Criado há 10 anos para promover o intercâmbio entre artistas bielorrussos e brasileiros, o festival Vulica desembarca no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) com o título de Natureza Urbana. Com a intenção de propor um diálogo entre a sustentabilidade e a arte urbana, a exposição ocupa espaços internos e externos com paineis de grafite e instalações realizadas especialmente para o local. "A gente fez uma seleção de artistas que têm algum trabalho que dialogue com esse conceito da ruptura das fronteiras do humano e do não humano, da natureza e da cidade", avisa Nina Coimbra, curadora em parceria com a bielorrussa Mila Kotka.
Além de investir nesse diálogo, a exposição traz também a proposta de discutir a atuação do artista urbano como um contestador e um transgressor. "Às vezes, a arte urbana é o primeiro espaço onde conflitos e transformações são colocadas de forma artística. E a questão da sustentabilidade, da natureza, da necessária reflexão sobre o clima agora se apresenta em arte urbana", diz a curadora. Em Natureza urbana, os 13 artistas convidados trabalham com biomateriais e com temáticas relacionadas, com a relação do homem com natureza, com materiais usados e outros ressignificados.
A primeira obra que se avista ao chegar ao CCBB é uma construção com biomateriais da dupla bielorrussa Echo. Para construir o trabalho, os artistas substituíram o vime, com o qual normalmente trabalham, pelo bambu. A estrutura envelopa uma parte do prédio projetado por Oscar Niemeyer. Ainda do lado de fora, um imenso painel de 360° de Daiara Tukano envolve o teatro. Na superfície, a artista, representante da etnia Tukano, pintou uma serpente cujos significados na cosmogonia indígena são variados e remetem à origem do mundo. Luminosa, a obra foi pintada com tintas em neon para que o brilho sobressaísse e capturasse o olhar do público.
Na circunferência externa da Galeria 1, Thiago Toes também criou um desenho cuja narrativa traz a gênese do planeta em uma perspectiva espacial. As duas obras são site specifics em superfícies de madeira instaladas ao redor dos prédios. No Pavilhão de Vidro, uma instalação com plantas vai dividir o espaço com um grafite de Ramon Martins desenhado no chão. "Acho que meu trabalho dialoga com a natureza por causa de quem eu sou. Tenho as duas coisas dentro de mim: tenho a origem, cresci em bastante contato com a natureza e sempre em busca de explorar a natureza", avisa o grafiteiro. "Outra parte da minha vida é encontrar a conexão com o urbano no que se refere ao grafite, aos movimentos da cidade, da contravenção. Faço parte dessa junção da natureza e do urbano, estou no meio dos dois, então meu trabalho é bastante natureza e bastante urbano, e não é uma coisa nem outra. "
Ramon Martins nasceu no interior de Minas Gerais, onde foi criado antes de se mudar para a periferia de Belo Horizonte e, mais tarde, para São Paulo. Agora, fez o movimento de volta às origens e mora em um sítio, no interior de São Paulo, rodeado de plantas e muito verde. A inspiração para a pintura no chão da galeria veio da ideia de uma natureza exuberante e incontrolável, sobre a qual é possível andar, mas que não pode ser destruída.
Para Onio, artista de Brasília que pintou uma das muretas do CCBB para a exposição, o diálogo do desenho com a própria paisagem já justifica o título da exposição. "Acho que dá para ter uma integração com o visual que tem atrás da pintura, tem bastante Cerrado atrás, muita árvore, as coisas estão se integrando", explica o artista brasiliense.
O Vulica foi criado pelo diplomata Danilo Costa, enquanto servia em Minsk, capital da Bielorrússia, para aproximar artistas locais e brasileiros. "Era um projeto que levava artistas urbanos brasileiros para lá e o interessante é que antes não havia arte urbana como conhecemos aqui na Bielorrússia, as primeiras foram dos brasileiros", conta Nina. Este ano, com a crise política e a guerra entre Ucrânia e Rússia, o festival foi transferido para Brasília. "Entendemos que o queríamos dizer tinha a ver com uma mensagem que é política por natureza, mas não politizada. Então a gente foca na relação do homem com a natureza, são diálogos que vão desde a relação espiritual com o cosmos até o uso e atenção à materialidade da natureza", avisa Nina.
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