METAL

Angra estreia na Toinha Brasil Show a turnê do disco 'Cycles of pain'

Angra, icônica banda do heavy metal nacional, estreia na cidade a turnê de lançamento do disco 'Cycles of pain', recheado de sentimento e experimentação

Formada em São Paulo, no ano de 1991, Angra é uma banda inesquecível quando se discute metal pesado nacional. Adeptos da vertente do power metal, cuja marca são os arranjos melódicos e os vocais agudos, os músicos figuram há mais de três décadas como destaques internacionais no gênero, colecionando discos de sucesso como Angels cry e Rebirth. No momento, se empenham pela divulgação do álbum Cycles of pain, que será lançado depois de amanhã, e cuja turnê de lançamento estreia hoje, em Brasília, no Toinha Brasil Show, a partir das 20h, com abertura de Luiz Toffoli.

A trajetória de mais de três décadas, entretanto, não foi nada simples. Na extensa carreira, experimentaram à vera com as amálgamas entre metal e diferentes gêneros, desde a música brasileira até a erudita, visando reinventar a sonoridade do projeto constantemente. O grupo passou por severas mudanças em sua formação ao longo do anos, a mais crítica sendo a saída do vocalista original e fundador do conjunto Andre Matos, no começo dos anos 2000.

Atualmente, o proficiente guitarrista Rafael Bittencourt, único membro da formação original, encabeça o quinteto ao lado dos músicos Felipe Andreoli (baixo), Fabio Lione (vocal), Bruno Valverde (bateria) e Marcelo Barbosa (guitarra), esse último que, aliás, é candango.

Ao Correio, Rafael Bittencourt e Felipe Andreoli, os dois veteranos da banda, contam mais sobre os processo do lançamento Cycles of pain, que recobra dores pessoais dos integrantes — inclusive o falecimento de Andre Matos, em 2019 — e experimenta novos recursos estéticos e tecnológicos. O trabalho conta com participações especiais de nomes como Lenine, Amanda Somerville, Juliana D'Agostini e Vanessa Moreno.


Entrevista // Rafael Bittencourt e Felipe Andreoli

O que motivou a concepção do novo disco?
Rafael: A motivação foi o reencontro, a animação que veio no decorrer da gente voltar a fazer show junto, da turnê que a gente fez em comemoração ao Rebirth, primeiramente, depois dos shows de 30 anos. Pintou um amor mesmo, aquela coisa de dizer: "essa banda é f…, esses caras são f…, precisamos fazer música juntos".
Felipe: Eu senti muita falta de tocar, de subir ao palco, de tocar com meus amigos, até de ensaiar e de passar o som, no período da pandemia. Esse disco veio dessa saudade que a gente sentiu uns dos outros, que sentiu de tocar juntos. Quando a gente teve oportunidade de se encontrar para trabalhar nas músicas, foi muito rápido e muito intenso. O processo colocou para fora dois anos e meio de música presa aqui dentro.


Como foi o processo de composição?
Rafael: A gente se retirou numa casa para fazer as composições, que vieram em praticamente um mês e meio. A gente começou em setembro e no final de outubro já estava chegando o nosso produtor para gravar as músicas praticamente finalizadas. A gente previu que isso iria funcionar. Já sabemos como é o processo, então a gente consegue fazer uma programação com menos surpresas, mesmo com cada um morando num país, praticamente.
Felipe: A gente tem um processo bem aberto, vai jogando as ideias na mesa e elas vão acontecendo, o processo é muito fluido pelo respeito que nós temos um pelo outro. Já teve processo de composição que chegou a levar quase um ano em outros discos e esse de um mês e meio foi da mesma qualidade ou até mais eficiente.


Como tem sido trabalhar com essa formação do Angra, já estável há alguns anos?
Rafael: A gente vai amadurecendo e as relações vão ficando melhores. Hoje, em termos de relação, é o melhor momento que eu já vivi na banda em 32 anos. É gostoso estar junto, é leve e produtivo ao mesmo tempo. A gente consegue ser eficiente com o mínimo de estresse, que é natural de qualquer lapidação dos processos. Depois de quase 10 anos juntos, a gente sabe o que é o melhor para o grupo.
Felipe: Por mais que sejamos cinco personalidades diferentes, todos nós temos o mesmo objetivo. A gente balanceia bem os momentos de trabalho intenso com os momentos de lazer, de estar dando risada, contando piada. É um privilégio fazer parte desse grupo, porque nem sempre foi assim nessa banda. As coisas já foram muito mais penosas, difíceis e desgastantes. Não que hoje a gente não tenha nenhum tipo de problema, mas são problemas que adultos resolvem conversando e bola para frente.


Quais achados musicais se refletiram em inspiração para o disco?
Rafael: Uma banda que eu descobri na turnê de 2018 e me inspirou foi o Leprous. O streaming sugere muita coisa e tal, aí criei uma playlist que inclui bandas até um pouco mais antigas. Contortionist, Architects, Periphery, Katatonia, bandas assim. Eu comecei a ouvir bandas que têm uma maneira supostamente mais moderna e também um heavy metal dito bem europeu. Isso me inspirou bastante, apesar de, na hora de eu compor, acabar saindo muita coisa bem tradicional.
Felipe: Uma das bandas mais novas que eu andei ouvindo bastante foi Tesseract, que é uma banda inglesa. Mas eu fiz mesmo foi um mergulho profundo na carreira do Allan Holdsworth, que é um guitarrista de jazz fusion, que eu já conhecia, mas durante esse período da pandemia, realmente me aprofundei na discografia dele e foi uma grande influência para as minhas ideias dentro do Cycles of pain.


O ícone da MPB Lenine, está presente na faixa Vida seca. Como é a relação de vocês com esses artistas nacionais?
Felipe: Eu acho que existe um respeito mútuo. Todas as vezes que a gente se encontra com artistas e bandas brasileiras nos festivais e aeroportos, a gente sempre é surpreendido com os caras falando que admiram muito a banda, desde o Luiz Caldas até o Skank. No caso do Lenine, não foi diferente. Quando a gente estendeu o convite para participar do disco, ele falou: “Finalmente tá rolando uma colaboração entre nós. Eu sou fã da banda há muitos anos, estava esperando por esse momento”. Isso é motivo de grande orgulho, porque o Lenine, como várias dessas pessoas, são grandes referências para nós e grandes influências também. É muito gratificante saber que essa admiração é mútua.


Como vocês avaliam as transformações sofridas pelo metal desde os anos 1990?
Felipe: O heavy metal sempre foi um movimento underground de nicho, que, por poucos momentos, gozou de alguma atenção da grande mídia. Infelizmente, o heavy metal está decrescendo aos olhos dessa mídia. O espaço é cada vez menor e a gente sente isso no dia a dia, mas, no fim das contas, esse gênero sempre se mostrou um movimento de certa resistência. Quem curte heavy metal não está muito preocupado se a gente está tocando na TV. O heavy metal continua muito forte, os shows lotam, só que isso acontece longe dos olhos do grande público.
Rafael: O cenário dos anos 1990 era muito rudimentar. A cena do heavy metal profissional era uma guerra, tudo era muito difícil: desde o acesso a instrumentos até o acesso ao aprendizado. Por outro lado, existiam muitas bandas, porque havia uma paixão enorme. Existiram grandes bandas brasileiras nos anos 1990: Sepultura, que vem até um pouco antes, Angra, Overdose, Sarcófago… várias bandas que chegaram a ter exposição internacional. Hoje, em muitos aspectos, o acesso a certas coisas é mais fácil, mas eu acho que falta um pouco aquele sentimento de paixão e sacrifício. As gerações mais novas acham que tem que ser tudo muito fácil e muito rápido. Aí, se frustram logo e desistem.

Serviço

Cycles of Pain Tour

Hoje, a partir das 20h, na Toinha Brasil Show (SOF Sul Q. 9). Ingressos a partir de R$ 70, disponíveis no Clube do Ingresso. Classificação indicativa: 18 anos.

Serviço

Cycles of pain

Angra, pela Atomic Fire Records. Total de 12 faixas, com duração de 58 min. Disponível em todas as plataformas digitais a partir do dia 3/11.

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