O presidente Jair Bolsonaro (PL) desembarcou nesta quinta-feira (9/6) em Los Angeles, onde participará da 9ª Cúpula das Américas. Com foco no meio ambiente, saúde e democracia, o tema deste ano é "Construção de um futuro Sustentável, Resiliente, e Equitativo". No final da tarde, Bolsonaro comparecerá na plenária de abertura da Cúpula. Às 19h15 (horário de Brasília) está previsto um encontro bilateral de Bolsonaro com o presidente norte-americano e anfitrião do evento, Joe Biden. É a primeira vez que os líderes dos países se reúnem. Há a previsão ainda de um jantar oferecido por Biden e pela primeira-dama, Jill Biden.
Na comitiva, entre outros, acompanharam o presidente o ministro das Relações Exteriores, Carlos França, o ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite e a primeira-dama, Michelle Bolsonaro.
Segundo o Itamaraty, na reunião bilateral entre Brasil e Estados Unidos, os presidentes devem tratar de temas da cúpula, como a preparação para o enfrentamento de pandemias, a recuperação econômica pós-covid-19, desenvolvimento sustentável, energias limpas e mineração. Além disso, também estarão na mesa os impactos da guerra da Rússia na Ucrânia no suprimento de fertilizantes, assim como o efeito na segurança alimentar global.
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O presidente afirmou ontem que, em conversa com Biden, deverá mostrar “o que é o Brasil”. Ele citou ainda temas como meio ambiente e segurança alimentar. Bolsonaro só aceitou o convite após Biden ter enviado um emissário especial, Christopher Dodd confirmando que o receberia pessoalmente para um encontro.
“Eu não iria à Cúpula. Não iria aparecer em fotografia, mas foi feito um diálogo com o assessor do Biden. Foi acertado uma reinião bilateral e vamos conversar com ele mostrando o que é o Brasil. Vamos falar sobre segurança alimentar. O mundo não vive mais sem o Brasil a não ser passando fome. Falar, se ele tiver alguma pergunta sobre a minha ida à Rússia. Lógico, o que eu puder falar eu vou falar. O que eu não puder falar, não vou falar. Não tenho conversa em off com nenhum chefe de estado do mundo”, apontou na ocasião.
No dia 8, questionado se o encontro seria um recomeço, Bolsonaro confirmou, mas ponderou que tudo "depende do que acontecer". "Ele não vai, no meu entender, querer impor algo que eu deva fazer na Amazônia. Eu acho que ele me conhece, conhece mais do que a mim, conhece a região. Não podemos relativizar a nossa soberania", afirmou.
"Cúpula é um evento que sem o Brasil é bastante esvaziado. Terei uma reunião bilateral por 30 minutos com Biden, não sei o que ele vai falar de lá para cá, se entrar na questão ambiental já sei como proceder. Vários países querem relativizar a soberania da Amazônia, como se aquilo fosse algo do mundo, e não é assim. Então não entra na discussão", completou na data.
Também hoje, Bolsonaro deverá interromper a agenda nos Estados Unidos para se pronunciar a respeito do preço dos produtos da cesta básica. A fala acontece ao vivo, durante o segundo Fórum da Cadeia Nacional de Abastecimento, transmitido pelo canal do Youtube da Associação Brasileira de Supermercados (Abras).
Já no sábado, o presidente viaja para Orlando, onde participará da inauguração do vice-consulado brasileiro. O primeiro vice-presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, deputado Rubens Bueno (Cidadania-PR), apontou que o Brasil terá um papel fundamental em temas como transição para a energia limpa e cooperação em matéria de saúde pública, além do enfrentamento ao aquecimento global. Para ele, é uma oportunidade do país romper o isolamento internacional.
“Infelizmente, apesar de o Brasil ter muito a contribuir em ambas as áreas, a figura do presidente Bolsonaro aponta na contramão da nossa imagem, de incentivar o desmatamento ilegal e negar a ciência durante toda a pandemia. No entanto, a participação do Brasil na cúpula já deve ser encarada como um ponto positivo. Esperamos que nosso país retome a tradição diplomática de construir parcerias e desenvolvimento para a sua população”, apontou.
No último dia 7, um grupo de entidades da sociedade civil, entre elas a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), e Greenpeace Brasil enviaram a Biden uma carta pedindo defesa da democracia e da causa ambiental, defendendo que “as negociações só avancem quando o Brasil provar seu compromisso com a proteção da floresta Amazônica”. Destacaram ainda a preocupação de a reunião bilateral ser usada para fins eleitorais, de sinalização de alinhamento com a gestão Bolsonaro.
Clima frio
Se por um lado há a expectativa da diplomacia dos países de que Biden e Bolsonaro não aprofundem assuntos classificados como “delicados”, o presidente também acredita que não passará por uma saia justa de ser questionado sobre o respeito ao sistema eleitoral brasileiro e sobre a Amazônia. Porém, para Paulo Roberto Almeida, diplomata e ex-presidente do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais (Ipri), como Bolsonaro tem atacado reiteradas vezes o processo de eleições no país, ameaçado não cumprir decisões da Corte e atacado reiteradas vezes os ministros, Biden não poderá fazer vistas grossas em meio à pressão que também enfrenta em relação a receber o chefe de Estado brasileiro.
“Ainda que não fale em público, há uma cobrança para que ele reforce que confia que as eleições no Brasil serão seguras. Na bilateral, não espero muito porque eles não se bicam. Se “congelaram” relação conforme o presidente do Brasil falou, foi porque ele teve atitude imprópria. Essa reunião não vai ter resultados práticos, mas devem assumir promessas de compromissos”, apontou.
Ainda no começo da semana, Bolsonaro voltou a colocar em dúvida as eleições americanas e alegou que o ex-presidente Donald Trump — que concorreu pela tentativa de reeleição em 2020 — poderia ter razão em suas acusações sobre fraude, pois “estava muito bem” no pleito e que fica “com o pé atrás”. O diplomata observou que não há um clima de entendimento entre os dois presidentes.
“Há um clima frio entre eles por causa desse fator Trump e reiterada afirmação que eleições não foram totalmente transparentes. Biden talvez fale da China. Deve falar genericamente que existe esforço das autocracias de estender influência pelo mundo, mas que é necessário uma espécie de comunidade da democracia de países abertos”.
Outra pauta que deverá ser destaque na conversa privada, apontou, será o desaparecimento do indigenista da Fundação Nacional do Índio (Funai) Bruno Araújo Pereira e o jornalista inglês Dom Phillips, colaborador do jornal The Guardian.
“Biden vai pedir que o governo faça todo o esforço para encontrar os dois desaparecidos. Porém, com o desmonte das políticas ambientais, Bolsonaro é o co-autor desses crimes pois incita essa violência”.