas diferentes, uma composição com técnica, não somente na intuição e na sensibilidade como foi com a Juma, por exemplo", explica a primeira atriz novata a protagonizar uma novela.
Cristiana se recorda com muito afeto da época de Pantanal e acompanhar o remake feito pela Globo em 2022 foi "estranho" e "lindo", ao mesmo tempo. "Foi estranho porque o Pantanal não é mais como era antigamente, e foi bem circunstancial porque o bioma precisa chamar a atenção. E foi lindo porque foi uma grande ode, enalteceu a importância da obra, que é atemporal, no sentido de qualquer pessoa pode assistir e se emocionar com a primeira versão e foi muito bacana ver que pegou uma nova geração. Foi um remake muito bem feito", explicou.
Embaixadora da SOS Pantanal, para além de Juma, tudo o que diz respeito ao bioma interessa Cristiana. "Eu gostei das duas formas, da homenagem e também porque falava da preservação do nosso patrimônio natural", ponderou a atriz, que, à época do remake, estava em Brasília filmando Ecoloucos, o seu segundo trabalho com a cineasta Cibele Amaral, uma comédia para o cinema.
Do humor ao horror
Quatro por quatro foi a estreia de Cristiana no humor e de uma sequência de comédias românticas do horário das 19h: Salsa & merengue (1996), Corpo dourado (1998) e Vila Madalena (1999). Logo depois, a atriz voltou para o horário nobre, onde iniciou na emissora, em 1992, como par romântico de ninguém menos que Tarcísio Meira (1935-2021). Agora, porém, com uma grande vilã. "Eu quis fazer da Alicinha uma psicopata, sem empatia total", lembra a atriz, que conversei com a especialista Ana Beatriz Barbosa Silva e fez muitas pesquisas.
"O barato foi que eu fazia o que a Gloria escrevia, mas não tinha um subtexto, que, às vezes, congela o ator. Eu fazia até as últimas consequências, com as emoções sugeridas pelo texto, então ela foi se mostrando pura e doce no início e tornando-se maligna, completamente louca", acrescenta.
Dez anos depois, Cristiana interpretou outra mulher cruel no horário nobre, a criminosa Araci de Insensato coração, uma presidiária que comandava a cadeia feminina para onde a personagem de Glória Pires foi enviada. "Araci eu peguei mais desenhada: uma mulher homossexual, traficante e assassina. Eu fiz um ano e meio de pesquisa dentro de penitenciárias femininas no Rio e Florianópolis, onde passava a história. O Gilberto (autor da novela) não me deixou mudar o texto, mas eu levava o script para a cadeia e as detentas me diziam que não falavam daquele jeito. Elas falavam o jeito que combinava com elas, eu alterei, e aí, sim, o Gilberto gostou".
Ditadura do corpo
Para viver Araci, Cristiana apareceu bastante acima do peso e trouxe de volta o holofote sobre o seu sobrepeso na adolescência, algo que ela sempre menciona como trauma e superação, inclusive em seu livro Cristiana Oliveira, versões de uma vida: como o resgate da autoestima e o fim da busca por aceitação me tornaram mais forte e feliz aos quase 60 anos e nas palestras corporativas que a ex-modelo faz pelo país.
"Na época, as pessoas encontravam comigo e me criticavam por ter engordado, mas eu sabia que iria emagrecer de novo. Por esse trabalho, fui premiada, e tenho o maior orgulho dessa minha entrega", defende Crica, que se incomoda com essa faceta da ditadura do corpo, quando as pessoas dizem que ela está magra como se fosse elogio.
"Parece que ser magra é virtude, qualidade. Eu hoje estou 15kg acima do que estive anos atrás, mas sou uma pessoa saudável, tenho alimentação maravilhosa, os meus exames em dia. Porém, esse movimento para que as pessoas sejam aceitas com o corpo que têm é louvável, mas existe o lado preocupante. A obesidade gera outras doenças, então é preciso vigiar", orienta a também empresária, que se tornou sócia da marca de cosméticos profissionais para cabelos D'Bianco, além da sua marca C.O cosméticos.
Prestes a completar 61 anos em dezembro, a sagitariana afirma que, para ela, ter chegado aos 60 não significa nada. "É só um número. As pessoas que estabelecem essa consciência da finitude, mas eu não me preocupo com idade. Vivo um dia após o outro, cuida da cabeça, do espírito, sigo ativa, criativa, vaidosa... É uma idade, apenas", conclui a avó de Miguel, de 11 anos, com quem revela viver uma relação de "mãe com açúcar".
"Eu mimo. Minha filha que arranque os cabelos...", diverte-se.
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