METAL PESADO

Andreas Kisser diz que Sepultura se reinventa "todo dia" e fala em turnê de 40 anos

Convidado para show no Gama, em entrevista ao Correio, Andreas Kisser, guitarrista da banda Sepultura, fala sobre a amizade com Canisso, os principais momentos da carreira e o momento do grupo

Franco C. Dantas*
postado em 23/04/2023 06:00 / atualizado em 23/04/2023 15:59
 Andreas Kisser tornou-se o rosto do Sepultura após a saída de Max Cavalera -  (crédito: MAURO PIMENTEL)
Andreas Kisser tornou-se o rosto do Sepultura após a saída de Max Cavalera - (crédito: MAURO PIMENTEL)

Em memória à Canisso e aos ídolos do rock candango, a banda Sepultura foi convidada para uma passagem pela cidade, ao lado dos brasilienses Raimundos, Galinha Preta e As Verdades de Anabela. A iniciativa, Sesc+Rock, faz parte de uma série de eventos promovidos pela organização desde o ano passado, que já trouxe ao DF Emicida e Xande de Pilares.

Sob a liderança inicial de Max Cavalera, o Sepultura inovou desde o princípio, com o EP Bestial devastation e o LP de estreia Morbid visions, vanguarda no death metal. O segundo disco, Schizophrenia, voltado ao thrash metal, já conquistou olhares no underground internacional, possibilitando contratos com grandes gravadoras e selos espalhados pelo globo. Foi também o primeiro trabalho com o quarteto clássico, que duraria até 1996, imortalizado por Max no vocal e na guitarra, Iggor Cavalera na bateria, Andreas Kisser, na guitarra, e Paulo Xisto, no baixo.

Após outros três álbuns de estrondoso sucesso no metal, é inegável que o auge da banda foi cristalizado no Roots, de 1996. As músicas, que apelam para ritmos nacionais, contam com participação de artistas como Carlinhos Brown, além de batucadas de influência africana e de uma composição em parceria com indígenas xavante. O disco é um dos mais influentes da banda, tido como responsável pelo grande estouro do nu metal no final daquela década.

  • 19/04/2023 Crédito:Marcos Hermes/Divulgação. Brasil. Brasilia - DF - Andreas Kisser tornou-se o rosto do Sepultura após a saída de Max Cavalera Marcos Hermes/Divulgação
  • Sepultura foi atração principal do Sesc Rock no Gama Marcos Hermes/Divulgação
  • Sepultura: Derrick Green, Paulo Xisto, Andreas Kisser e Eloy Casagrande Marcos Hermes/Divulgação

Em meio ao sucesso meteórico do disco, por desentendimentos profissionais e pessoais, o líder Max se despediu do grupo rancorosamente. Quem assumiu os vocais foi o americano Derrick Green, que faz questão de bradar com sotaque "Sepultura do Brasil!",  sempre que chega a vez de honrar a música Roots bloody roots.

Atualmente, o grupo segue engajado no último lançamento, Quadra, de 2020, que agradou os fãs conquistados por um Sepultura certamente renovado em relação ao que atraiu os headbangers no passado. E, nesta entrevista ao Correio, Andreas Kisser fala sobre a amizade com Canisso, o rock de Brasília, os principais momentos da carreira e o momento do Sepultura. Confira abaixo.

Qual o histórico do Sepultura com Brasília?

O show de 1989, da turnê do Beneath the remains, foi bem especial. Mas a gente foi antes também, fizemos Schizophrenia, inclusive. Fizemos um em 2002, quando o Brasil foi pentacampeão, que também foi muito f... Eu acho que Brasília tem uma galera roqueira que fez a diferença no cenário do rock brasileiro, muito através do punk. Eu acho que isso também, de alguma forma, influenciou o Sepultura, apesar de a gente não ouvir muito esse tipo de coisa naquela época.

Como era sua relação com o Canisso?

A gente se conheceu na estrada, através de amigos, encontros da MTV e shows que a gente fez com os Raimundos. A gente já jogou muito futebol junto também, na década de 1990. Temos uma história muito especial, quando a gente usou a sala de ensaio na casa dele para fazer o teste com o Derrick. Foi a primeira vez que a gente tocou com ele, passamos algumas semanas lá, fazendo os primeiros ensaios dessa reformulação. Ele e a família foram muito solícitos de liberar o estúdio, deixar a gente à vontade.

Com a entrada de Derrick, você sentiu muita diferença na banda?

Total. É 100% diferente. Não teria nem como ser igual. Se o Derrick quisesse copiar o Max, ou na forma vocal ou no visual, já seria diferente. Se não tivesse diferença, seria uma coisa morta, não teria alma. O Derrick tem um passado totalmente distinto do Max, influências de banda, como ele vê o mundo, como ele escreve. Mesmo bandas que mantêm a mesma formação mudam, mas tem gente que é cega para si próprio e fica no mesmo lugar há anos. Eu sempre prezei pelo presente, por ter elementos novos, não ficar só no conforto.

Como você olha para os discos passados do Sepultura?

Foram todos muito importantes no processo. Sem Schizophrenia, não teria Beneath the remains, não teria Arise… Não dá para desmantelar. Sem Roots, a saída do Max e todo aquele processo, nada seria do jeito que é. Talvez o que eu considere o disco mais importante da nossa história seja o Against, que manteve a banda junto.

Houve influência do manguebeat no Roots?

Foi uma influência que aconteceu dos dois lados. O Chico Science foi muito influenciado pelo Sepultura, principalmente pelo Chaos AD. Eles tocavam Refuse/Resist, faziam umas referências à Territory e a gente fazia o mesmo na turnê do Roots, tocava umas coisas do Chico de introdução antes de algumas músicas. A gente chegou a se conhecer, o convidamos para tocar Kaiowas com a gente, ao lado de João Barone, Charles Gavin e Carlinhos Brown, que trabalhou com a gente depois.

Como foi o processo para fechar o Quadra?

Hoje em dia, o mais importante é ter um foco, um objetivo,  sempre faço uma pesquisa sobre o que a gente vai falar. Então tá: "número 4, quadrivium, numerologia, quadra, dividir o álbum em quartos". Esse foi o primeiro processo. A gente sabia que estava escrevendo a quarta música do lado B antes de pensar no primeiro riff.

Qual seu motor artístico?

A própria vida. Estar vivo. Quer maior motivação que essa? É o privilégio de me levantar todo dia, de criar um dia novo. A gente cria um Sepultura novo todo dia. A gente quer ter espaço para crescer, e não achar que sabe de tudo. Tem tudo isso que a gente está vivendo de inclusão social, de termos que a gente usava anos atrás e agora não são mais legais, toda essa reeducação. Pessoas que não evoluem estão lá paradas, pensando que tudo tinha que ser o mesmo. É patético. A morte vai estar aí, então vamos fazer o melhor que a gente puder hoje.

Já pensam em mais um disco do Sepultura?

Não. Ideias de músicas sempre existem, mas a gente ainda está muito focado no Quadra. Ano que vem a gente quer celebrar 40 anos de Sepultura, com uma turnê especial e uma exposição das coisas que eu e o Paulo guardamos com o tempo… Mas agora, talvez fazer um disco ao vivo seja oportuno. A banda está num momento muito bom, talvez seja hora de registrar, mas não tem nenhum projeto claro a respeito disso.

*Estagiário sob a supervisão de Severino Francisco

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