Sob um terço do orçamento do primeiro filme Nosso Lar (que custou R$ 20 milhões), e com altos números de sessões, uma vez que foi lançado, na última quinta-feira, em 927 salas de 725 cinemas brasileiros, Nosso Lar 2 — Os mensageiros bem que poderia ter o intertítulo A missão. Há 13 anos, o primeiro filme da série conseguiu levar mais de 4 milhões de pessoas aos cinemas e, mais do que isso, ativou o contato de um público internacional, integrado em 40 países, com uma adaptação de obra de Chico Xavier. "Acho que a gente tem uma boa história, e bem contada, com o entendimento das pessoas, ela emociona, faz pensar e gera entretenimento, num entendimento de que seja uma história para todas as pessoas — assim como foi o primeiro filme —, eu acho que a gente está cumprindo o nosso dever", avalia o diretor Wagner de Assis, em entrevista ao Correio.
"Tudo fica bem, um dia", comenta, no enredo o Dr. André Luiz (Renato Prieto) que, na tela, se junta ao iluminado Aniceto (Edson Celulari) e demais considerados anjos da guarda para se envolver na proposta de intercâmbio espiritual. "Realmente, são muitas dimensões e muitas camadas de enredo, na tela. Então, ao ler o roteiro, vi que era confusa a leitura (risos), e não entendi nada... Numa página, (a história) voltava de época e, depois, já estava tudo em outra dimensão! No processo de feitura, fui entendendo tudo, e, agora, que vi pronto, notei que faz todo o sentido", comenta a intérprete de Isis, Fernanda Rodrigues.
Ela é uma personagem fundamental, quando se observa o sofrimento que atinge Otávio (Felipe de Carolis) e Isidoro (Mouhamed Harfouch), unidos pela missão de muita caridade, no plano terrestre. "Depois de 13 anos, o país é outro e nossa sociedade se transformou. Saímos de uma pandemia, para mim foi inédito o hiato entre um filme e outro. Mas o novo filme é independente: quem ler o livro, verá; mas quem não leu, pode assistir; quem não viu o primeiro filme, pode ver esse segundo. Apostamos, no fundo, na qualidade da história que vem de um conteúdo muito muito raro e potente, que é a obra do Chico Xavier", destaca Wagner de Assis.
Diante de camadas de história, o roteiro é complexo, e, literalmente, atravessa não apenas planos cinematográficos, mas, também, espirituais. "Não participei do primeiro filme e, assistindo ao segundo, me veio a impressão de profundidade, que não vejo como complexidade: as histórias apresentadas são simples e localizam relações de personagens familiares. No mundo pós-pandêmico, acho que o filme se torna ainda mais necessário, propondo reflexões de compaixão. Só falamos no dia a dia de outros temas. De repente, vem o amor, um amor maior, que não é o romântico. Fala-se de perdão e de valores que fazem parte da vida, mas que a gente, muitas vezes, não para, numa reflexão", avalia Edson Celulari, intérprete de Aniceto.
Pelo que escuta, nas ruas, Celulari potencializa as expectativas ("entregamos nosso filho para o mundo", ressalta). "No primeiro, não houve só a questão da gigante doutrina espírita, e o filme vai além. Quem fala comigo, diz: 'o primeiro me tocou de uma forma!'... Não está assegurado o sucesso, já que o cinema vive uma dificuldade, principalmente o cinema nacional. Mas com filmes brasileiros tem transparecido uma reação, por meio de longas que têm apresentado cifras acima de 1 milhão de espectadores", observa, esperançoso.
Temas como a transitoriedade da matéria, visões de resgate e salvação humana, a descoberta de mediunidade, conceitos de psicosfera (a atmosfera psíquica) e do ato de volitar (o ato de flutuar no plano espiritual) acompanham a carreira de Fernanda Rodrigues, desde a novela A viagem (1994). "Na vida pessoal, não vivo muito isso, mas fui vivendo, de acordo com o desenvolvimento do (novo) filme. Eu me envolvi com o assunto, lendo bastante, conversando e debatendo. Mas na minha vida, não tive experiências relacionadas ao tema", explica a atriz. A "felicidade de não julgar e servir, incondicionalmente" junto com a alternância entre vida e morte tomam Isis em muitas das cenas do filme. A presença masculina está mais associada a fracassos de trajetórias (como no caso do empresário Fernando, com interpretação de Rafa Sieg) e de conflitos ("O mundo lá fora, morde" é um dos enunciados ouvidos). Já as mulheres estão concentradas numa rede de amor.
"Os personagens femininos são muito importantes nesse lugar do amor. Os homens estão ali muito nos seus conflitos e em embates emocionais, e as mulheres trazem exatamente esse olhar generoso do amor, da calma e da tentativa de paz. Tentei trazer para a Isis essa qualidade de amor", explica Fernanda Rodrigues. Com uma participação vital do experiente ator Othon Bastos, Nosso Lar 2 traz para "a escola" do mundo (descrita na tela) preceitos como "o que fazemos de bom é nosso advogado para a eternidade". E ainda outros ensinamentos até mesmo para o poderoso Aniceto que, como anjo, pode perder para sempre a tutela sobre o confuso Otávio (um médium sem muito norte).
Brasília inspiradora
Entre ensinamentos sobre as condições daqueles que vivem em palacetes ou choupanas, Nosso Lar 2 perpetua, no ambiente, especialmente na cidade espiritual do Nosso Lar, as referências à cidade idealizada ou utópica. A referência é Brasília. Tudo, em grande parte, constituído pelos recursos do chroma key (que combina imagens reais com visuais criados em computador), no qual os protagonistas, inicialmente, contracenam sem circunstâncias definitivas. "O primeiro filme respirava um pouco o nível da qualidade do projeto arquitetônico de Oscar Niemeyer, numa real decisão da equipe. Como o novo filme se passa muito menos na cidade espiritual, com uma área reservada ao centro de mensageiros e ainda o bosque das águas, buscamos zelar pela uniformidade", observa o diretor Wagner de Assis.
Sem ter por modelo as flores artesanais da Torre de TV ou os vistosos ipês da capital, os criadores do filme colocaram em foco a natureza de Brasília. "Quis dar mais atenção para a vegetação; tentei buscar algo especial, muito falado pelo André Luiz (autor psicografado por Chico Xavier): a preponderância das flores, à noite, gerando energia, e, buscando luzes, procurei entregar uma cidade bem mais colorida do que a primeira cidade (de Nosso Lar 1, de 2010). Tudo nos foi possibilitado pela computação gráfica e gostei muito do que conseguimos alcançar", reforça o cineasta.
"Não vem a ser nada de novo no cinema, o chroma key que ajuda na narrativa. Faz parte, então, a gente, às vezes, é obrigado a usar a fé cênica (risos), e estamos num filme que fala de fé. O ofício do ator é o do brincar, o de fazer de conta e acreditar, além de fazer acreditar, naquilo que supostamente estamos vendo. Faz parte do nosso trabalho e não é uma coisa impossível: fico curioso para saber é, com o uso da inteligência artificial, como será tudo no futuro", conclui Edson Celulari.
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