Música

Atração do CoMA, Criolo discute carreira e nova geração do rap

O músico traz o show do disco Sobre viver e será o responsável por fechar o sábado de apresentações

Criolo está em praticamente todos os grandes festivais do ano em Brasília -  (crédito: Helder Fruteira/Divulgação)
Criolo está em praticamente todos os grandes festivais do ano em Brasília - (crédito: Helder Fruteira/Divulgação)

O festival Coma de 2024  está em plena atividade. O evento, que é um dos mais importantes do calendário musical da capital no ano, se aproxima do final de semana de encerramento e muitos shows. Uma das principais atrações desta edição é o rapper Criolo. O músico traz o show do disco Sobre viver e será o responsável por fechar o sábado de apresentações, que também contará com nomes como Tássia Reis, Jaloo, Chico Chico, Brisa Flow, Hellen, Rapadura e Klap.

O show é o segundo da mesma turnê em Brasília este ano, Criolo já havia tocado este repertório no Funn Festival, mas isso não desanima nem torna robótico o processo que o rapper classifica como de "eterno aprendizado". Por este motivo, o cantor passeia pelo que ama: a própria fé, o rap e o samba.

O rapper tem uma bonita relação com Brasília e sempre que pode se apresenta com shows especiais para o público local. Ele sente honra em subir ao palco e coloca o processo de troca com o público como uma das principais prioridades da trajetória dele como músico. Criolo quer o contato com quem gosta do trabalho dele e com quem nunca parou para ouvir o que ele canta.

Do rap ao samba, com uma parada no discurso, o artista é, ao mesmo tempo, humilde e um guru. Com uma eloquência diferenciada, o rapper acredita na grandeza da cultura brasileira e garante que o belo vem do que é feito do fundo do peito. Neste fim de semana, Criolo abre o coração para Brasília mais uma vez e espera ver e convencer o público a embarcar nesta eterna jornada que tem vivido na música.

Entrevista // Criolo

Como é sua relação com Brasília?

A cidade deu Gog para o Brasil, deu muito pelo rap dos anos 1990 e pouco dos 1980. Um grande mestre que influenciou tantas e tantas gerações da música nacional. Eu tenho uma felicidade imensa de estar nesses festivais de respirar a cidade mesmo antes de tudo e dessa prosperidade de reconhecimentos, Brasília sempre abriu portas para mim porque a comunidade hip-hop e rap da capital sempre foi muito generosa

Recentemente, um filho de vocês fez todos os meus trabalhos fotográficos, seja para capas de revista, a parte estética do meu álbum Sobre viver e até a cobertura do Grammy. Helder fruteira, da Ceilândia. Ele sempre fala com muito orgulho de Brasília, da Ceilândia, ele tem a propriedade de quem é o filho da terra.

Como você enxerga o reconhecimento que conseguiu até então? Quando você começou, imaginava que você e o seu gênero musical conseguiriam este espaço?

São 35 anos de caminhada, a gente vai aparecer mesmo nos últimos 10 anos. Porém , os últimos 25 ou 28 foi chupar muita rapadura, chorar muito sozinho (risos) e acreditar muito nos meus sonhos, na força da música e no rap como transformação. O rap transformou minha vida e me fez ser capaz de acreditar que eu posso fazer uma coisa para o mundo, que eu existo. Eu ajoelho e agradeço a todas as pessoas que fortalecem o rap, porque estão fortalecendo uma história que está sendo contada. A sociedade não nos permite sermos nós mesmos, mas o rap faz um convite ao autoconhecimento e isso naturalmente reverbera em canções e visitas musicais que a gente possa se permitir fazer.

Eu percebo que a sua geração do rap está vivendo uma nova era. Quanto mais a popularidade aumenta e o nome fica maior, maior é a associação com ritmos mais distintos como samba, jazz e MPB. Como você analisa esse movimento
da sua geração?

Na minha opinião, não são todos, um ou outro que flerta com essa outra gama de ritmos do Brasil. Muita gente se mantém nessa estética rap e faz uma história incrível. Ouso falar que não é perto dos 100%. Porém, há uma naturalidade nesse processo. Se somos filhos do Brasil, somos filhos do samba. O que escutamos no rádio e na televisão é música popular brasileira desde os anos 1970, passando pelos 1980, 1990 e 2000.

Agora que houve uma mudança maior dentro das estruturas da indústria de absorver outros ritmos, mas até então eram os setores estéticos mais brasileiros que visitavam a casa da gente. É natural essa construção porque esses sons fazem parte da nossa vida.

O samba é o pai de todos nós, então para mim, quanto mais gente do rap estiver fazendo samba melhor, porque estão sabendo da própria história, mais a gente mergulha no que é entender Brasil. O rap volta mais forte e mais potente, porque a gente vai se achando nessa história mal contada de como o país se construiu.

Você acredita que este movimento gerou maior aceitação da geração pelo mainstream? Você acredita que o rap tem caminhado em uma direção similar à do samba?

Nem todo mundo fez essa transição, e as pessoas não fazem essa transição para ter aceitação. Isso ocorre porque somos todos brasileiros. O rap é um estilo americano que vem de muita influência da Jamaica. Lógico, quando ele chega no Brasil nós abraçamos as contestações sociais, as preocupações com as coisas que tocam nossa alma e que estão na nossa pele. Não é sobre pesquisar um objeto, nós somos a lágrima e o sorriso de cada texto. O rap caminha pelo coração de quem o escreve.

Assim como você, nomes como Djonga, Marcelo D2 e Emicida também tem passeado pelo samba. Por que você acha que há essa associação tão clara? Você acredita que, no Brasil, o rap e o samba tem uma raiz em comum?

A raiz é quem está fazendo, é o teu coração. Djonga é um artista incrível; Marcelo D2 um cara magnífico, um dos precursores com tantos outros nomes da geração dele e da anterior; e o Emicida é um professor para todos nós, ele tem uma profundidade muito grande e absurda, se nós estamos em 2024, o Emicida está em 3025 ou 5072. Emicida é o futuro! Os artistas do rap que estão apresentando o samba para uma nova geração, estão mostrando a raiz de tudo, colocando a música onde o coração deles está batendo. A gente anda junto, o rap, o samba e tudo aquilo que alma do povo brasileiro quiser expressar, vai ser bom demais. Porque a gente já foi muito oprimido, não é? Então poder cantar é fantástico. O lugar comum é nosso coração, ele sai e volta.

O seu rap passa pela sua fé, por uma vertente crítica, tem músicas de amor, faixas melódicas e reflexivas e chega até o samba. Como é o trabalho de mostrar todas essas facetas no palco? Qual dessas faces está mais evidente atualmente?

A nossa fé é a nossa força, ela é um portal de coisa boa, mostra que somos capazes de construir algo melhor, mais bonito e mais amável. A fé mostra que existe um caminho para gente melhorar a cada dia. A intolerância religiosa é um grande erro, é uma das faces do preconceito e do racismo. A intolerância é um convite a voltarmos ao período medieval, onde somente a violência e a imposição abriam caminhos. Então, a nossa fé é o nosso guia. O rap é esse irmão mais velho que falou que eu era capaz de ser alguém nesse mundo, até então eu me sentia um nada. O samba é o nosso expoente musical maior. Poder apresentar tudo isso em um palco é de uma honra muito grande, porque eu ainda estou aprendendo com isso tudo, ainda tenho um caminho muito longo a percorrer, estou engatinhando e pedindo licença para crescer, subir ao palco e cantar tantas dessas histórias que a gente vê por aí.

Festival CoMA

Sábado, a partir das 12h, no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB). Ingressos custam a partir de R$ 15 e estão disponíveis no site oficial do CCBB. Classificação indicativa: 16 anos. Menores de 16 anos somente acompanhados dos pais ou responsável legal, com documento de liberação devidamente registrado
em cartório

 

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postado em 07/08/2024 06:00
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