Não é de se esperar que a arte tão potente como a defendida por Zé Celso tenha permanecido somente na memória da plateia do teatro. O audiovisual foi aparato capaz de eternizar muito de seus rompantes criativos. Tadeu Jungle e Elaine Cesar, por
exemplo, foram diretores que, na caixa de DVDs Teatro Oficina (2009), conseguiram reunir, em filmagens de 2001, mais de 1200 minutos de obras como Bacantes, Boca de Ouro, Ham-let e Cacilda!.
No cenário, porém, nada superou o filme de Zé Celso e Noiton Nunes, O rei da vela, concluído em 1982, com imagens que incluíram trechos da remontagem, de 1971, da peça do Oficina, originada pelas inovações literárias de Oswald de Andrade. Sem linha cronológica, e estrelada por Esther Góes, Renato Borghi e José Wilker, a obra, valorizada como melhor filme e detentora de melhor música, no Festival de Cinema de Gramado, trata da depravação escancarada pela elite, a partir da dinâmica dos personagens Abelardo 1º (Borghi) e Abelardo 2º (Wilker), imersos num processo de repressão.
Prata Palomares (1972), que trouxe roteiro de Zé Celso, teve a assinatura de André Faria, e integrou, em 1977, uma seleção paralela no Festival de Cannes. Com Carlos Gregório no elenco, tratava de dois guerrilheiros que se viam presos ao cenário de uma Igreja, na companhia de uma misteriosa mulher, em andamento que culminava com uma pesada tortura policial.
O mesmo Zé Celso, que teve participações na novela Cordel encantado (2011) e na recente série Manual para se defender de aliens, ninjas e zumbis, sempre valorizou discursos de transformação. Dois filmes codirigidos por Celso Luccas, 25 (1977) e curta O parto (1975), se detiveram em processos de independência: o primeiro, filmado em Moçambique, e o outro, uma abordagem sobre a ditadura em Portugal e o desmantelar do salazarismo, a partir da Revolução dos Cravos (1974).
Passados 45 anos desde a estreia em cinema, em Um homem célebre (de Miguel Faria Jr.), Zé Celso encarou dos mais recentes trabalhos como ator, em Horácio (2019). No filme, há foco no impulso excêntrico de família em dissolução, liderada por um foragido inserido em trama que condena os excessos materialistas.
Em Brasília
Também recente, a obra Antropofaga Makumba (2018) retrata parte do insano show da Associação Uzyna Uzona constituído em 2011, mesclando dança, música e artes plásticas, e tendo por protagonistas figuras como Napoleão Bonaparte, Macunaíma e Tarsila do Amaral. O dom da celebração cênica foi capturado em Uzebrioloco (1990), de Adilson Ruiz, curta integrante da 23ª edição do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, e vencedor do "melhor momento fílmico do evento". Encenado trecho de Theatro Musical Brasileiro II, o artista celebrou a arte do irmão Luís Antônio. Brasília foi ainda cenário para o curta Zé(s) que justapôs os fundadores da Oficina-Teatro Perdiz (708/9 Norte), o mecânico Zé Perdiz, e o fundador do Teatro Oficina, Zé Celso. O filme de 2010, assinado por Piu Gomes, investiu na ideia da resistência da arte.
Saiba Mais
O audiovisual tratou ainda de cunhar legados mitológicos para o vislumbre de Zé Celso. Lírio Ferreira moveu Árido movie (2005), com uso da imagem messiânica de Zé Celso, ao tempo em que o coveiro Zé do Caixão o ladeou em Encarnação do demônio (2008); enquanto na cinebiografia Lara (2002) deu vida a modesto vendedor, Zé Celso ainda estrelou, como o demônio, o curta Bandida, de Camila Cattai (2017), ao lado de Helena Ignez, a mesma profissional que o dirigiu em Ralé (2015), que, com Ney Matogrosso, celebrava o cinema e toda a sorte de liberdade sexual.