Quando o diretor John Carpenter, na realização do terceiro filme da vida — filmado em 17 dias —, afirmou o talento ao descrever a perseguição de um maníaco frente a uma indefesa babá, não fazia ideia do monstro cinematográfico que havia criado. Era 1978, às vésperas da Noite das Bruxas, quando Halloween estreou — trazendo declaradas referências ao terror giallo dos italianos Mário Bava e Dario Argento, e ainda assumindo parte do mundo de Alfred Hitchcock, a partir de nomes de personagens e mesmo na homenagem suprema de colocar Jamie Lee Curtis — filha na vida real de Janet Leigh (estrela de Psicose) — na pele da inicialmente ingênua Laurie Strode.
Em livros de cinema, Halloween já foi declarado o "filme de terror mais importante dos últimos 40 anos". Não é pouco, visto que, em 1978, George A. Romero já andava às voltas com seus zombies; o bebê de Rosemary já havia nascido; Carrie já era estranha e a menina de O exorcista (1973) havia girado o pescoço.
Em Halloween ends, um dos protagonistas (que, por uma noite, vira tutor de um garoto) trabalha numa espécie de ferro-velho, que, amontoado de carros, traz a deixa de um ambiente ligado ao clássico filme O massacre da serra elétrica (1974). Saem de cena, entretanto, as luvas e a máscara de couro daquele filme de Tobe Hooper, e pesa a violência orquestrada por outro mascarado: o personagem desumano Michael Myers, com o rosto disfarçado pela máscara nos moldes da cara do astro William Shatner (da série Jornada nas estrelas). Reavivado em longa de 2018, o personagem do septuagenário criador John Carpenter tem o destino selado pelas mãos do diretor David Gordon Green, numa derradeira noitada.
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No filme original, emulado em fitas como Pânico (1996), passados 15 anos desde um crime ocorrido em 1963, Myers amarga os efeitos de ter matado a própria irmã. Em Halloween ends, a veterana dos sustos Laurie vê os "olhos de Mike Myers" em Corey (Rohan Campbell), jovem perturbado que atrai a atenção de Allyson (Andi Matichak), a neta de Laurie. Proteção é um senso presente na guerreira avó que, na trama do novo filme, redige suas tortuosas memórias para um livro. Na rota de desequilíbrio, ela encontra muito uísque, abóboras decoradas para o Dia das Bruxas e um impactante suicídio.
As acomodações em manicômios — que nunca contiveram a ação de Myers, inúmeras vezes alvo da preocupação do psiquiatra Loomis (Donald Pleasence, ator morto em 1995) — não são referendadas no capítulo final de Halloween. Sequências de slashing, as sabidas e sistemáticas mutilações, entretanto, correm soltas. "Sem música, a vida seria um erro", reforça um dos personagens do longa, ao que a trilha sonora de Halloween ends responde, alinhando uma criação sonora de John e Cody Carpenter junto com Daniel Davies. Numa das cenas mais emblemáticas, um disco de vinil roda, interrompido pelo horror gráfico de uma língua (de uma das vítimas) disposta no bolachão.
Numa faixa de acontecimentos bem mais escondidos, o jovem Corey — que toma para si humilhações e provocações de toda a abalada cidade de Haddonfield — se desespera, ao ser "decifrado" como psicopata pela astuta Laurie Strode. Com pressões em uma família disfuncional e, encampando um interminável rastro de sangue, Corey, com altas doses de culpa, se despersonaliza, e potencializa o desespero e a paranoia de toda uma comunidade. Tido como pedófilo, Corey, sem querer, atiça a ira de toda uma "gente triste, do mal". Nada que lembre a misericórdia e o entrosamento do vilanesco Michael Myers com as crianças, em especial com a sobrinha dele Jamie (Danielle Harris), que, na saga espalhada pelos anos de 1980, agonizava a cada ataque do tirânico tio.
Com ares decididos, frente ao eterno retorno da maldição de Myers, Laurie, no novo filme, vai adentrar em uma procissão que novamente reunirá muitos moradores da outrora calma cidade de Illinois. A perspectiva de colocar o público, lado a lado, com a subjetiva visão do criminoso, segue criando a tensão da celebrada fita.
Para além da intimidade com o assassino, o pendor gore (que explicita a violência) e a mexida em traumas do passado retornam em Halloween ends, que bem promove fórmulas cristalizadas desde o império do medo trazido por filmes ritualísticos como O homem de palha (1973) e A profecia (1976), e que desembocou em fenômenos como a franquia nascida em Sexta-feira 13 (1980). De modo coerente, de quebra, Laurie — depois de tentar "fugir, perseguir, conter e até perdoar" Myers — encontra seu fim, impresso com muita dignidade.
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