De repente, um encontro inusitado de gerações, sem conflitos, em tom de homenagem e reverência. É assim que a banda Mombojó entra no clima de carnaval, destacando como figura central Alceu Valença, ícone das brincadeiras de rua e dos clubes, eternizado em várias canções, mas lembrado agora pelas chamadas composições do "lado B" no disco Carne de caju, feito apenas com covers da banda Mombojó e do repertório do artista.
Uma das bandas de maior sucesso na cena alternativa pós-manguebeat do Nordeste, Mombojó, formada por Felipe S. (voz e guitarra), Marcelo Machado (voz e guitarra), Chiquinho Moreira (teclados e sintetizador), Vicente Machado (bateria) e Missionário José (baixo, sintetizador), encontrou o lugar onde começou: a infância. Com os integrantes criados em Pernambuco, os músicos ouviam desde crianças as canções de Alceu e, já como banda, perceberam que era hora de homenagear esse grande mestre.
Com canções como Chuva de cajus, Como dois animais e Olinda, o grupo apresenta o encontro com essa criança interior dos integrantes. O CD é lançado justamente quando a banda completa 20 anos do primeiro álbum. Em 2024, do Mombojó, a banda decidiu fazer um passeio ao passado em busca de referências e comemorar o processo para, só aí, pensar no futuro. A seguir, os principais trechos da entrevista da banda concedida ao Correio
Entrevista // Mombojó
Lançar um disco com as músicas de Alceu Valença é uma grande responsabilidade. Como vocês lidam com essa responsabilidade de tocar a obra desse ícone da música pernambucana?
A gente se preocupou em gostar muito dos arranjos. Acho que isso gera uma força interna para executar as músicas ao vivo, e, quando se preocupa demais em agradar, essa força não acontece. Fomos avaliando, música a música, o que seria melhor para cada arranjo. Para nós, Alceu é o principal artista pernambucano vivo, mas isso não gera um peso na realização do trabalho. Nosso intuito é nos aproximarmos mais das nossas raízes pernambucanas, e esse repertório oferece essa possibilidade, na nossa opinião.
A escolha por músicas mais "lado B" teve algum motivo específico? Como foi a escolha do repertório?
Alceu, por ter um vasto repertório, possui muitas músicas belíssimas que não são muito tocadas. No entanto, para nós, que crescemos ouvindo nossos pais escutarem esses álbuns dos anos 1980, conhecemos e temos uma conexão afetiva com várias dessas músicas. Dessa maneira, acabamos escolhendo algumas menos conhecidas dentro do repertório dele. Amor que vai, por exemplo, foi a primeira música que pensei em gravar; é uma música que adoro desde a infância. O repertório foi escolhido em conjunto. Fizemos uma lista de músicas, e cada um ia sugerindo algumas, descrevendo uma possibilidade de arranjo. Foi um processo de tentativa e erro.
O que vocês colocaram de Mombojó em Alceu e o que tem de Alceu no Mombojó?
Fizemos uma brincadeira em algumas músicas, copiando arranjos do Mombojó e incorporando em nossas versões. Foi assim em Sino de ouro; Chiquinho utilizou o mesmo arranjo de teclado que ele fez na música Me encantei por Rosário, do Mombojó, e fizemos o mesmo na música Estação da luz, utilizando a mesma batida da canção Papapa, do Mombojó. Ao explorar mais profundamente o repertório de Alceu, descobri que tenho muita influência do trabalho dele na minha criação, seja nas letras curtas, seja ao abordar temas da natureza, seja no jeito de cantar, esticando um pouco as sílabas. Essas influências vêm me contaminando desde a infância.
Este momento de carnaval tem a cara do Alceu. Por que Alceu é tão importante para o carnaval pernambucano?
Alceu sempre valorizou profundamente o frevo. No projeto Asas da América, que convidava diversos artistas renomados, ele começou a se aventurar no canto desse estilo, conquistando o reconhecimento de grandes compositores e arranjadores de frevo, que perceberam nele um intérprete excepcional. Acredito que tenha sido convencido de que o frevo estava totalmente alinhado com sua essência artística. Felizmente, essa convicção resultou em várias versões icônicas de clássicos do carnaval. Alceu rejuvenesceu o estilo ao criar novos sucessos, tornando-se algumas das canções mais executadas nessa época do ano até os dias atuais.
Qual outro artista a banda gostaria de homenagear assim como fez com Alceu?
A gente brinca que quer regravar Geraldo Azevedo e Zé Ramalho para, em seguida, lançar o Grande Encontro.
Esse disco vai ser um dos embalos deste carnaval. O que mais vai movimentar o carnaval do Mombojó?
Agora, estamos focados nesse trabalho. No show, misturamos o repertório de Alceu com as músicas do Mombojó. A ideia é que o espetáculo siga essa proposta, mantendo viva nossa história e discografia. O lançamento será muito especial. Faremos um show em 4 de fevereiro, no domingo pré-carnaval, no Recife Antigo, de forma gratuita, a convite da Prefeitura do Recife.
Além desse lançamento, o disco de estreia da banda faz 20 anos este ano. Há algum outro planejamento para 2024?
No segundo semestre, pretendemos realizar algumas ações, como o lançamento de um songbook e a criação de um novo show especial com o repertório desse disco. No entanto, só após o carnaval iniciaremos efetivamente esse trabalho.
Em um exercício de imaginação, como vocês se sentiriam se o papel se invertesse e, daqui a alguns anos, alguma outra banda ou artista fizesse um disco em homenagem a vocês?
Seria um imenso prazer, com certeza, e estaremos totalmente dispostos a ajudar no que for possível.
Saiba Mais
Gostou da matéria? Escolha como acompanhar as principais notícias do Correio:
Dê a sua opinião! O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores pelo e-mail sredat.df@dabr.com.br