ENTREVISTA

Miguel Falabella e Danielle Winits chegam a Brasília com a peça 'A mentira'

Sempre movido por diversos níveis da criação, Miguel Falabella experimenta personagem com vários ângulos para um dilema, na peça 'A mentira'; confira

Ricardo Daehn
postado em 15/10/2022 07:00
 (crédito:  Caio Gallucci/Divulgação)
(crédito: Caio Gallucci/Divulgação)

Em certa medida, observados os propósitos e o estilo de vida do ator, produtor e autor Miguel Falabella, que recém-completou 66 anos, observa-se um cidadão na contramão da mediocridade. Falabella diz exercer a comédia da tolerância, com respeito às individualidades; cultiva poucos vícios — até para otimizar a energia canalizada para o teatro — e, ainda que não obrigue ninguém a nada, ele, no fundo, sabe como encorajar muitos a serem felizes. Habitué nas bibliotecas, numa herança direta da genética dos pais intelectuais, ele reforça o desacordo com a atual pouca importância dada a livros e conhecimentos, elementos vitais ao ex-estudante de letras na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que já teve seis obras publicadas.

Mutifacetado e de alma leve, o artista assume que ama "relaxar" até mesmo no trabalho, além de ter gosto por "brincar de tudo", na esfera polivalente dos desafios que assume. O fingir e o mascarar, que tanto pulsam na vida de muitos brasileiros, país afora, cabem pontualmente na trajetória de ficção alimentada por Falabella, que lidera a montagem de A mentira, atração deste fim de semana no Centro de Convenções Ulysses Guimarães. Habilidoso na lida de obras que tratem de núcleos familiares, basta citar a peça A partilha (um estrondoso sucesso) e o televisivo Pé na cova, Miguel Falabella, com a nova peça, teve nas mãos a tarefa de trazer versão para dramaturgia de Florian Zeller.

No mundo do cinema, o francês Zeller é lembrado pela tom agridoce do longa A viagem de meu pai (2015) e pelo impactante texto de Meu pai, que favoreceu o Oscar dado ao veterano Anthony Hopkins. Diretor de A mentira, o ator brasileiro ainda interpreta Paulo que, ao lado da esposa, Alice (Danielle Winits), ajuda na decisão de entregar (ou não) as traições experimentadas por um amigo infiel aos votos de casamento. Um dado curioso na trajetória da peça, idealizada desde 2018, está justamente na modificação das relações, depois dos confinamentos impostos pela pandemia. O quadro da saúde coletiva, aliás, atravancou a plena circulação da montagem idealizada à época em que o ex-carnavalesco da Império da Tijuca se tornou enredo da escola, sob o tema Um coração urbano: Miguel, o arcanjo das artes, saúda o povo e pede passagem.

No terreno do audiovisual, 2022 tem se revelado produtivo para o também cineasta Falabella: seu longa-metragem Veneza (destaque no Star), estrelado por Carmen Maura, alcançou nove indicações no 21º Grande Prêmio do Cinema Brasileiro (com direito à vitória da melhor atriz Dira Paes) e, para a plataforma Disney , ele emplacou dobradinha de projetos. Com a codiretora Cininha de Paula, Falabella assinou dez episódios de O coro: sucesso, aqui vou eu, que integra músicas de Pixinguinha, Rita Lee e Chico Buarque aos anseios de aspirantes à vaga no teatro musical paulistano. Muitas vezes à frente de um plano mais idealizado, e descolado da realidade, Falabella, cria do Teatro Tablado, progressista, desde a estreia profissional com texto de Frank Wedekind (O despertar da primavera), trará ainda para a Disney uma versão de seu celebrado espetáculo musical O som e a sílaba. 

Entrevista // Miguel Falabella

A saída da pandemia realçou os impulsos das escapadelas numa relação?

Eu confesso para você que não sei como anda a vida dos outros (risos), mas, sem dúvida, a pandemia trouxe novas formas de se relacionar.

Houve espaço para apimentar e abrasileirar o texto na montagem de A mentira?

Sempre há espaço, para colocarmos nosso jeitinho brasileiro de ser. Quem me conhece sabe que eu amo improvisar em cena, a plateia espera isso.

Em que medida dramaturgos internacionais alcançam nossa realidade? Há valores sociais que sejam homogêneos?

O ser humano, como sociedade, parte de um mesmo princípio. As nossas inquietações e dilemas são os mesmos, partem da nossa existência na terra. Eu posso hoje contar uma história brasileira e alguém da Grécia, por exemplo, se identificar muito facilmente.

Há paralelos possíveis de relacionar a lealdade masculina de uma amizade e, nisso atrelar um comportamento corporativista de acobertamento das possíveis traições conjugais?

Existe o tabu sobre a lealdade masculina, veja bem, não estou falando que ela não existe. Eu mesmo sou leal com os meus amigos, mas também não há distinção de gênero, a partir do momento que estamos aqui respirando neste mundo, estamos vivendo e buscando os mesmos objetivos. A peça A mentira mostra bem esse lado igualitário, sobre lealdade e traição.

A atriz Danielle Winits é mais do que uma cúmplice de crimes? Chega a ser uma quase esposa (risos)? Que relação é essa?

A Dani é amor de uma vida inteira. Minha amiga, irmã e porque não esposa também? (risos), por que a vida no teatro é um casamento. Trabalhamos muito juntos e é sempre uma alegria encontrá-la em cena.

O que motiva o estado de graça suprema para Miguel Falabella?

A alegria — trabalhe com o que você ama, que você nunca vai precisar trabalhar.

Falando em mentira, quais os aspectos mais nefastos das fake news que contaminam o país?

A falta de informação. Antigamente tínhamos que pesquisar, ir atrás de respostas e quando algo era publicado, tinha-se um fundamento, algum especialista escreveu e publicou. Hoje com as redes sociais, o ser humano sem qualquer base de fundamento no assunto, posta o que quer e cria uma realidade completamente destorcida, que muitas vezes, você para e pensa... De onde esse ser tirou essa informação? As fake news têm dividido cada vez mais a sociedade e geram sérios problemas à humanidade.

Serviço

A mentira

Auditório Planalto (Centro de Convenções Ulysses Guimarães). Hoje, às 21h, e amanhã, às 18h. Vendas em www.sympla.com.br Setor VIP, a R$ 160 (meia), R$ 140 (no setor espacial, meia) e R$ 120 (PNE). Todos valores são referentes à meia-entrada que é estendida para doadores de um quilo de alimento. Não recomendado para menores de 10 anos.

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  • A mentira
    A mentira Foto: Caio Gallucci/Divulgação
  •  Peça A Mentira, 
com Miguel Falabella 
e Danielle Winits.
    Peça A Mentira, com Miguel Falabella e Danielle Winits. Foto: Caio Gallucci/Divulgação
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