Foi com a dimensão da popular figura presente nos quadrinhos e no imaginário infantil, a de um gigante, que o múltiplo e amado artista Ziraldo partiu, aos 91 anos, num apartamento do bairro da Lagoa, no Rio de Janeiro. Ilustrador de relevância internacional, Ziraldo encantou mesmo os olhos e aguçou as mentes de milhões de brasileiros no campo das charges, do cartum, da pintura, do jornalismo, do teatro, da literatura e ainda do cinema. Um fenômeno indissociável de Ziraldo veio pela publicação do livro O Menino Maluquinho, personagem que circulou em mais de 130 edições, tendo sido publicado em várias línguas. Formado em direito, desde 1957, Ziraldo se deu ao direito de advogar tão somente a favor de sua expressão artística, assumindo incontestável legado pop. A morte, ontem, se deu por volta das 15h, na tranquilidade do sono.
Uma galeria de mais de 80 personagens foi criada a partir da imaginação do mineiro de Caratinga, primogênito em prole de oito irmãos. O pontapé na carreira foi dado quando, ainda criança, teve desenho publicado no A Folha de Minas. Com o gosto herdado pelas artes em geral, Ziraldo Alves Pinto repassou a paixão pelas artes para os filhos: as cineastas Fabrízia Alves Pinto e Daniela Thomas, além do filho, compositor, Antonio Pinto.
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Com livros cujas vendas ultrapassaram a marca dos 10 milhões, dialogou com todos os tipos de leitores. Fundador da crítica e irreverente revista O Pasquim, fundada em 1969, exerceu influência política nos idos de 1960, tendo, inclusive, sido preso um dia após a promulgação do Ato Institucional nº 5. Mas sua capacidade brincante foi igualmente celebrada em reconhecimentos como a atribuição da Medalha de Honra da Universidade Federal de Minas Gerais (2016) e a titulação como Doutor Honoris Causa da Universidade Federal do Rio de Janeiro (2017). Foi consagrado ainda pelo Instituto Nacional do Livro pelo prêmio Jabuti, assim como pela Associação Nacional de Imprensa, pela Associação Paulista dos Críticos de Arte, além da vitória no Salão Internacional de Caricaturas de Bruxelas e o Prêmio Ibero-Americano de Humor Gráfico.
Com o traçado singular, o humorista cravou na memória dos brasileiros tipos inconfundíveis como O Bichinho da Maçã, demonstrou a força maternal que muitas vezes sufoca em Supermãe, compartilhou a acidentada estrada de O joelho Juvenal e evocou a bondade em primeiro plano do tranquilo e, por vezes, apático Jeremias, o bom. A exploração da coletividade e de mensagens com teores sociais e ambientais foi unificada em A turma do Pererê, que tinha por cenário a Mata do Fundão e rendeu a Ziraldo o título, entre os anos de 1960 e 1964, de autor único para a revista que circulou no país naquele período.
Dono de impacto que atravessa gerações, Ziraldo integrou a frente de publicações como o Jornal o Brasil e as revistas O Cruzeiro, A Cigarra e Visão. O quadrinista que fortaleceu a diversidade obteve uma apoteótica homenagem, com a itinerante exposição Mundo Zira — Ziraldo interativo, montada sob a curadoria da sobrinha Adriana Lins e da filha Daniela Thomas. Há dois anos, na passagem por Brasília, levantou a curiosidade de 65 mil visitantes. Montada há mais de mês no Rio de Janeiro, a exposição permite que composições digitais acoplem as impressões de toques pessoais dos visitantes.
O tato afiado, dado o grafismo marcante, frutificou em experiências ímpares no cinema. Garota de Ipanema (1967), no cinema, juntou a porção ator de Ziraldo num filme de Leon Hirszman, enquanto o cômico global Chico Total (1981) contou com sua arte de roteirista. Os mais jovens vão lembrar das pitadas de Ziraldo perpetuadas em títulos como Menino Maluquinho: O filme (1995), de Helvecio Ratton; Menino Maluquinho 2: A aventura (1998), de Fernando Meirelles e Fabrízia Pinto; e Uma professora muito maluquinha (2011), estrelado por Paolla Oliveira e com participação de Chico Anysio. A multifacetada e lúdica inquietude do mundo de Ziraldo ainda rendeu para o audiovisual a série de tevê comandada por Anna Muylaert e Cao Hamburguer, Um Menino Maluquinho, em 2006.
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