PRATA DA CASA

Protagonista no cinema, Bernardo Felinto fala sobre nova fase da carreira

Formado pela UnB e pela Faculdade Dulcina de Moraes, ator e roteirista brasiliense de 39 anos fala ao Correio

Bernardo Felinto, ator e roteirista -  (crédito: Felipe Ponce/Divulgação)
Bernardo Felinto, ator e roteirista - (crédito: Felipe Ponce/Divulgação)

O longa brasiliense Letícia, lançado nos cinemas neste mês, protagonizado pela atriz Sophia Abraão, traz como principal nome masculino um velho conhecido do público que consome cultura na capital do país. Trata-se de Bernardo Felinto, uma verdadeira prata da casa. 

O fruto do Distrito Federal cursou artes cênicas na Universidade de Brasília (UnB) e na Faculdade Dulcina de Moraes, esteve por 10 anos com o grupo local De 4 é Melhor, protagonizou grandes sucessos nos palcos candangos como o aclamado Não durma de conchinha e, há 15 anos, mantém uma escola de teatro que formou mais de 10 mil alunos.

Revelado para o Brasil por meio do humorístico Zorra, da Rede Globo, o ator e roteirista de 39 anos esteve no elenco de apoio de várias produções da emissora — sendo por três vezes contratado: em 2013 para gravar a novela Joia rara; em 2014, Malhação; e em 2019, Órfãos da terra. No cinema, Bernardo atuou nos sucessos Minha mãe é uma peça 3, entre outros. O filme Me deixe não ser, de autoria do brasiliense, ganhou diversos prêmios de melhor roteiro. 

"Por mais que seja clichê, tem uma regra que se impõe: o personagem que tiver que ser seu, será seu", declarou  ao Correio Bernardo Felinto, que é fundador do canal Só 1 minuto, no Youtube, o maior canal de humor do centro-oeste, com mais de 30 milhões de visualizações e 180 mil inscritos.


ENTREVISTA | Bernardo Felinto

Você tem uma longa carreira no teatro, com participações diversas em audiovisual. Agora, faz o seu primeiro protagonista de um longa comercial no cinema, após ter protagonizado um curta que roteirizou. Queria que comentasse sobre esses trabalhos.

Eu comecei a me interessar mais pelo cinema depois de ter feito algumas novelas na Globo. Já tinha uma carreira de 20 anos no teatro, e queria trabalhar mais no audiovisual. Fui para Nova York, em 2018, para fazer um curso de cinema, que envolvia atuação e roteiro, porque já escrevia para teatro e queria começar a escrever pra cinema. De lá para cá, escrevi três curtas-metragens e fui o protagonista de todos eles — comecei a me envolver muito com o cinema. E dois deles foram bastante premiados em festivais. Mas protagonizar um longa foi bem diferente, foi um trabalho que exigiu muita concentração e disposição física e emocional, porque são muitas horas de gravação por dia e as gravações não seguem a ordem cronológica do roteiro. O personagem tem que estar muito sólido para o ator não se perder no estado emocional de cada cena.

Conhecida como capital do rock, e tendo lançado também o Natiruts, que é do reggae, Brasília também tem uma grande representação artística na dramaturgia, mas ainda é pequena, se comparada ao eixo Rio-SP. Como você enxerga esse mercado para o ator brasiliense?

Brasília tem uma cena artística fortíssima, contudo, o audiovisual está centrado no eixo RJ-SP. As televisões abertas estão lá e os streamings são produzidos lá também. Atualmente, com as plataformas digitais, a escolha do elenco se democratizou um pouco. Então, o ator que não está neste eixo pode mostrar seu trabalho mais facilmente. Mas as grandes produções ainda estão longe de Brasília, embora muitos filmes sejam feitos aqui. O ator, não só o brasiliense, tem que se movimentar e estar disponível para trabalhos. Vejo atores atualmente que não moram no eixo RJ-SP, mas fazem seus trabalhos por lá e voltam para a sua cidade. Eu fiz isso durante muitos anos quando estive na Globo. Mas também acho que, se desde o início o ator estiver nesses centros de maior visibilidade, isso pode ajudar na carreira, pela rede de contatos que vai se formando ao longo dos anos.

Como você avalia a dinâmica de testes de elenco para as produções de tevê e streaming em relação aos artistas espalhados pelo Brasil? Considera que é democrática?

Hoje está muito mais democrático do que há 10 anos, por exemplo. As plataformas de elenco permitem isso. Após a pandemia, raramente tem testes presenciais. Então, acredito que sim. Os atores têm que enfrentar os testes como um trabalho, se preparar pra isso e apresentar o seu melhor. Se vai ser escalado ou não, não está no seu controle. A questão é que, principalmente para atores iniciantes, isso causa uma certa ansiedade. Eu já passei por isso no início. Fica uma impressão que a sua vida artística inteira depende da aprovação daquele teste e não é assim. Por mais que seja clichê, tem uma regra que se impõe: o personagem que tiver que ser seu, será seu. A vantagem hoje é: você pode fazer testes online, não precisa se deslocar até o RJ ou SP. Eu prefiro os testes presenciais, mas entendo a facilidade do online, e acho que permite uma abertura maior para atores do Brasil inteiro.

 Leticia
Em "Leticia", Bernardo Felinto é protagonista ao lado de Sophia Abraão (foto: Studio 10 Filmes/Divulgação)


No teatro, a sua presença mais forte foi em grupos locais de comédia, mas você disse, em certa ocasião, que não gostaria de ser conhecido como artista do humor. Essa percepção de imagem se desfez?

Eu trabalhei com comédia durante 15 anos no teatro. Em Brasília, durante 10 anos com o grupo De 4 é melhor. Fiz Zorra total durante 2 anos, comecei em 2012. E só fui para o Zorra porque um produtor de elenco da Globo me viu no teatro, no RJ, fazendo comédia. Eu gosto muito de fazer comédia, mas hoje depende da proposta. Fazer comédia é, na minha opinião, mais difícil do que fazer drama. Na TV, preferi me afastar da comédia um pouco; no teatro, continuo fazendo, em Brasília. Estive em cartaz recentemente com a peça Tudo sobre nossa vida sexual, que é uma comédia, e adoro fazer. O que me incomodava antes era ser reconhecido como comediante, porque não quero esse título. Sou um ator que faço comédia, talvez essa seja a melhor definição.

Acredita que esse protagonismo mais comercial em Letícia era a oportunidade que faltava para você ganhar mais notoriedade no audiovisual?

Creio que ser um protagonista em um longa comercial pode fazer com que os produtores de elenco me vejam de outro maneira. Existem atores de uma vida inteira que ainda não fizeram um protagonista nos cinemas, então acho que é um poder de validação sim. Mas não dá para cravar ao certo como isso vai se manifestar. Eu não acredito que o ator deve se acomodar e esperar convites. O ator tem que se produzir, por ele, fazer o que acredita, tudo que vier é consequência e sujeito a aceitação ou não dependendo do contexto. Hoje, eu consigo selecionar um pouco melhor os projetos que vou aceitar, mesmo que seja no audiovisual, se não for algo interessante, prefiro não fazer. Eu gosto da composição do personagem, o meu desafio está nesse lugar, então o que surgir nesse sentido, eu vou estar sempre disponível.

Em Brasília, você dá aulas de teatro. Além das lições de interpretação, qual a principal lição que você costuma transmitir aos seus alunos?

O Curso de Teatro Bernardo Felinto existe há mais 15 anos em Brasília. É um curso para formação de atores e, mais do que isso, é um curso de desenvolvimento pessoal. Nem todos que entram no curso querem ser atores profissionais, mas para os que querem, sou franco, o importante é estar preparado e treinado antes de entrar no mercado de trabalho. Não adianta querer fazer um mês de aulas e querer entrar na TV, não é assim que funciona. Ser ator é uma profissão, existe um estudo prévio, conhecer o mercado, não é ser famoso primeiro como influencer para depois ser ator. A outra coisa é a autoprodução, que é fundamental.

Acredita que é possível viver em Brasília e trabalhar com arte no eixo Rio-SP?

Sim, venho fazendo isso há muitos anos. Mas já morei no RJ algumas vezes, já morei em SP também. E hoje, acredito que com os testes on-line, isso facilita muito. Você pode morar onde for, fazer um trabalho fora e voltar. A questão é: morar no eixo RJ-SP permite conhecer mais pessoas da área, fazer conexões, projetos.

Em 2019, você teve um roteiro de cinema premiado internacionalmente. De lá para cá, como tem sido o seu investimento nessa área?

Ganhar prêmios no cinema é uma realização, porque são obras autorais. Esses curtas que ganham prêmios fora foram obras que eu escrevi e atuei, então são projetos que tenho um carinho muito grande, inevitavelmente. A questão é, fazer cinema no Brasil é uma arte muito cara, então se leva muito tempo desde o roteiro até a pós-produção. Um projeto de cinema raramente é feito em menos de 2 anos. Já vi projetos que levaram quase 10 anos pra entrar em cartaz. Mas continuo querendo produzir cinema, é a arte que mais gosto de fazer atualmente.

Quais são os seus próximos projetos?

São muitos. Quero voltar para o RJ com uma peça minha, ainda estou avaliando qual será o gênero. Quero fazer mais cinema também, estou com alguns parceiros nessa área e estamos em negociação para um próximo projeto. Eu tenho um projeto para voltar para a internet também, voltar com o canal só 1 minuto ou algo nesse sentido. Esse canal teve mais de 30 milhões de acessos há alguns anos e sinto que pode, ainda, render bons aprendizados e possibilidades.

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postado em 20/06/2024 08:00
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