Sensível, criativo, exemplar e singular. Com essas palavras que os familiares, amigos e ex-alunos de Clodo Ferreira o definem como pessoa. O compositor, instrumentista, poeta, publicitário e professor da Universidade de Brasília (UnB) faleceu, aos 72 anos, na manhã de terça-feira. Na cerimônia de despedida, ocorrida ontem, no Cemitério Campo da Esperança, na Asa Sul, os admiradores relembraram o legado construído pelo artista.
Nascido em Teresina, Clodo chegou a Brasília quando era um garoto e, em solo candango, fez sua história. Em 1965, quando tinha 15 anos, passou a integrar a banda Os Geniais e, mais tarde, entrou para Os Quadradões, conhecidas por animar os bailes da capital recém-nascida. Tornou-se também compositor. Ganhou fama nacional com parceiros como Fagner, em sucessos como Ave coração, Corda de aço e Revelação.
Na música, o trabalho mais recente foi lançado em março deste ano. O álbum Calendário tem 14 faixas compostas para trio de sopros e gravadas pelo grupo Nós na madeira. Além disso, teve músicas interpretadas por artistas, como Nara Leão, Milton Nascimento, MPB-4, Ângela Maria, Ney Matogrosso, Zizi Possi e Dominguinhos.
Para além do universo musical, Clodo tornou-se um prestigiado mestre da educação. Na UnB, dava aulas na Faculdade de Comunicação (FAC), na qual criou e ministrou disciplinas, como Comunicação e Música e Criatividade.
Pai e professor
A dedicação de Clodo não se resumia apenas ao âmbito profissional. Casou-se com Heloisa Helena Costa Ferreira, 77, há 47 anos, e preservava a união, com muito orgulho, até os dias atuais. Com a esposa, teve dois filhos brasilienses, Pedro Ferreira, 45, e João Ferreira, 43, que, músicos, seguem os passos artísticos do pai.
Ao Correio, o primogênito destacou que, apesar da tristeza de despedir-se materialmente daquele que tanto admirou, a família sente-se privilegiada de poder ter convivido e acompanhado, de perto, a trajetória de seu pai. "Ele tinha uma cabeça incrível, uma inteligência fora do normal. A produção artística dele não parou durante o período da doença e, agora, a gente quer aproveitar tudo que tem pendente, queremos mostrar para o mundo, para valorizar, divulgar e continuar a honrar o legado dele", contou.
Emocionado, Pedro ressaltou que Clodo não era, para ele, apenas um pai, mas um professor e um amigo. "Meu pai era incrível, eu não tenho como descrever. Fui aluno dele na UnB, toquei com ele nos palcos, estive ao lado dele nos momentos mais difíceis e nos momentos mais felizes, também. Tive um grande privilégio."
Avô de um casal, Caio, 9, e Maria Helena, 7, Clodo foi descrito, pela nora, Raiana Falcão Ferreira, esposa de Pedro, como "vô apaixonado". "A gente sente muito orgulho dele, era um avô apaixonado, um sogro maravilhoso... tinha uma perspicácia, era o tipo de pessoa que a gente sentava para ouvir e tinha sempre história engraçada, uma piadinha boba, mas, ao mesmo tempo, Clodo nos levava a conversas profundas sobre questões importantes da vida", lembrou.
Amigo venerado
Divergindo do cenário geralmente presenciado em velórios, o funeral do artista foi marcado por sorrisos. As mais de 300 pessoas presentes no local fizeram questão de usar o momento para relembrar os bons momentos vivenciados ao lado do artista.
O ator Murilo Grossi tinha Clodo como um "amigo da vida toda". Conheceram-se no início da década de 1980 por meio do movimento cultural, que, à época, era integrado no Brasil inteiro. "Dimensionar o Clodo como um grande músico e poeta de Brasília é muito menos do que ele era. Clodo era um grande músico e poeta brasileiro que vivia em Brasília", pontuou.
Para o poeta Nicolas Behr, amigo e admirador do artista, é inegável que o legado construído permanecerá no inconsciente coletivo das próximas gerações. "Ele teve a grandeza de compartilhar o talento que tinha para música, para a poesia e para a letra, não escondeu isso de ninguém e é o que era mais visível nele, o saber compartilhar."
Um mestre notável
Dione Moura, diretora da FAC, também esteve presente na cerimônia. À reportagem, declarou ser impossível citar todas as belezas da carreira do professor. "Ele realizou uma docência na qual sempre trouxe as outras faces dele, a de poeta, a de músico, instrumentista e de agente produtor cultural, todas essas dimensões eram trazidas para a sala de aula. Na faculdade, criou a disciplina Comunicação e Música e tinha uma leitura na linha de Paulo Freire, em que enxergava a comunicação como elemento de transformação social. Ele deixa uma herança muito grande para a FAC, foi privilégio tê-lo", finalizou.
Murilo César Ramos, professor aposentado da FAC, foi orientador de mestrado de Clodo. Elogiou o talento de Clodo, mas destacou sua modéstia. "A sensibilidade dele, para tudo que fazia, era a sensibilidade de um artista e é essa lembrança que eu vou carregar dele para o resto da minha vida", disse.
Marineide Gomes, 49, é ex-aluna e grande admiradora de Clodo. Em meados de 1998, cursava letras- português, mas, em certo semestre, escolheu, como disciplina optativa, frequentar a aula de Criatividade e Comunicação, ministrada por Clodo. "Cursar a disciplina com ele trouxe à tona essa parte de criatividade, de comunicação, que já estava em mim. Nós, ex-alunos, somos todos discípulos do Clodo nesse sentido", contou.
Gostou da matéria? Escolha como acompanhar as principais notícias do Correio:
Dê a sua opinião! O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores pelo e-mail sredat.df@dabr.com.br