O Museu Nacional da República se transforma, a partir de amanhã, em uma espécie de vitrine da arte contemporânea produzida na capital. Com curadoria de Paulo Herkenhoff e de Sara Seilert, ex-curadora da instituição, Brasília, a arte do planalto reúne mais de 250 obras criadas por 128 artistas que, de alguma forma, têm ligação com a cidade. “Essa exposição é uma celebração do que há de novo em Brasília", avisa Sara, que ainda estava no cargo de curadora do museu quando recebeu a proposta de Paulo Herkenhoff de levar a mostra Brasília, a arte da democracia, então em cartaz no Rio de Janeiro e produzida pela FGV Arte, para Brasília. “A princípio, eu iria receber a exposição do jeito que foi apresentada no Rio, mas a gente entendeu que poderia ser ampliada.”
No Rio, a coletiva contava com 180 peças de 80 artistas. Herkenhoff e Sara decidiram, para a versão brasiliense, incluir obras, principalmente, de artistas cuja produção seja atual e faça parte de um panorama da diversidade local. Assim, estão presentes nomes como Adriana Kariú, artista urbana do Gama que transformou a rampa do museu em um muro de lambe; Daiara Tukano, com o painel intitulado A queda do céu e a mãe de todas as lutas, produzido no próprio museu, Camila Soato, Alessandra França, Alice Lara e Ralph Gehre, com pinturas, e Zuleika de Souza, com fotografias, entre outros.
O conjunto, avisa Sara Seilert, ficou com a cara de Brasília sobretudo por conta da diversidade. “Não é nada homogêneo, ficou bem evidente o tanto que a gente consegue produzir narrativas de experiências brasilienses diversas”, garante. “Então tem a questão ambiental, a questão política, a questão da ocupação da cidade, do plano e do entorno. Essas abordagens estão bem representadas, assim como o tanto que Brasília é diversa e produz narrativas diversas.” Para a curadora, o que há de tipicamente brasiliense no conjunto é o que ela chama de encontro de linguagens, incluindo o diálogo com a arquitetura do museu, projetado por Oscar Niemeyer.
No Rio, a exposição tratava do processo político da transferência da capital federal para o Planalto Central, nos anos 1960. Em Brasília, a intencionalidade, segundo Paulo Herkenhoff, é outra. “Ela pensa como Brasília surgiu como uma obra de arte extraordinária, uma obra total grandiosa, com projeto urbanístico, arquitetura, azulejaria do Athos, as esculturas de Ceschiatti e Bruno Giorgi. E também trata de como Brasília teve personalidades que foram capazes de unir a sociedade em formação, nascente”, explica o curador, ao lembrar que a mineira Vera Brant é a grande homenageada da exposição. “Era uma mulher de grande charme intelectual e cultural, ajudou Darcy Ribeiro na consolidação da UnB e reunia, na sua casa, personalidades”, diz Herkenhoff; “Ela articulava políticos como JK (Juscelino Kubitschek) que, depois de deixar a presidência ficava hospedado na casa dela quando vinha a Brasília.” O curador incluiu, na exposição, uma mesa do Zanini Caldas na qual JK trabalhava quando estava na casa de Vera Brant.
A exposição traz, ainda, obras de nomes importantes das décadas de 1960 e 1970 que fizeram parte da história da cidade, mas também reserva espaço para outras vertentes. Uma dimensão importante, segundo os curadores, é um recorte feminino com obras de Maria Martins e Mary Vieira, bonecas carajás tradicionalmente feitas por mulheres, os animais de dona Severina e peças de barro de artistas de Planaltina. “Tem um corte sobre a diversidade cultural da formação social de Brasília com muitas artistas mulheres, indígenas e afrodescendentes. Notei também que o discurso sobre a arte em Brasília é feito, sobretudo, por mulheres críticas e historiadoras. Mais do que homens. Tem mais teóricas do que teóricos”, avisa Herkenhoff. “A sessão das mulheres, aqui, se ampliou porque temos quatro vezes mais espaço. A gente foi incluindo e o espaço acabou pequeno.”
A mostra também reserva um espaço para a produção das cidades do DF, com artistas de Ceilândia, Planaltina e Brazlândia, representada especialmente por mestre Quinca e Galeno. Há, ainda, uma sessão dedicada às vanguardas com obras de Cildo, Sérgio Porto, Luis Alphonsus e Alfredo Fontes. “Essa vanguarda continua com Christus Nóbrega, que usa de inteligência artificial, com Luciana Paiva, Camila Soato, que é uma subversiva da bela pintura. Mas também tem a alegria da obra de Ismael Monticelli e o luto da instalação imemorial da Rosângela Rennó. É muito interessante a diversidade e qualidade da produção de Brasília”, conclui Paulo Herkenhoff.
Brasília, a arte do planalto
Curadoria: Paulo Herkenhoff. Visitação até 24 de novembro, de terça a domingo, das 9h às 18h30, no Museu Nacional da República (Setor Cultural Sul, Lote 2 Próximo à Rodoviária do Plano Piloto). Entrada gratuita. Classificação indicativa
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