Crítica

O filme "Casa de antiguidades' reflete valores da mulher da casa abandonada

Incisivo, longa de João Paulo Miranda Maria, selecionado para o Festival de Cannes, desarma preconceitos raciais

Ricardo Daehn
postado em 23/07/2022 10:25
 (crédito: Carlos Eduardo Carvalho/Divulga??o)
(crédito: Carlos Eduardo Carvalho/Divulga??o)

Na semana que parou o Brasil, em função da chamada mulher da casa abandonada, é impressionante a vitalidade do recado visto no mais recente filme brasileiro destacado pela seleção do Festival de Cannes. A pujança do longa Casa de antiguidades, todo calcado na propagação de modelos patriarcais, assinado pelo estreante diretor João Paulo Miranda Maria só foi ofuscada por imprevisto mundial: o despontar da pandemia. Num piscar de olhos, os filmes não puderam ser vistos no Palácio dos Festivais da meca do cinema de arte, e nem puderam disputar prêmios na Croisette. Antes de estar em Cannes com o longa, o diretor paulista emplacou os curtas Meninas formicidas (em evento de Veneza) e A moça que dançou como diabo, igualmente no Festival de Cannes.

Corroteirista do longa, Felipe Scholl, vale a lembrança, respondeu por dois recentes filmes que tratavam preconceitos: Fala comigo (que trazia a personagem de Karine Teles apaixonada por um jovem) e M-8: Quando a morte socorre a vida, calcado em preconceito racial. Uma completa ausência de interatividade e de empatia recai sobre o protagonista Casa de antiguidades vivido pelo emblemático ator Antônio Pitanga. Ele empresta corpo e alma a Cristovam, um homem do campo que, sem aviso, passa a compôr a cena de produção de laticínios, ao sul do Brasil, completamente incompreendido, não apenas dado o etarismo; mas ainda encarando opressor cotidiano que invalida sua cultura e atrita o evidente choque com princípios que carrega.

Premiado em festival de Toulouse (no Fipresci, atribuído pela federação internacional de críticos) e selecionado para eventos de San Sebastián (Espanha) e Toronto (Canadá), Casa de antiguidades rendeu prêmios de atuação para o eterno intérprete de Barravento e A idade da Terra tanto em Lima (Peru) quanto em Colônia (Alemanha). Numa trajetória repleta de tentativas de comunicação, Cristovam apela para um berrante, numa cena decisiva. Nos poucos vínculos que acalenta, um cachorro faz rara parceria com o personagem negro que afunda numa ritualística, que o vocaciona para empunhar uma lança, tal qual indígena. Recheado por rupturas, o destino que Cristovam cumpre ganha uma dimensão cinematográfica ampliada, graças à trilha sonora de Nicolas Becker (O som do silêncio) e à elaborada direção de fotografia a cargo de Benjamín Echazaretta (colaborador habitual do chileno Sebastián Lélio, em filmes como Glória).

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