No palco, Mariana Xavier se desdobra em sete. Cada uma das personagens de Antes do ano que vem reúne angústias e desejos de uma época na qual a internet falseia a realidade e a solidão parece tomar dimensões desproporcionais. É noite de réveillon e a personagem Dizuíte está prestes a perder a festa em família para atender às ligações da Central de Apoio aos Desesperados. Sob a direção de Lázaro Ramos, Ana Paula Bouzas e Márcio Vieira, o espetáculo será apresentado hoje e amanhã no Teatro Royal Tulip.
Uma adolescente que se sente invisível para os pais, uma socialite falida, que acha que não vai dar conta de viver se não for com a fartura com a qual sempre viveu, uma influencer cujo mundo está desabando mas, nas redes sociais, ela finge que está tudo bem, a coleção de personagens é farta e Mariana vive cada uma delas sem sair do palco. A direção de movimento de Márcio Vieira foi fundamental para que a atriz conseguisse dar conta da dinâmica do espetáculo. “Esse espetáculo é, sem dúvida, o maior desafio da minha carreira porque a proposta é viver esses sete personagens sem sair de cena um só minuto, sem ter que trocar de roupa e sem nenhum adereço para amparar”, explica a atriz, que já fez parte de elencos como o do filme Minha mãe é uma peça e da novela A força do querer. “Tem sido muito legal fazer a diferenciação dessas personagens só no corpo e na voz e depois receber o feedback do público dizendo ‘olha, enxerguei todas essas sete mulheres’.”
Antes do ano que vem trata, basicamente, da angústia causada pela distância entre as expectativas criadas pelas pessoas e a realidade, entre o que se mostra nas redes sociais e a verdade. “A peça fala muito sobre esse momento em que parece que a felicidade é uma obrigação, você tem que estar feliz o tempo todo, e também sobre essa ideia de que só depende de você, como se os fatores externos não nos afetassem. É uma peça com muito humor, mas que propõe muitas reflexões também”, avisa Mariana.
O réveillon, ela acredita, é uma data em que a felicidade parece ser obrigatória e as expectativas são sobrevalorizadas. “Você tem que estar muito feliz, tem um monte de rituais impostos, tem que estar ou com família ou com amigos, tem que beber, sorrir, postar foto”, diz. “Essa cobrança angustia muito as pessoas, nos faz esquecer de olhar para nosso lado triste e sombrio que existe, essa dualidade é que nos faz humanos. O réveillon é uma data que traz esperança, mas tem também um sentimento de muita frustração, de pessoas que projetaram muitas coisas e não conseguiram realizar. Isso traz muita infelicidade.”
A peça também traz um certo otimismo, postura que, Mariana admite, tem sido difícil de manter na vida real. Mas o humor ajuda a superar. A atriz lembra do amigo e parceiro Paulo Gustavo, que gostava de dizer que “rir é um ato de resistência”, e diferencia a esperança do otimismo. “A gente está num momento em que está bem difícil ser otimista, a gente está vendo um cenário desolador no Brasil. Nos últimos anos, parece que os esgotos se abriram e tudo de pior da nossa sociedade começou não só a aparecer e vir à tona mas a ser exaltado. É difícil ser otimista, mas eu escolho a esperança de que a gente vai sair de tudo isso. E a Dizuíte é isso, ela não deixa de enxergar o que está ruim, mas ela tem esperança, apesar de todos os desafios”, diz a atriz.
Antes do ano que vem
Com Mariana Xavier. Direção: Lázaro Ramos, Ana Paula Bouzas e Márcio Vieira. Hoje, às 21h, e amanhã, às 19h, no Teatro Royal Tulip (Hotel Royal Tulip-SHTN Trecho 1). Ingressos à venda na Belini, sem taxas, ou Bilheteria Digital, a R$ 100, R$ 50 (meia) e R$ 60 (ingresso solidário com doação de 1Kg de alimento)