Na bruma leve das paixões que vêm de dentro, as festas de São João chegaram a Brasília. Desde maio, os brasilienses celebram os arraiás com muita canjica e bandeirolas no ar, e nesta quarta-feira (7/6), no estacionamento 6 do Parque da Cidade, Alceu Valença chega para brincar no quintal do Festival Junino. Além da boa música, as tradicionais barracas de comida e brincadeiras irão compor a cena do evento, que terá ainda um tributo ao artista símbolo da festividade: Luiz Gonzaga.
A homenagem ao Rei do Baião será de responsabilidade do Trio Balançado, que há nove anos desfila a cultura do forró por Brasília. A abertura dos portões está prevista para as 17h, e completam o line-up do festival Nego Rainer e DJ Jonnes Veloso.
Conterrâneo de Gonzagão, Alceu Valença também é sinônimo de São João. É a segunda vez do cantor e instrumentista pernambucano no Distrito Federal em pouco mais de um mês, sendo a sua última apresentação com a Orquestra Ouro Preto em 27 de abril.
Entrevista: Alceu Valença
Por que as festas juninas se mantêm tão populares hoje em dia?
Porque a internet deu ensejo a que os mais jovens ouçam forró e outros estilos típicos. Antigamente, era uma coisa imposta, quase sempre, pelas gravadoras. Você tinha determinados momentos que elas investiam apenas no samba, outro momento no reggae, depois no rock. A minha música, por exemplo, é totalmente diversa, e a internet deu tanta abertura, democratizou tanto a música que eu irei fazer uma excursão. O forró e a música brasileira legítima, de raízes, digamos assim, pegou na Europa de uma maneira inacreditável. Até lá você vai ter shows de São João que em Portugal, na Holanda, na Espanha, na Suíça e em outros países nós fomos favorecidos.
Tem alguma história sua envolvendo festa junina que você acha interessante?
Fiz um show em Juazeiro do Norte (CE), e, naquela época, eu cantava e fazia o meu forró como sempre fiz, com guitarra, com baixo, eu coloco teclado e bateria. E aí, às vezes os jornalistas diziam que eu era do rock 'n' roll, e o outro dizia que eu era da MPB, e o público também ficava dividido. Uns diziam que eu era da música popular brasileira e outros que eu era rock, mas sabia que não era. Enfim, estava em Juazeiro do Norte, terra de Padre Cícero, para fazer o show e, de repente, olho para a coxia, ou seja, para o lado do palco, e lá estava um senhor com uma testa grande danada e que era parecido com Luiz Gonzaga. Ele estava sem chapéu de couro e eu fiquei me perguntando 'será que é ele?'. Eu continuei cantando e pensei 'será que ele vai meter o cacete em mim?', porque ele era mais tradicional, se fosse o caso. Pois bem, cantei o show todo e ele, ao sair, de braços abertos, disse 'Alceu!' Eu digo 'quem é? É Seu Luiz?' De novo, quando eu ia saindo, ele de novo, de braços abertos disse 'Alceu!' Perguntei de novo se era Seu Luiz e ele 'Sou.' Aí, eu disse 'o senhor veio fazer um show aqui no Juazeiro?' Luiz disse que não, que veio diretamente para assistir ao meu show. Depois, meio constrangido, perguntei 'e o que é que o senhor achou do meu conjunto?' E ele disse: 'Alceu, você inventou uma coisa totalmente diferente, uma nova sonoridade, uma banda de pífano elétrica.'
O que ele queria dizer com isso?
Pois bem, ele estava dizendo que a minha guitarra fazia um dueto com a flauta, da mesma maneira que dois pífanos fazem, só que a sonoridade era outra. Eu já falava que não é um instrumento que define um gênero, ele é feito através do ritmo, da melodia e da harmonia. Eu contava essa história de Luiz Gonzaga e ninguém dava bola, mas aí ele me chamou para fazer uma música para ele, e eu cantei, com Carlos Fernando,a música Plano Piloto, e o Gonzagão deu aval total ao meu baião e aos meus shows de festa junina.
Como era a sua relação com Luiz Gonzaga?
Eu me encontrei com ele muito pouco, porque artista não se encontra, mas todas as vezes que nos encontramos era ótimo. Uma vez, nós estávamos hospedados no mesmo hotel, perto da praça Roosevelt, em São Paulo, e a gente foi almoçar ou jantar juntos com a família dele. Outra oportunidade foi em um show em Recife, quando ele estava doente, depois em um estúdio onde nós dois gravamos juntos. Então era assim, devagar, mas ele esteve sempre presente no alto falante da minha cidade, São Bento do Una, onde nasci e onde ouvia o som de Luiz Gonzaga tocando no Cine Rex, onde cantei pela primeira vez com quatro anos de idade.
Por que a música dele se mantém tão relevante?
A música dele, primeiro de tudo, é verdadeira. Você pode procurar na internet quantas visualizações ele tem no YouTube, inclusive depois de morrer. Tem muito mais do que pessoas famosas hoje em dia. Luiz Gonzaga esteve sempre dentro das festas juninas, e aqui no Brasil é um absurdo. Era uma coisa que a princípio estava no Nordeste. De repente, você chega no Rio Grande do Sul, que é longe, e o povo sabe tudo dele. Vai para o Amazonas, que é o outro extremo, e todo mundo sabe.
É a sua segunda passagem em Brasília em menos de dois meses. O que faz a sua relação com o DF ser tão especial?
Adoro Brasília, tenho inclusive duas músicas dedicadas à cidade. Antigamente, existia uma coisa que a gente demorava mais nas cidades que a gente ia fazer show, e Brasília era uma cidade que eu tinha muitos amigos. Adoro o público, as pessoas e tenho parentes e amigos que foram morar aí. Brasília é a capital cultural do país e também é uma cidade em que todos nós temos uma relação, tanto eu pernambucano, quanto paraibanos, quanto gaúchos e por aí vai.
*Estagiário sob supervisão de Severino Francisco
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