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Música

Após saída do Mutantes, Rita Lee se reinventou e marcou uma geração

Depois da saída do Mutantes, Rita Lee se reinventou e seguiu carreira solo com sucessos que marcaram várias gerações de fãs

A carreira de Rita Lee despontou na segunda metade dos anos 1960, quando fez parte da banda Os Mutantes, ao lado do então marido, Arnaldo Baptista, e do cunhado Sérgio Dias. Naquele momento, Rita esteve na vanguarda, à frente da primeira grande leva do rock psicodélico na América Latina. Inspirada por referências do samba pós-bossa nova, aquela virtuosa geração de artistas desembocou no Tropicalismo, o movimento musical mais importante do Brasil no século 20, que promoveu uma mixagem inédita entre samba e rock, baião e guitarras elétricas, berimbau e sons eletrônicas, parangolés de Helio Oiticica e performances teatrais, referências populares e eruditas.

Na banda, Rita cantava, além de tocar flauta, percussão, sintetizador e banjo, tirando sons musicais até de objetos triviais, como quando usou uma bomba de dedetização em Le premier bonheur du jour. Em 1967, Os Mutantes deram os primeiros sinais do impacto que causariam na MPB, acompanhando Gilberto Gil no 3º Festival de Música Popular Brasileira, na apresentação da canção Domingo no parque.

Em 1968, o grupo acompanhou Caetano Veloso na bombástica performance da música de protesto É proibido proibir, no Festival Internacional da Canção, e foram recebidos com vaias e objetos jogados contra o palco. No caso, apupos e vaias consagradoras de uma revolução estética e musical, que impactaria a história da cultura brasileira. No mesmo ano, a banda lançou o primeiro álbum e participou do disco Tropicália ou Panis et Circencis, o grande manifesto do Tropicalismo, considerado pela revista Rolling Stones Brasil o segundo melhor disco da história da música brasileira. Em 1970, soltaram A divina comédia ou ando meio desligado, sucesso de vendas que leva consigo os principais sucessos do grupo.

Clássicos

Após o arrefecimento do Tropicalismo e o rompimento com Arnaldo Baptista, em 1972, Rita foi expulsa da banda e emplacou seu nome emparelhado com o grupo Tutti-Frutti. Em 1975, lançaram o disco Fruto proibido, responsável por vários dos maiores clássicos da carreira da cantora, como Agora só falta você, Esse tal de roque enrow e Ovelha negra, que marcou o apelido que Rita fez jus até o fim da vida.

No ano seguinte, começou seu relacionamento com Roberto de Carvalho, parceiro nas composições e pai dos três filhos da cantora. Juntos, consolidaram o sucesso explosivo de Rita. Em 1979, chegou às lojas de disco do Brasil o primeiro álbum homônimo da artista, com os clássicos Mania de você e Doce vampiro, ambos em coautoria com o marido. No ano seguinte, a dupla ainda emplacou os hits Lança-perfume e Nem luxo nem lixo.

Nas décadas de 1990 e 2000, a cantora manteve um status de artista de primeira linha na música brasileira, lançando discos e liderando performances espetaculares. Em 1998, Rita lançou seu Acústico MTV, com participações de Paula Toller, Cássia Eller, Milton Nascimento e Titãs. Em 2000, foi a vez de 3001, com o hit Erva venenosa. Dois anos depois, tornou-se apresentadora de um programa de tevê e, no ano seguinte, lançou o disco Balacobaco, com o sucesso Amor e sexo. Em 2012, teve seu comeback com o álbum Reza, estrondoso sucesso comercial.

 

Rede Globo/Divulgacao - Rita Lee
Guilherme Samora/Globo Livros/Divulgação/ Universal Music/Divulgação - Rita Lee vestida de noiva
Divulgação/Globo - Rita Lee em 'Top model', telenovela da Rede Globo
Foto: Bob Wolfenson/Divulgação. - ita Lee pelo fotógrafo Bob Wolfenson (1997) | Foto: Bob Wolfenson/Divulgação.
Arquivo CB/D.A Press - Crédito: Arquivo CB/D.A Press. Brasil. Cantora Rita Lee durante show no Pelezão Caption

 

Rita Lee viveu uma relação conturbada com a sobriedade desde o período inicial da carreira. A geração de músicos a que pertencia foi marcada pelo mantra "sexo, drogas e rock'n roll", em que era explícito o abuso recorrente de substâncias como LSD, cocaína, álcool e cigarro. O câncer que a vitimou, pode ser relacionado ao tabagismo prolongado.

Em 1976, durante a gravidez, foi vítima de uma farsa pelos militares, aos quais se opôs ferozmente, quando foi presa e condenada sob alegado porte de maconha. Apesar do episódio calunioso, a cantora realmente foi vocal quanto ao vício às drogas. Em 1997, no disco Santa Rita de Sampa, a artista se intitula ironicamente como "protetora dos frascos e comprimidos". A provocação veio pouco depois do episódio em que caiu da varanda sob efeito de barbitúricos, quebrando a mandíbula e perdendo parte da audição.

Instabilidade

Desde o começo do século, entretanto, Rita Lee passou a optar pela privacidade, pela discrição e pela sobriedade. Em 2012, chegou a anunciar a aposentadoria dos palcos, motivada pela instabilidade de saúde. A inatividade foi interrompida brevemente, meses depois pela apresentação no Green Move Festival, em Brasília, na qual esbanjou as nádegas em uma performance lendária. Em 2014, escolheu parar de tingir os icônicos cabelos vermelhos e se mostrava dedicada a uma vida pacata, rodeada por jardins, hortas e bichinhos.

A cantora lutava contra o câncer de pulmão desde o diagnóstico no início de 2021, quando começou a sofrer de crises respiratórias. Em abril de 2022, após sessões de radioterapia e imunoterapia, o tumor entrou em remissão. Segundo o filho Beto Lee, em entrevista ao jornal O Globo, a artista sempre manteve a cabeça erguida e encarou tudo com seu bom humor habitual, chegando inclusive a nomear carinhosamente seu tumor como Jair, em referência ao ex-presidente.

*Estagiários sob a supervisão de José Carlos Vieira


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