Nascida na Serra do Salitre (MG) há 77 anos, Raimunda Aparecida Fernandes foi para Patos de Minas com 12 anos. Se considera uma patureba praticamente nata, orgulhosa desde que acrescentou à lista de mais de 60 folias registradas na prefeitura da cidade mineira a Folia Feminina Rainha da Paz. No total, 12 mulheres com idades variadas integram o grupo fundado em 2006. De acordo com a tradição, as campanhas das folias são abertas em 25 de dezembro e seguem até o Dia de Reis, celebrado em 6 de janeiro.
Durante esse período, Raimunda e suas companheiras cumprem o ritual da Folia de Reis, sempre aos domingos, em uma reza de terço, um almoço ou um café da tarde. E para quem pergunta "por que criar uma folia apenas de mulheres", Raimunda é direta: "Na folia de homens, eles gostam muito da bebida, mas já melhorou muito, e a folia feminina não tem isso. Aí, a pessoa que não gosta de bebida prefere folia feminina. Eles dizem que mulher não sabe cantar folia. Mas a folia feminina é muito requisitada, porque o povo nunca viu".
É um pouco dessa história que a mestre vem contar aos brasilienses durante a 21ª edição do Encontro Nacional de Folia de Reis, que recebe 20 grupos de todo o país, no Pavilhão do Parque da Cidade, a partir de hoje. "Tem cinco anos que vou a Brasília, é uma maravilha esse encontro, ajuda a divulgar e, a cada encontro que a gente participa, é um aprendizado que a gente tem", garante Raimunda.
A capital do país foi construída sob a égide do modernismo. Virou um símbolo da modernidade, do rock, da utopia e do futuro naquelas décadas iniciais, mas, antes, as folias circulavam pelo Planalto Central como uma das mais enraizadas tradições da região. É a história dessas manifestações que Volmi Batista, um dos idealizadores e organizadores do encontro, quer reavivar a cada edição do evento. "Até os anos 1990, quando a gente teve a ideia de criar esse projeto, tinha um rótulo de Brasília capital do rock, bastante identificada com o modernismo, e isso não condizia muito com uma parte da população. Brasília é uma arca de Noé cultural", diz Batista.
Tudo começou com um programa na Rádio Cultura dedicado à música caipira. Batista recebia muitas queixas dos ouvintes sobre a falta de um local para algumas práticas da cultura popular. "Então tivemos a ideia de criar esse encontro, com alguns grupos que já existiam em cidades como Planaltina e Gama", conta. O primeiro ocorreu em janeiro de 2001, com oito grupos, e, desde então, não parou mais. Nas edições seguintes, o número foi crescendo e chegou à participação de 50 grupos. "Dali, a gente foi obrigado a limitar, porque funcionamos como anfitriões. Representamos o dono da casa que vai receber as folias, a tradição do giro. E o dono da casa tem que ter toda a infraestrutura necessária, com alimentação, pouso", explica Batista. Este ano, entre as 20 folias que visitam o DF a partir de hoje, há pelo menos uma representante de cada região do Brasil.
Estar em Brasília é muito importante para a mestre Francinete Braga. Nascida e criada em Pedreiras, no Maranhão, ela é filha e neta de foliões. No entanto, foi apenas em 2017 que passou a estar à frente de um grupo. A Folia de Reis de Pedreiras foi criada a pedido de um grupo de idosos que tinha saudade da tradição. Na época, não havia folia no município há mais de 40 anos. Francinete conta que, na região, a folia tem uma característica bastante artística e cultural, com especial atenção para as músicas e para as indumentárias. Em Brasília, pela primeira vez, o grupo vai mostrar uma composição própria. "Inicialmente usávamos músicas de outras pessoas, mas este ano também iremos usar composições nossas pela primeira vez até por conta da viagem. A gente mescla músicas com poesias da nossa autoria e de poetas do município de Pedreiras", conta Francinete.
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Oportunidade
Para ela, o encontro em Brasília é um reconhecimento. "Faz parte da valorização do trabalho que realizamos no interior do Maranhão. Algumas pessoas que estão aqui não valorizam como deveriam, e quando há essa oportunidade de irmos para outras localidades mostrar nossa arte, isso faz com que aquelas pessoas comecem a olhar melhor. Isso é de suma importância para esse olhar mais atento dentro do próprio município. E para nós é uma realização. Porque a cultura para nós é a corda do nosso coração. A gente vive de fazer cultura. É muito importante. Tem gente que acha que a educação vem primeiro. Para nós, primeiro vem a cultura e depois vem a educação, e as duas juntas revolucionam", garante.
Este ano, o encontro tem uma novidade. O seminário As Folias de Reis no Brasil de hoje vai discutir a situação atual e o futuro desta tradição no Brasil contemporâneo. Ao final, Volmi Batista adianta que será produzido um documento a ser protocolado no Ministério da Cultura como um registro do panorama da tradição no país. "A gente vive um drama no Brasil", lamenta, quando lembra do patrocínio e dos recursos destinados à cultura popular. "Quando se trata de cultura popular contemporânea, as coisas são mais fáceis, as empresas se interessam em colocar as marcas. Mas se tratando de cultura popular tradicional, fica mais difícil as empresas entenderem a importância disso. E no último governo nada funcionou, os órgãos de cultura ficaram totalmente parados. Esse encontro promete fazer o levantamento, principalmente, da questão do fomento para a cultura popular tradicional."
A programação tem início hoje com a apresentação de folias e segue durante o fim de semana com shows, oficinas, exposições e praça de alimentação na qual os visitantes poderão saborear as comidas tradicionais da festa.
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