Com apenas 21 anos e às vésperas da terceira turnê na Europa, o cantor e multi-instrumentista Will Santt é o atual herdeiro de Tom Jobim e João Gilberto. O jovem lançou um álbum em junho para registrar sua apresentação ao vivo no Blue Note SP e é sucesso no exterior. Em janeiro, tocou em show no Fórum Econômico Mundial, em Davos, a convite da cantora beninense Angélique Kidjo. E o compositor Roberto Menescal fez participação especial em um show de Will. Ele está de partida para uma turnê pela Espanha, Itália e outros países.
"Eu acompanho o violão", afirma Will sobre as mais de 100 composições. Em entrevista ao Correio, ele mostra que a Bossa Nova vive nas músicas autorais e nos covers.
Entrevista / Will Santt
Como foi o seu primeiro contato musical? Quais foram as primeiras músicas ou artistas que mais te impactaram na infância?
Aprendi a tocar violão sozinho, de 2013 para 2014. Nesse período, eu conheci a Bossa Nova por Águas de março, de Tom Jobim, e me interessei pelo estilo. Eu me identifico com coisas mais antigas, sempre gostei. Eu me achei superesquisito por não estar dentro do que é o normal. Gosto de roupas de estética mais antigas, de música clássica, de rock. Conhecer Djavan e João Gilberto também me impactou, são grandes inspirações para mim.
O que te fez se interessar pelo violão? Foi um momento específico ou um processo gradual?
Quando criança, ia à igreja com minha família, fiquei fascinado com o baterista da banda e quis aprender o instrumento junto com o meu irmão. Minha trajetória musical começou ali. Como só tinha uma bateria, deixei-a para meu irmão porque o pastor falou que eu tocava muito forte e os irmãos reclamavam (risos). Me colocaram para tocar a meia-lua e eu decidi aprender o violão no ódio, só para sair da meia-lua.
Você mencionou ser autodidata. Como foi esse processo de aprendizado?
Aprendi a tocar violão sozinho com vídeos na internet. Era adolescente e tinha muito tempo para aprender. Chegava da escola e já queria tocar. Era um instrumento emprestado e meu pai quis comprar o meu próprio pela internet. Fiquei esperando na sacada ansioso para ele chegar por umas duas semanas, e nada do bendito. Falei para meu pai que o violão nunca chegava e, ao ver no sistema, a compra foi recusada por falta de limite no cartão de crédito. Fiquei supertriste. O pessoal da igreja se sensibilizou e me deu um violão, bem velhinho, mas que ficou comigo por 10 anos. Eu era muito dedicado, nunca pensei que pudesse aprender tão bem sozinho.
Como foi a experiência de criar uma canção para Caetano Veloso?
Na verdade, nunca escrevi nada para ninguém. Fiz a melodia no banho e pensei que a composição ficaria linda na voz de Caetano, então decidi dedicá-la a ele. Sou um contador de história e o admiro muito. Minhas melhores composições são no chuveiro, de forma espontânea!
Qual é a origem do nome "Will Santt"? Tem algum significado especial ou história por trás?
No ensino médio, os colegas falavam que eu parecia o ator Will Smith por causa do corte de cabelo quadrado que ele usava em Um maluco no pedaço. Eu achava que parecia mesmo, só faltava o bigode. Aderi ao apelido porque sempre falavam meu nome errado. O Santt veio de Santos, meu sobrenome, no processo de escolha de um nome artístico. Achei bonito e potente, meu irmão me ajudou a decidir.
Como foi a sua ascensão nas redes sociais? Você pode falar sobre como foi a recepção do público e os feedbacks que você recebe?
Antigamente, era muito difícil ficar conhecido, tinha que ser pela rádio ou jornal impresso. Hoje em dia, a internet facilitou esse processo ao conectar pessoas de vários lugares do mundo. Eu postava vídeos tocando sempre da cintura para baixo por vergonha de mostrar o rosto, mas as pessoas me estimularam a aparecer. Comecei a postar com constância no Instagram depois de estudar marketing digital e alguns vídeos viralizaram com 550 mil visualizações. Eu gerencio as redes, posto e respondo comentários e tive esse reconhecimento bacana. O cover da música infantil O pato foi o primeiro a bater 1 milhão de views, acho que por causa da magia e nostalgia de ser criança.
Como você vê a recepção da mídia em relação ao seu trabalho, considerando que a Bossa Nova não é um gênero mainstream atualmente?
Nunca tive nenhuma crítica negativa em relação ao meu trabalho. O meu maior público é o europeu e a recepção foi incrível, agora que o Brasil está me reconhecendo. Mês que vem será minha terceira turnê internacional. A mídia me enxerga como o representante da Bossa Nova atualmente. Ninguém faz isso hoje em dia, principalmente jovens, e abracei este mercado. Tive sucesso porque ninguém faz mais o que eu faço atualmente, não tenho muita concorrência.
Como foi sua experiência tocando no exterior?
Com os vídeos que postei, uma seguidora entrou em contato comigo me chamando para ir tocar em Madrid. Era a Cecilia Krull, cantora espanhola dona do tema de abertura usado na série La casa de papel. Permaneci em contato com ela, tirei meu passaporte e aceitei o convite. Fiquei na casa de um amigo na Espanha e comecei os shows internacionais, muito bem recebidos.
Como foi a recepção do público internacional em relação ao seu trabalho?
As casas lotaram, foi inesperado para mim. Fiquei com vergonha, mas o público me recepcionou muito bem. Os europeus adoram Bossa Nova e acham que o Brasil também aprecia o gênero até hoje. O meu mercado é a Europa, é o lugar que mais consome meu trabalho. Não é o que está mais em alta no nosso país, como o funk e o sertanejo.
A Bossa Nova é muitas vezes considerada uma música de gerações mais velhas. Como você vê isso e como acha que pode mudar essa percepção entre os jovens?
Meu público são pessoas mais velhas na maioria das vezes. Os jovens, às vezes, nem sabem da existência do gênero. Eu cresci na periferia e tive muito contato com o funk, minha carreira poderia ter sido outra. Conheci a Bossa Nova e me apaixonei. A elitização muitas vezes não permite a introdução do som para as pessoas. E só quem tem condição financeira consegue ir a shows. Espero que minha presença mude isso.
*Estagiária sob a supervisão de Severino Francisco
Saiba Mais