A semana de Festival de Brasília do Cinema Brasileiro continua a todo vapor. Nesta segunda (11/12), para o segundo dia de Mostra Competitiva no Cine Brasília, foram escolhidos filmes que abrem espaço para as mais diversas narrativas pretas. Religiosidade, sexualidade e as questões sociais foram discutidas nos filmes que disputam o prêmio candango
A noite estava cheia, o público não se intimidou com a segunda-feira e praticamente lotou a sala de exibição do Cine Brasília. Com apenas 15 minutos de atraso, o público acompanhou de forma atenta o longa Mais um dia, Zona Norte e os curtas Axé meu amor e Erguida.
O longa da noite foi Mais um dia, Zona Norte, que fala sobre a vida no extremo norte do Rio de Janeiro. Inspirado no curta ficcional de 2006 estreado no festival, o documentário mostra a experiência de pessoas no próprio cotidiano e foca em momentos que fazem contraponto a toda a tristeza da pobreza, mostrando que há felicidade no subúrbio carioca e a alegria nas pequenas coisas do dia a dia. “É um tema universal. Na Noruega pode parecer distante, mas em 95% do mundo, em todas as periferias, existe uma empatia, uma similaridade” afirma Allan Ribeiro, diretor do longa.
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Além da direção, Allan também foi responsável pelo roteiro e a montagem. O diretor diz se sentir privilegiado por poder passar seus filmes no festival. “Me sinto privilegiado por ter passado tantos filmes aqui. Mas vamos dizer que eu me preparo para isso, guardo meus filmes para passar aqui” conta o diretor.
Mesmo o longa como atração da noite, os filmes que todos esperavam começaram com Axé meu amor, de Thiago Costa, o curta-metragem contava uma história de religiosidade e espiritualidade com Mãe Bené temendo a morte da própria mãe de santo. “A importância é desconstruir a intolerância religiosa e desconstruir tudo aquilo que as pessoas pensam sobre o candomblé, umbanda e jurema. Tudo que pensam sobre a nossa religião”, afirma Mãe Renilda, protagonista do filme e mãe de santo.
O diretor afirma que o filme mistura ficção com realidade em uma história importante. “Uma das coisas mais interessantes que esse filme propõe é sobre o amor, sobre as famílias que fogem do tradicional por meio do axé. Reverbera outras possibilidades para que possamos entender o axé dentro da sociedade e não afastado dela”, pontua Thiago, vencedor do candango de escolha do júri em 2022 com o curta Calunga maior.
O autor da história reconhece a importância do festival dentro da cena brasileira e comemora a presença de uma produção 100% paraibana na Mostra Competitiva. “O fato de estarmos aqui enquanto uma equipe completamente paraibana fala muito sobre o novo cinema do país e as novas narrativas que tem sido propostas atualmente”, comenta o cineasta.
O segundo curta era Erguida, de Jhonnã Bao, que conta a história de uma mulher periférica que precisa fazer a própria voz ser ouvida após se abalar com um problema na própria vida. “É uma narrativa que traz empoderamento para outros corpos, para outras narrativas que não sejam as hegemônicas. O nome do filme não é por acaso, é uma mensagem para erguermos as nossas vozes. Estamos construindo outras possibilidades de existência, então bora erguer!” enfatiza a diretora.
Mulher, preta, travesti e periférica, Jhonnã comemora o espaço. “É uma honra estrear no festival mais antigo do Brasil, estrear num lugar que tem a preocupação de olhar para o Brasil e trazer talentos que estão produzindo. Me incentiva a continuar”, conta. “Poder protagonizar e distribuir esse filme em um festival como esse mostra que as coisas estão dando certo e os caminhos estão se abrindo para que possamos trazer mais gente como nós. Somos os sonho da nossa transcestralidade. Queremos levar esse cinema travesti para o mundo”, reflete.
*Estagiária sob supervisão de Pedro Grigori
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