TEATRO ENGAJADO

Provocação, tabus e distanciamento eram os ingredientes de Zé Celso

O teatro de José Celso Martinez Corrêa era engajado e contestador. Nudez, sexualidade, questionamento político e social estavam presentes nas encenações

Nahima Maciel
postado em 06/07/2023 11:35
 (crédito: CARL DE SOUZA)
(crédito: CARL DE SOUZA)

Nada era convencional quando se tratava de José Celso Martinez Corrêa. Ele foi o inventor do teatro transgressor contemporâneo brasileiro, a tragicomédiaorgia, como ele mesmo definia. Assistir a uma peça de Zé Celso não era uma experiência comum de ida ao teatro. Havia sempre uma tensão no ar, uma expectativa apreensiva diante das interações inevitáveis, nudez com frequência e muita ousadia em torno dos grandes temas tabus como sexo e sexualidade.

Zé Celso era estudante de Direito no final dos anos 1950, quando a cena teatral brasileira via surgir um novo caminho, ligado às vanguardas e pronto para dar os próximos passos para além do classicismo do Teatro Brasileiro de Comédia (TBC). Eram os tempos de muitas novidades na cultura brasileira, com a bossa nova mudando os rumos da música e a construção de Brasília trazendo para o primeiro plano a importância do modernismo nacional. Provocação e crítica eram lemas e Zé Celso fez dessa combinação os ingredientes básicos de sua dramaturgia ao fincou novos horizontes para o teatro brasileiro.

Experimentação e coragem guiavam o dramaturgo, que não hesitava em derrubar a tradicional quarta parede do teatro. Inspirado nas técnicas do alemão Bertold Brecht, que acreditava no poder transformador do teatro engajado, Zé Celso queria levar o público à reflexão crítica. Distanciamento dos personagens e não envolvimento emocional, comentários dos atores durante a encenação e entendimento do teatro como uma prática muito além do entretenimento levariam ao desenvolvimento do pensamento crítico.

Num momento de opressão e autoritarismo — com o Teatro Oficina, fundado em 1958, Zé Celso foi muito ativo na contestação ao regime militar instaurado em 1964 —, essa forma de fazer teatro podia ser libertadora. Em peças como O rei da vela (Oswald de Andrade), encenada em 1967, e Na selva das cidades (Bertold Brecht), de 1969, o Oficina teceu manifestos contra ditadura e dialogou com a realidade nacional de maneira provocadora. Roda viva, encenada em 1968 e de autoria de Chico Buarque, foi um dos marcos da contestação da opressão política no teatro. 

Mais tarde, em peças como Cacilda! (1998), de autoria do próprio Zé Celso, e As bacantes(1996), adaptação do clássico de Eurípedes, o dramaturgo convidaria o público a refletir sobre os limites do teatro, mas também sobre as convenções sociais, a repressão sexual e o corpo como forma de expressão artística. Nudez e masturbação estão presentes, assim como a fragmentação dos personagens e uma estética caótica. As Bacantes esteve entre as quatro peças trazidas a Brasília pelo Teatro Oficina em 2010, durante uma maratona realizada em uma enorme tenda montada em frente ao Teatro Nacional.

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