Um dos rostos da era de ouro da televisão, Aracy Balabanian morreu na manhã de ontem, aos 83 anos, no Rio de Janeiro. Ela estava internada na Clínica São Vicente, na Zona Sul da capital fluminense, e lutava contra um câncer de pulmão descoberto há cerca de três anos. O velório será realizado em um teatro no Rio de Janeiro e aberto ao público. Depois, o corpo será cremado em cerimônia privada.
Foram mais de 50 anos de carreira, durante a qual Aracy interpretou mais de 30 papéis em telenovelas, sem contar no teatro, onde estreou ainda adolescente. Filha de armênios que imigraram para o Brasil em fuga do genocídio promovido pelos turcos otomanos, a atriz nasceu em 1940, em Campo Grande (MS), mas mudou-se para São Paulo já na adolescência. Ela contava que se apaixonou pelo teatro graças às irmãs, que a levaram para assistir a espetáculos quando a família morava na capital paulista. Uma peça de Carlo Goldoni encenada pela companhia Maria Della Costa teria sido a inspiração para virar atriz.
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Aos 14 anos, Aracy foi convidada para fazer um teste com o dramaturgo Augusto Boal e, em 1956, atuou pela primeira vez nos palcos em Almanjarra, de Arthur Azevedo. Ainda naquele período, o diretor deu entrevistas dizendo "guardem esse nome: Aracy Balabanian". Quatro anos depois entrou na Escola de Arte Dramática de São Paulo e também para o curso de ciências sociais, na Universidade de São Paulo (USP), este último por insistência do pai. Após três anos fazendo as duas faculdades, abandonou a sociologia para se dedicar apenas às artes cênicas.
O primeiro papel na televisão foi em 1964, na telenovela Marcados pelo amor, produzida pela então RecordTV. A produção, escrita por Walther Negrão e Roberto Freire, foi o primeiro passo para construir uma carreira sólida na tevê. No infantil Vila Sésamo, em 1973, ela viveu Gabriela e, no ano seguinte, foi protagonista da novela Corrida do ouro. Em 1975, fez sucesso em Bravo!, para mais tarde conquistar o público em produções como Elas por elas (1982), Guerra dos sexos (1983), Transas e caretas (1984), Ti ti ti (1985) e Que rei sou eu (1989).
Em Rainha da sucata (1990), ganhou o público com Dona Armênia, personagem na qual aproveitava as referências das próprias origens para construir um repertório de costumes e sotaques que caíram no gosto popular. Brilhou em A próxima vítima (1995), na qual Aracy deu vida a Filomena, uma mulher poderosa que controlava os negócios de uma família rica e era especialista em manipular todos ao redor. Em 2012, ela viveu uma avó em Cheias de charme e, em 2018, fez um de seus últimos papéis com uma participação especial em Malhação.
No campo do humor, em 1996, deu um novo passo ao integrar o elenco de Sai de baixo, em que interpretava Cassandra, a mãe de Magda (Marisa Orth), a pedido de Miguel Falabella. O programa esteve entre as maiores audiências do domingo e ganhou uma nova reunião em 2019. Em entrevista ao Conversa com Bial, a atriz contou que teve muita dificuldade em fazer o papel e chegou a pedir a Daniel Filho para deixar o programa porque não conseguia parar de rir dos improvisos de Miguel Falabella e Tom Cavalcante.
Teatro
Como a maioria das atrizes brasileiras consagradas, a paixão de Aracy Balabanian pelo teatro foi desperada cedo. Em São Paulo, a então futura atriz teria contato com grandes nomes do universo das artes cênicas ainda aos 12 anos. "Estava emocionada porque era aquilo que eu queria. É muito difícil para uma criança, ainda mais naquela época, querer ser atriz e já perceber que ia ter muitas dificuldades", declarou, ao arquivo Globo Memória, área da emissora Globo destinada a arquivar depoimentos e vídeos de artistas da casa.
Dois anos depois, Aracy Balabanian teria uma aproximação mais estreita com a dramaturgia. No Colégio Bandeirantes, tradicional escola da zona sul da capital paulista, assistiu a uma palestra de Augusto Boal, na época diretor do Teatro de Arena, um dos espaços que revelaram grandes nomes do teatro brasileiro como Paulo José, Juca de Oliveira e Dinah Sfat.
O diretor a convidou para um teste de elenco no Teatro Paulista do Estudante. A primeira peça teatral de Balabanian foi a adaptação de Almanjarra, de Arthur Azevedo. Ela também encenou espetáculos pelo Teatro Brasileiro de Comédia (TBC), no qual atuou em peças como Os ossos do barão, de Jorge Andrade (1963). A atriz esteve ainda no primeiro espetáculo com elenco brasileiro do musical Hair (1969), com direção de Ademar Guerra.
Admirador do trabalho de Aracy Balabanian, Guerra, dirigiu grande parte de seus espetáculos, entre eles Oh, que delícia de guerra (1966) e Boa noite, mãe (1985). Outros diretores trabalharam com a atriz, entre eles Eduardo Tolentino, com a peça O tempo e os Conways (1985), e Maria Lucya de Lima, com Clarice, um coração selvagem (1998).
A carreira sólida de Aracy foi reconhecida em Campo Grande (MS), a cidade natal da atriz, que inaugurou um teatro com o seu nome em 31 de outubro de 1989. A atriz, que costumava dizer que "atores são atores e celebridades vêm e passam", fez do palco um motivo de vida e atravessou praticamente toda a história da televisão brasileira. Ela não teve filhos e também nunca se casou.
*Colaborou Adriana Izel, Especial para o Correio