LITERATURA

Gabriela Tunes e Mariana Surina lançam livros com inspiração brasiliense

Mariana Surina e Gabriela Tunes lançam romances inspirados em histórias brasiliense nesta semana na Livraria Circulares

Gabriela Tunes e Mariana Surina -  (crédito: Patrick Grosner e Jaya Márcia Paolinelli)
Gabriela Tunes e Mariana Surina - (crédito: Patrick Grosner e Jaya Márcia Paolinelli)

Escritoras da capital, Mariana Surina e Gabriela Tunes lançam romances na Livraria Circulares (CLN 113) nesta semana. O evento de lançamento de Bondade Branca, de Gabriela, será nesta quinta-feira (26/9), às 19h. O romance de inspiração budista 108, de Mariana, será lançado no sábado (28/9), às 17h. Conheça as duas escritoras brasilienses e as respectivas obras que representam a literatura feminina na cidade.

Mariana Surina — A busca pela paz 

Pseudônimo de Mariana Carpanezzi, Surina é uma escritora e ilustradora nascida em Belém do Pará e criada em Brasília. Com uma longa experiência na escrita, Mariana também pinta e tem obras em coleções particulares em diversos países. 108 é a segunda publicação da artista, na qual ela encontrou a linguagem literária ideal. 

Elementos do budismo, como minimalismo e simplicidade, são características do estilo de Mariana. No lançamento, o leitor acompanha a protagonista feminina de inspiração autobiográfica. A personagem ficcional homônima decide apostar no desconhecido e deixar a vida já construída no passado. Motivada por um acidente de bicicleta, a mulher abandona a carreira de repartição pública no Distrito Federal e embarca em viagens europeias. 

A história principal é alternada entre capítulos da vida de Sidarta Gautama, o príncipe que deixou o palácio há 2500 anos para se tornar o Buda. O livro reflete sobre a busca pelo fim do sofrimento, questão antiga mas que permeia a atualidade. Escrito com o mesmo número de capítulos das contas dos rosários budistas de prece, 108 é uma meditação sobre as escolhas diante da impermanência da vida.

Foi ao acidentar-se quando andava de bicicleta e sofrer um traumatismo craniano que Mariana se viu cara a cara com a possibilidade da morte. A história pessoal é compartilhada com a protagonista do livro: “O fato iminente da morte me fez refletir sobre como quero conduzir a minha vida. Quero me conhecer e viver para morrer em paz.” O acontecimento fez a autora priorizar a espiritualidade.

Os capítulos curtos se conectam entre si nos fundamentos budistas em ritmo poético. As tradições espiritualistas de Buda e da Vedanta são universos explorados na obra, práticas que Mariana mantém na vida pessoal. “O tema da busca por acabar com o sofrimento é sempre constante. O ensinamento do budismo é observar a própria mente. Ninguém quer sofrer e todos desejam encontrar sentido na vida”, argumenta.

A arte da escrita e da ilustração estão em sinergia no trabalho de Mariana. A capa do livro é uma ilustração autoral da autora, que precedeu a história: “Quando eu vi o desenho da capa surgir, eu entendi a história. A linguagem visual me trouxe uma compreensão da narrativa.” Mariana enaltece a participação em oficinas literárias na construção de uma escrita própria, onde a opinião de outro profissional da área pode acrescentar no trabalho.

Ilustração de Surina para '108'
Ilustração de Surina para '108' (foto: Divulgação)

Gabriela Tunes - Debate sobre racismo

Por Luisa Mello*—Formada em Biologia, Gabriela Tunes tem uma trajetória profissional fora do comum. Além de bióloga, Tunes é servidora pública, musicista, escritora e nadadora, e sempre amou escrever. Acostumada com artigos científicos, a artista decidiu se aventurar durante o período da pandemia da covid-19 e escreveu o primeiro livro, Máscaras no Varal (2022). O romance rendeu uma indicação ao Prêmio Marielle Franco dos Ensaios Feministas, no qual ficou entre os 10 primeiros colocados. 

Bondade Branca narra a jornada de Lucila, uma jovem baiana que, aos 15 anos, é retirada de casa para trabalhar e sobreviver em Brasília, na casa da família de um delegado de polícia. Os principais temas da obra são o trabalho doméstico e o sistema penitenciário brasileiro, além do protagonismo negro e a posição racista da sociedade. 

Durante uma passagem pela Comissão de Direitos Humanos na Câmara, Bondade Branca se tornou uma ideia. O contato diário com mães de detentos em relatos e cartas foi uma das grandes inspirações de Gabriela para a construção da protagonista: “As pessoas precisam ver isso”. O romance traz uma visão crítica do racismo estrutural e tem como pano de fundo a vida da classe média da capital brasileira, de 1980 até os dias atuais.

A escolha do título da novela é extremamente importante nas relações entre os personagens e denuncia  a complexidade humana. “Eu quis expor essa falsa bondade da branquitude para com as pessoas negras que estão lhes servindo dentro de casa. A ambiguidade de quem é do mal não é sempre do mal e, quem é do bem, não é sempre do bem. Quis mostrar que, às vezes, a pessoa ‘boazinha’, tem um tracinho de perversão ali que é socialmente construído”, diz a autora.

Como escritora de etnia branca, Gabriela ressalta o privilégio pessoal e diz ter se inspirado na própria realidade para a construção da narrativa: “Sempre achei muito natural ter empregadas domésticas, minha família nunca precisou se preocupar com limpar um banheiro ou lavar a louça. Isso realmente foi inspirado em coisas que é preciso reavaliar a nossa postura”. 

A leitura causa um desconforto e expõem dinâmicas racistas que ainda existem, mesmo sem ser intencional. “As pessoas que são boas, que estão ali com as melhores intenções, que não querem ser racistas acabam reproduzindo práticas que colocam pessoas negras em posições subalternizadas, que perpetuam essa divisão racial da sociedade”, diz Gabriela.


 

'Bondade branca'
'Bondade branca' (foto: Arquivo pessoal )

*Estagiárias sob supervisão de Nahima Maciel 

  • Ilustração de Surina para '108'
    Ilustração de Surina para '108' Foto: Divulgação
  • 'Bondade branca'
    'Bondade branca' Foto: Arquivo pessoal
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postado em 26/09/2024 16:11
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