Jornal Correio Braziliense

Música

Madrigal de Brasília celebra os 60 anos com recital na Escola de Música

Madrigal de Brasília completa 60 anos com recital de comemoração no qual canta missa de Rossini acompanhada de dois pianos e de um harmonium garimpado no interior da França

Há 60 anos, um professor e maestro pernambucano chegou a Brasília, vindo do Rio de Janeiro, para fazer parte do corpo docente da Fundação Educacional do Distrito Federal. Era Levino de Alcântara, que passou a ministrar aulas de música para alunos do Centro Educacional Elefante Branco, no Plano Piloto; e do Centro Educacional Ave Branca (Cemab), em Taguatinga.

Com estudantes das duas instituições de ensino, ele formou o Madrigal de Brasília, grupo vocal que, artisticamente, faz parte da história da cidade. Para comemorar 60 anos de existência, o conjunto se apresenta nesta quinta-feira (6/4), às 20h, no teatro que leva o nome do maestro, na Escola de Música de Brasília.

Na celebração da data, o coral interpretará a versão original para dois pianos e harmonium da Petite messe solenneelle, de Giochino Rossini, sob a regência do maestro Deyvinson Miranda. No espetáculo, o Madrigal tem a companhia dos pianistas Thales Silva, Marília Alexandre e Dib Franciss, que toca o harmonium, e conta com a participação especial de Isabel Quintela (soprano), Mônica Simões (contralto), André Vidal (tenor) e Guilherme Aquino (baixo).

Concebida para dois pianos e um harmonium, a obra foi escrita em 1863, cerca de três décadas depois de Rossini ter se aposentado da composição de óperas. A parte central da obra é o Prélude Religieux, com uma introdução feita pelo  piano à qual se segue uma complicada Fugue, para harmonium solo. A obra exige intensa participação do coro e dos solistas do Madrigal. 

A Escola de Música, que é considerada uma das mais importantes instituições de ensino de música da América Latina, ocupa uma área de 5,5 mil metros quadrados, com 83 salas e dois teatros — um deles, o Levino de Alcântara, com, 480 lugares. Atualmente, é dirigida pelo professor Davson de Souza, que fala ao Correio sobre a história e as perspectivas do Madrigal de Brasília.

Entrevista // Davson de Souza


Levino de Alcântara dá nome ao teatro da Escola de Música, mas a memória dele é cultuada na instituição?

Sim. É sempre contada a história da Escola de Música de Brasília, que é também explicitada nos documentos da EMB. Mostramos sempre que a EMB foi construída a partir de um ideal e muita articulação do maestro Levino de Alcântara e, logo depois, o Madrigal de Brasília

Alunos da Escola de Música da nova geração sabem da importância do maestro para o Madrigal de Brasília?

Sim, principalmente entre os estudantes de canto.

Na sua avaliação, quais foram os fatos mais relevantes na história do Madrigal em seis décadas de existência?

Além de peça importantíssima na construção de EMB, isto literalmente, tanto na parte física (cantando em troca do terreno e de materiais de construção). Mas, principalmente, a construção pedagógica, na qual os professores/cantores do Madrigal de Brasília, além do trabalho deles cantando/ensaiando no grupo, direcionam/coordenam/ensaiam o trabalho de todos os corais da EMB, desde a musicalização infantojuvenil (8 anos a 14 anos de idade), passando pelo curso "básico" (15 anos de idade em diante) e o curso técnico (coro lírico — 15 anos em diante) e em alguns casos também lecionam conteúdos curriculares teóricos ou canto ou instrumento musical. Também com as diversas apresentações públicas do Madrigal de Brasília, atrai-se ainda mais público (para outras apresentações) e potenciais estudantes para a Escola de Música de Brasília.

Além do concerto, que ocorre nesta quinta (6/4), o que mais está previsto para celebrar os 60 anos?

Haverá apresentações públicas e gratuitas do Madrigal de Brasília em todos os meses deste ano. Na Escola de Música de Brasília, em locais públicos (Museu Nacional, Concha Acústica, Museu de Arte de Brasília e em determinadas escolas públicas e diversas regiões administrativas de Brasília. No final do ano em dezembro, na primeira semana, será feito uma obra grandiosa, do repertório e circuito internacional, tradicionalmente feita no mundo inteiro nesta época do ano. Para toda a temporada serão convidados ex-maestros e cantores do Madrigal de Brasília, para serem homenageados e também para atuarem junto ao Madrigal novamente.

Foi sua a escolha de Petite messe solenelle, de Giochino Rossini para execução
no concerto?

Não. Foi uma escolha do grupo de cantores e atual maestro Sim. Mesmo os de outras áreas estão cientes desta comemoração e alguns inclusive empenhados em ajudar e dar suporte. E em ir apreciar as apresentações.

Os alunos da Escola de Música estão moblizados para esta celebração?

Sim. Mesmo os de outras áreas estão cientes dessa comemoração e alguns, inclusive, estão empenhados em ajudar e dar suporte, além de apreciar as apresentações.

 CONCERTO COMEMORATIVO
O madrigal de Brasília interpreta Petite Messe Solennelle, de Giochino Rossini, sob a regência do maestro Deyvinson Miranda, nesta quinta-feira (6/4), às 20h, no Teatro Levino de Alcântara da Escola de Música de Brasília (602 Sul). Entrada franca. Classificação indicativa livre.

 

A saga do harmonium

Foram anos procurando um harmonium Mustel até que o pianista Dib Franciss, professor da Escola de Música de Brasília (EMB), encontrou um exemplar em uma cidadezinha francesa de 200 habitantes da comuna de Mortagne-au-perche, na Normandia. O músico não sossegou enquanto não conseguiu comprar o instrumento, que já havia sido prometido para um museu, mandar restaurá-lo na Holanda e embarcá-lo para o Brasil.

É nesse harmonium Mustel, considerado o "Stradivarius" dos harmoniuns, que Franciss executa hoje a Petite messe solennelle, de Gioachino Rossini, durante o recital de comemoração dos 60 anos do Madrigal de Brasília. "Existe uma verdadeira caça pelos colecionadores na Europa, pois o Victor Mustel só fabricava 12 instrumentos por ano.

O meu é de 1886", conta o músico. "A descoberta foi tão importante que o próprio Louis Huivenaar, considerado melhor restaurador do mundo para esse instrumento, saiu da Holanda e foi até essa cidadezinha da França pessoalmente para buscá-lo. Demorei dois anos numa fila no ateliê dele até o Mustel ser totalmente restaurado, pois é um trabalho minucioso e 100% artesanal. Se precisar trocar alguma coisa, é preciso fabricar."

Depois de conseguir restaurar o instrumento, Franciss enfrentou uma saga para trazê-lo ao Brasil. Feito com jacarandá da Bahia e teclas de marfim e ébano, precisou ser submetido a uma vistoria internacional, já que o Brasil é signatário de um acordo que impede a importação e exportação de jacarandá, marfim ou ébano. A permissão só foi concedida porque o instrumento tem mais de 100 anos.

O harmonium é um instrumento com teclas e sonoridade semelhante ao órgão de tubos: um teclado que usa ar pressurizado de um fole bombeado por dois pedais para produzir som de palhetas livres. O método é o mesmo do acordeon e da gaita. "E possui as qualidades tonais de um órgão de tubos e o controle expressivo de um instrumento de corda", explica Franciss.