Ter a história mundial reescrita é um dos dividendos no criativo e empolgante roteiro da comédia romântica Como vender a Lua, que tem a tela dividida entre duas presenças majestosas, para os fãs de cinema: Scarlett Johansson (do quarteto dos mais rentáveis talentos, formado ainda por Chris Pratt, Samuel L. Jackson e Robert Downey Jr.) e Channing Tatum (que já enriqueceu o audiovisual em US$ 1,8 bilhão).
Puxando pela genealogia de nomes de peso de Hollywood, Rose Gilroy é a roteirista do filme orçado em US$ 100 milhões, filha da atriz Rene Russo e do autor do roteiro do filme O abutre (2014), Dan Gilroy.
Com a perspectiva de 400 milhões de espectadores, um feito sessentista é a mola mestra para o enredo: a chegada do homem à Lua.
Detentor da Estrela de Prata, pela participação na Guerra da Coreia, o diretor de lançamentos espaciais Cole Davis (Tatum) tem pela frente os treinamentos da equipe formada por Neil Armstrong, Buzz Adrin e Michael Collins, na disputa contra russos, que, num clima de tensão, em 1957, abriram caminho para o satélite artificial Sputnik 1.
Mas nem tudo é tecnologia, no filme comandado por Greg Berlanti, que se afirmou nos projetos de alcance LGBTQIA+ O clube dos corações partidos (2000) e Com amor, Simon (2018).
Rainha das falcatruas e das conversas fiadas (bem embaladas), quem entra em cena, na trama romântica, é Kelly Jones, interpretada por Johansson, numa versão em que, na sua presença, todos engolem em seco.
“Hollywood não é para os fracos” é uma das frases do roteiro, muito atestada pela estrela de Ela e de Encontros e desencontros. Forte e magnética, ela é capaz de eclipsar a corrida do homem à Lua comandada por Cole.
Promovendo uma reviravolta no Cabo Canaveral (a base das engenhocas espaciais dos norte-americanos), Kelly é destacada para turbinar com ares pop a carreira (e os feitos) dos tripulantes, que, a partir da promoção dela, ilustram as capas de publicações como Life e Times.
A informalidade injetada num campo sério e sagrado como o dos bastidores das ações da Nasa e os confrontos profissionais e sentimentos enrustidos entre Cole e Kelly balizam a criatividade do divertido longa. Outro grande acerto está no repertório da trilha sonora que acopla Nothin can change this love (Sam Cooke), To love somebody (Bee Gees) e mesmo diferenciadas versões de Fly me to the moon e Moon river.
Com um momento grandioso ao estilo da cena da bomba vista em Oppenheimer, Como vender a Lua usa da emoção impressa no “maior evento televisivo” da década de 1960.
A explosão da corrente para a frente na corrida espacial — que o filme diz ter mobilizado, ao longo do tempo, 400 mil empregados da Nasa — conflita como a desgostosa divulgação do rastro de explosões e napalm impulsionados pelos noticiários da Guerra do Vietnã.
Percebendo a publicidade como um trampolim para golpes lícitos, Kelly amplia a pretensão de se valer de entrevistas, jingles e slogans para impregnar com carisma a estrondosa campanha da Nasa que repercuta até mesmo no seio do Congresso dos Estados Unidos.
“Vigarista”, sem muitas reservas, ela encabeça golpes nos corredores da Nasa , impulsionando “um jeito novo de ver o mundo”, através de encenações de entrevistas e tenta até mesmo sugerir coordenadas para o astronauta Armstrong (que lacrou com “um pequeno passo para o homem, mas um gigantesco salto para a humanidade”) sobre o que deve ser dito, caso pise na Lua. Bom destacar, óbvio, a enorme carga de ficção nos eventos pós-1967, quando houve o desastre nos ensaios da Apollo 1, que acabou matando três astronautas, diante da falta de adequada preparação para resgate, no caso de emergência.
Curiosas imagens reais de John F. Kennedy, presidente que chegou a admitir fracassos frente à operação russa, casam ainda com a rede de estímulo que ele criou diante da capacidade estadunidense. Ah! Como vender a Lua conta com a impagável participação de um gato preto, em cena.
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