ARTES PLÁSTICAS

Artista brasiliense cria escultura de aço para homenagear vítimas do amianto

Artista plástico brasiliense Wagner Hermusche cria escultura de aço com seis metros de altura em Osasco para reverenciar as vítimas do minério e para alertar sobre as ameaças tóxicas que ainda pairam

Wagner Hermusche é um dos artistas plásticos que captou com maior expressividade a alma brasiliana em uma série de gravuras na década de 1980. Mas, a partir da primeira década do século, em sintonia com os acontecimentos, a arte de Hermusche saltou do lírico ao dramático. Brasília passou a ser palco de uma verdadeira guerra das corporações e dos grupos políticos. Agora, enfrentou um novo desafio: ele foi escolhido para construir um memorial das vítimas do amianto, que acaba de ser instalado em uma praça de Osasco, no local onde funcionava a fábrica da Eternit, hoje desativada.

Em 2017, o STF proibiu a fabricação e a venda de produtos da construção civil com amianto, pois ele é cancerígeno. Nesta tragédia do amianto, os operários se entregavam inocentemente ao trabalho cotidiano, que acreditavam estar garantindo o seu sustento e de suas famílias e, por conseguinte, a vida. Por isso, Hermusche concebeu o memorial com a forma de uma árvore-pulmão, uma escultura de ação de mais de seis metros de altura, com 1.600 quilos de aço, uma árvore da vida: "O tema do envenenamento dos operários pelo amianto é extremamente grave. Mas eu não quis fazer algo estático ou mórbido. Fiz uma árvore da vida. É uma fibra de aço gigantesca. O tronco simula a molécula do amianto, a copa e o galho são anéis. É uma metáfora do cosmos".

A Secretaria do Meio Ambiente e a Secretaria do Trabalho de Osasco sanearam a área da fábrica desativada, a transformaram em uma praça de 2 mil metros e instalaram a escultura. Ao lado, em uma placa de aço, foram inscritos os nomes de mais de 600 vítimas do amianto: "O trabalho é como uma árvore, que acolhe em sua sombra e alimenta com seus frutos", comenta Hermusche. "É o símbolo que representa o sustentáculo da vida. Na verdade, é uma memória dos mortos e uma celebração da vida deles. Os parentes das vítimas ficaram muito comovidos na inauguração do monumento."

A escultura foi construída, durante 50 dias, em um galpão de Taguatinga. Depois, seguiu para a praça em Osasco. Hermusche teve a colaboração de amigos arquitetos. Virgínia Brochado transformou o desenho em projeto arquitetônico, no formato 3D, com acabamento técnico: "A escultura é uma peça toda de aço, cortada a laser, precisou de tecnologia e de bons profissionais de soldagem. Tem uma parte conjugada, com ferrugem provocada no aço e outra parte pintada. Exigiu um projeto técnico, a escultura tem de ficar sólida para não oferecer perigo para as pessoas. Tem a forma de uma árvore-pulmão".

Ameaças tóxicas

Fernanda Giannasi trabalhou no Ministério do Trabalho durante mais de 30 anos, exercendo a função de auditora fiscal. No entanto, sob o impacto do envenenamento das vítimas do amianto, ela decidiu criar, em 1995, a Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto (Abrea), para mobilizar as famílias dos trabalhadores, conhecer os efeitos do minério e demandar a indenização pelos danos. "Me deparei com os doentes que não tinham qualquer representação. O memorial criado pelo Hermusche tem uma função educativa, pois, apesar de as fábricas terem sido desativadas, elas deixaram um passivo de doenças e de problemas ambientais espalhados pela cidade inteira."

Giannasi enfatiza a importância de que a cidade reconheça a tragédia ambiental. O memorial resgata, principalmente, as famílias dos que morreram envenenados. Ajuda a fazer com que as pessoas mortas sejam mais do que estatísticas. "As empresas já sabiam que o amianto causava danos à saúde. E que sirva de exemplo para outras atividades que utilizam matérias primas que são tóxicas e cancerígenas."

Giannasi destaca as duas maiores ameaças dos efeitos deletérios do amianto: a mineração em Minaçu, na divisa de Goiás com o Tocantins, e o porta-aviões São Paulo. Apesar de a atividade de extração do amianto ter sido proibida pelo STF em 2017, a mineração continua a ser produzida em Minaçu, graças ao beneplácito do governador de Goiás, Ronaldo Caiado, que aprovou uma lei para permitir a exploração."O ministro Alexandre de Moraes está com uma ação que pede a declaração de inconstitucionalidade da mineração do amianto, algo que foi decidido pelo próprio STF,"comenta Giannasi. "O porta-aviões São Paulo foi vendido para um empresário na Turquia, houve uma mobilização por lá, e o navio teve de voltar para o Brasil. É uma situação dramática, se ocorrer qualquer problema com o porta-aviões e ele afundar na costa brasileira, o amianto vai se espalhar e vai provocar um grave problema ambiental. É um exemplo de irresponsabilidade com a saúde pública. O memorial é um alerta para o problema das ameaças do amianto."

 

Saiba Mais


Fotos: Wagner Hermusche/Divulgação - A escultura em construção em um galpão de Taguatinga
Wagner Hermusche/Divulgação - O memorial para homenagear as vitimas do Amianto está instalado em uma praça de Osasco
Wagner Hermusche/Divulgação - Esqueleto da escultura em galpão de Taguatinga
Wagner Hermusche/Divulgação - Vista do Memorial para as vítimas do amianto, à noite, em Osasco