Grande sucesso de audiência, o remake da novela Pantanal traz na trilha sonora, basicamente, música sertaneja de raiz. Em meio à trama do folhetim, aqui, ali, ouve-se em rodas de viola, modões das antigas compostas por Tonico & Tinoco, Sérgio Reis, Renato Teixeira e Roberta Miranda, com a participação dos atores Almir Sáter (Eugênio), Gabriel Sater (Trindade) e Guito (Tibério), — que são, originalmente, instrumentistas.
O reflexo desse programa televisivo tem contribuído para que ocorra uma popularização maior da viola caipira, que é mais ouvida em estados como São Paulo, Minas Gerais e Goiás, mas também no Distrito Federal. Aqui, inclusive, é uma das disciplinas do currículo da Escola Brasileira de Choro Raphael Rabello; e dá nome a um clube que funciona na Candangolândia. São instituições que ajudam a propagar na capital federal a cultura interiorana do país.
Professor de viola caipira da Escola de Choro, Vitor Mesquita (filho do violeiro Marcos Mesquita) conta que no retorno das aulas, após a pandemia, suas aulas eram assistidas por apenas dois alunos e, posteriormente, com o advento da novela, houve a matrícula de mais oito. "Nas aulas a viola é utilizada para o ensino do choro e, também, é claro, da chamada música caipira; e com isso tirar do instrumento o som com a pegada do violeiro de raiz."
Mesquita traz também um outro dado importante. "Há três anos meu pai e eu criamos um canal no YouTube e Instagram chamado Aprendendo viola caipira, especializado no ensino do instrumento. Depois que Pantanal passou a fazer parte da programação da TV Globo, o acesso ao canal aumentou 300%", ressalta.
Cultura regional
Cantor, violeiro e pesquisador e produtor cultural, Volmi Batista, mineiro do Coromandel, radicado em Brasília desde 1971, é um dos expoentes desse gênero musical no DF. A paixão pela viola o levou a criar o Clube do Violeiro Caipira e o Encontro de Violeiros e Violeiras de Brasília — que está na 20ª edição — e a apresentar o programa Violas e violeiros, na rádio Cultura FM. Para ele, a primeira versão da novela Pantanal, em 1990, evidenciou de forma mais direcionada a importância da música e da viola caipira para a cultura regional brasileira.
"A exibição da novela, naquela época, contribuiu para a popularização e difusão do instrumento e da música de raiz, o que representou um marco, afirma Batista. Mas, ele faz uma ressalva: "Na versão atual, ainda que seja um espaço importante para a cultura de raiz, percebo que o enfoque da trilha sonora é mais amplo, destinado não apenas à música caipira, mas, também, à música popular brasileira como um todo".
Um outro mineiro, igualmente morador na cidade, há bastante tempo, Roberto Correa é uma das referências da viola caipira. Autor do manual A arte de pontear viola, ele lançou vários discos que trazem composições desse gênero musical, inclusive Concerto para vaca e boi, disponibilizado recentemente nas plataformas digitais.
De acordo com Correa, o avivamento da viola caipira teve início na década de 1960. De lá para cá, alguns eventos contribuíram de forma significativa para a difusão do instrumento. "Um deles foi a novela Pantanal, na década de 1990, que projetou a viola caipira e o cantor e compositor Almir Sater."
Para o mestre violeiro, é interessante observar que, entre as duas edições da novela, o cenário da viola no Brasil se expandiu, "com o desenvolvimento de trabalhos consistentes, sua inserção nas escolas, na academia e a criação de orquestras de viola espalhadas pelo país". Com entusiasmo, ressalta: "É uma satisfação para nós da cultura interiorana, mais uma vez, ver a novela Pantanal contribuindo para a difusão da viola caipira no Brasil. É a arte da viola embelezando a trama pantaneira".
Atração principal do espetáculo Viola em canto de mulher, que ocorre neste fim de semana, na Praça Padre Roque, no Núcleo Bandeirante, a compositora, cantora e violeira Karen Pereira deixa claro que a viola e a música caipira estar em evidência em uma novela, exibida no horário nobre da tevê, é um fato da maior importância para o segmento.
"Particularmente, acho que Pantanal ajuda a popularizar o instrumento representativo da música sertaneja de raiz e da cultura do Brasil profundo. Sentimos o reflexo disso nos palcos onde recebemos pedidos do público para tocar canções interpretadas por Almir Sater e outros violeiros, em rodas e na novela e que embalam a atuação dos atores", comenta Karen.
Na avaliação de Carol Carneiro, violeira e cantora, formada pela Escola de Choro de Brasília, com 20 anos de estrada, ao ser ouvida no rádio, na televisão e na internet, a viola caipira volta de forma acessível ao lugar de origem, o povo."A temática de Pantanal reforça a cultura vinda do instrumento que tanto fala da nossa realidade, assim como das tradições brasileiras." E vai além: "Nada melhor que uma difusão bem contextualizada para maior propagação da cultura popular, inclusive estimulando o ensino e o aprendizado nas escolas".