As redes sociais acabam de eleger, na sexta-feira (2/2), mais uma vítima de cancelamento - desta vez, se trata de um autor consagrado, prestes a completar seu centenário de morte. Ninguém menos que Franz Kafka. A campanha começou com uma postagem de uma internauta que se identifica como antipornografia, compartilhando o print de uma pesquisa do Google segundo a qual o escritor era viciado em conteúdos pornográficos, nunca se casou e frequentava bordéis.
A mensagem logo viralizou e ultrapassou as barreiras da língua inglesa. Não tardou para que as buscas do X, antigo Twitter, se enchessem de termos em português como "Kafka cancelado" ou "Kafka e pornografia".
Na versão brasileira da polêmica, grande parte dos comentários entra em defesa do autor. Para esses internautas, a crítica teria contornos de moralismo - afinal, nem sequer havia uma indústria pornográfica naquela época, ao contrário de hoje, quando altos investimentos são feitos em filmes eróticos e há questionamentos sobre abuso de mulheres em cena. Para alguns, trata-se de um anacronismo, por falar em cancelamento de um autor que viveu nos moldes da cultura de sua época, a Checoslováquia do início do século 20.
Em um artigo do The Guardian, em 2008, intitulado Kafka Guilty Pleasures (Os prazeres culposos de Kakfa), Nicholas Lezard já discordava dos que questionaram a genialidade do escritor a partir de seu gosto por pornografia. O jornalista argumenta que descobrir esse fato - que veio à tona com uma das biografias de Kafka assinada por James Hawes - poderia até ser entendido como uma nova forma de interpretar sua obra, que aborda temas como culpa e repressão, em obras como A Metamorfose e O Processo.
Quem provavelmente se divertiria com essa polêmica seria Roland Barthes, filósofo francês pai da teoria da "morte do autor". Seu estudo aponta que, a partir do momento em que uma obra vem ao mundo, ela é reinterpretada pelas várias leituras que recebe.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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