Comemorando 32 anos de carreira, o versátil Miguel Thiré assina a direção e é um dos criadores, junto com Isabel Teixeira, do monólogo O figurante, estrelado por Mateus Solano. O projeto, totalmente feito sem patrocínio, está em cartaz no Teatro Fashion Mall, no Rio e o interessante é que, nesta quinta parceria artística com o amigo de longa data, o trabalho é uma espécie de intercâmbio, com uma ponte aérea artística ligando Brasil e Portugal — terra adotada pelo multiartista carioca de 42 anos desde 2016, quando ele esteve no elenco da produção da TVI A impostora.
"Sempre passou pela minha cabeça essa possibilidade de sair do Brasil. Eu já tinha morado em Londres por um ano e gostava da ideia, mas não imaginava virar um imigrante definitivamente. Em 2016, eu estava incomodado com o Rio pré-Olimpíada. Experimentei vir para Lisboa passar seis meses, depois passei um tempo em São Paulo por causa da peça que estava em cartaz, mas como carioca eu sentia dificuldade de me adaptar. Lisboa tem um contato com a natureza que, para um carioca, faz sentido", afirmou o ator, diretor e autor, que, em solo lusitano, atuou também na novela Valor da vida (2018) — atração que foi exibida no Brasil pela Band.
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De acordo com Miguel, os atores brasileiros seguiram um movimento político, social e econômico que pegou o país naquele período pós-impeachment. "Mas acredito que essa fervura foi independente de ideologia. Portugal ficou na moda nesse período. Por volta de 2018, estava todo mundo querendo vir para cá. Mas houve muita gente que veio, tentou, se frustrou e voltou. Quando há o conhecimento, mas não tem contato, é difícil começar de novo. Tem muita gente tentando entrar no mercado. E o país é ótimo para viver, mas é difícil de se fazer dinheiro aqui. O custo de vida subiu muito nos últimos dois anos", descreve.
Por lá, também fez parte do elenco do longa Submissão, criou e estrelou os solos Cidade Maravilhosa e Força estranha e trabalhou nos espetáculos A peça que dá para o Torto, O crédito e O regresso de Ricardo III. Na pandemia (de 2020 a 2021), o artista lotou um galpão de mil metros quadrados com a sua adaptação da experiência imersiva Alice, o outro lado da história. Em seguida, assinou a montagem dos sucessos teatrais Dois+Dois e Trair e coçar é só começar — sendo esta a primeira versão do sucesso que ficou 34 anos em cartaz nos palcos brasileiros.
Currículo
No currículo de Miguel Thiré, constam diversos trabalhos na televisão brasileira, como Malhação (2000) e as novelas Porto dos Milagres (2001) e Em família (2014), na Globo; Paixões proibidas (2007), na Band; e Poder paralelo (2010), na Record. Ele ainda foi protagonista da série Copa Hotel (2013), do GNT, em que deu vida a Fred, um rapaz que herda um hotel decadente em Copacabana.
No cinema, fez parte do elenco de projetos como O inventor de sonhos, de Ricardo Nawenberg, e A memória que me contam, de Lúcia Murat — que foi selecionado para competir no 45º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, em 2012, e teve cenas gravadas na capital. Na ocasião, ele deu vida a Eduardo, filho da protagonista vivida por Irene Ravache, e formando casal com o amigo Patrick Sampaio.
Já no teatro, Miguel esteve em uma dezena de espetáculos, como Tango, Bolero e Chá-chá-chá e A babá — ambos com direção de Bibi Ferreira — e encenou o monólogo Pra mim chega. Ao lado de Mateus Solano, estrelou, entre 2016 e 2018, a peça Selfie, que teve temporadas de sucesso no Brasil, nos EUA e em Portugal.
"Tenho vontade de atuar novamente no Brasil, mas agora eu sou pai, há uma dificuldade. A logística de levar a Laura é muito complicada, tem que ser algo que compense", argumenta o ator, referindo-se à filha de apenas 1 ano, fruto do relacionamento com a também atriz luso-brasileira Gabriela Barros — vencedora do prêmio Globo de Ouro como Melhor Atriz de Ficção em 2022 por sua atuação na série portuguesa Pôr do sol.
Sobre o projeto que desenvolve atualmente no seu país de origem, essa é a primeira vez nessa dinâmica, em que Miguel dirige Mateus sozinho em cena. Para ele, independentemente do formato, essa dobradinha é maravilhosa. "A Isabel Teixeira foi uma incentivadora para que o projeto caminhasse. A intimidade que há entre mim e Mateus faz o projeto ir mais longe, porque quando se começa a trabalhar já existe uma estrada e um nível de conhecimento que já coloca um ponto a frente. A gente conhece atalhos, o ego, o terreno onde pode habitar. Quando se trabalha com gente nova, é um desafio, porque leva um tempo até que as pessoas consigam dialogar", observa.
DNA poderoso
Herdeiro de grandes nomes da dramaturgia brasileira, Miguel é neto de Tônia Carrero e filho de Cecil Thiré, mortos, respectivamente, em 2018 e 2020. Para ele, entretanto, a cobrança, ao longo da vida, existiu mais por parte dele próprio do que externa. "Eu vivia ansioso, querendo acertar, me frustrava com a minha entrega quando não atingia 100%. Mas reparo que essa auto-cobrança é uma construção psicológica infantil de quem se enxerga numa família de gigantes e só aceita se tornar um gigante também. São muitos anos de análise para conversar com esses sonhos de criança, essa pressões todas, para entender que 70% já é maravilhoso. Estou evoluindo", desabafou o artista, cuja mãe, Norma Pesce, é produtora teatral.
Miguel também tem dois irmãos — Luisa, 50, e Carlos, 52 — e um sobrinho — Vitor, 30 — na dramaturgia. Sobre a transferência genética do DNA artístico para a filha, Miguel é bem consciente. "Cresci numa casa que só se trabalhava com arte. Conhecia o teatro pela coxia em vez da plateia, a televisão pelo estúdio, pelos bastidores. Esse conjunto faz com que o caminho seja mais curto, e rolou comigo de seguir a profissão. A Laura já ficou na coxia esperando os pais algumas vezes, vai crescer nos palcos, mas a gente pretende sempre mostrar a realidade apaixonante e difícil. Mas nada me assusta, vamos ver o que vai acontecer", conclui.
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