O espetáculo Apré deprê tem três horas de duração e ocupa o espaço de um bar. Quando o público chega ao local, recebe uma cartela de bingo, um anúncio de que haverá jogo pela frente. Não será possível ficar em uma atitude passiva. A estratégia faz parte de uma noção fundamental para a Andaime Cia. de Teatro: tentar tirar o espectador de um olhar passivo para o que ocorre em cena. Apré deprê vai ocupar as instalações do Velvet Pub, hoje e amanhã. Será o início das comemorações dos 15 anos de criação da companhia e uma introdução para temas e técnicas desenvolvidos por seus integrantes ao longo dos anos.
Para a celebração, a Andaime escolheu seis espetáculos a serem apresentados até dia 8 de maio. "A gente vai fazer quase todos os nossos espetáculos do repertório. Nunca matamos nenhum dos nossos trabalhos. Obviamente, temos trabalhos que não fazemos há mais tempo, mas consideramos todos os nossos trabalhos vivos. E cada trabalho nos traz um desafio diferente", explica Tati Bittar, uma das nove integrantes do grupo.
Apré deprê, segundo Larissa Mauro, também membro da companhia, é um espetáculo mais sombrio e se assemelha a uma performance. A montagem nasceu em 2017, quase um ano após o impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff. "Naquele momento a gente estava muito desanimado, tinha acabado de acontecer o golpe, a gente estava nesse baque de um desmonte cultural, com espaços fechando em Brasília. É um espetáculo denso, que puxa a energia para um lado mais realista, não é um ambiente alegre nem fértil", avisa a atriz.
Criada em 2007 por jovens atores então recém-formados na Universidade de Brasília (UnB), a Andaime estreou com (des)esperar, uma adaptação de Esperando Godot, de Samuel Beckett, que também entrou para a programação de comemoração da mostra. É o único espetáculo da companhia montado na tradicional caixa preta do teatro. De lá para cá, a experimentação de um teatro mais próximo do público e menos convencional tomou conta da Andaime. "Sempre tivemos esse desejo, que virou uma linguagem e que virou nossa pesquisa, que é interação com o público, ter o público como parte de nossa pesquisa, colocar público e intérpretes numa horizontalidade, sem a quarta parede", explica Larissa.
A intenção é romper com conceitos clássicos do que é fazer teatro, incorporando espaços não convencionais e uma linguagem mais interativa. "A gente sempre trabalha com dispositivos em que o público é parte da ação. É uma via de mão dupla. Temos vontade de desmistificar mesmo o teatro. O teatro, da mesma forma que aproxima, também afasta", diz Larissa.
O espetáculo mais recente é fruto dessa experimentação. Com transmissão nos próximos sábado e domingo, Quando soltaram os cachorros loucos, adaptação de texto de Caio Fernando Abreu, foi criado para o ambiente virtual durante a pandemia. Foram 12 lives em 2021, com direito a participação do público, que podia sugerir ideias para o espetáculo. Para a mostra comemorativa, a Andaime preparou um compilado com os melhores momentos. "Na mostra, a gente vai fazer todas as atividades formativas na rede e apresentar trabalhos presencialmente. Estamos fazendo uma coisa híbrida, o que era impensável em 2019", explica Tati Bittar. Uma série de oficinas está programada para ocorrer on-line, pelo zoom, a partir do dia 10 de abril. Entre os oficineiros, há nomes como Luiz Rufino, Jorge Louraço, que dá aulas de Portugal, e Cristiane Sobral. As atividades são gratuitas e as inscrições podem ser feitas pelo Instagram do grupo (@andaimeciadeteatro).
Experimentar o ambiente on-line foi uma espécie de último salto da Andaime. Larissa conta que, desde o abandono da caixa preta, o teatro convencional entre quatro paredes, a companhia nunca mais voltou aos ambientes fechados. A primeira vez na rua foi com Serpentes que fumam, que será encenado a partir de segunda-feira nas Regiões Administrativas.
O espetáculo consiste em uma série de ações criadas para envolver o público e inspiradas no Movimento futurista, cuja proposta é deslocar o foco do objeto cênico: aqui, as ações e interações passam a ser mais valiosas do que a interpretação. "É uma série de intervenções urbanas, gosto de chamar de assaltos culturais, a gente atua em espaços públicos e privados reivindicando nosso direito à arte, à cultura, levando surpresas artísticas aos transeuntes. Fazemos na hora do almoço, em cartório, metrô, em horários de pico, quando as pessoas estão cansadas e irritadas, e fazemos um aniversário. A proposta é entregar gentilezas a desconhecidos íntimos", explica Larissa.
Na programação também entra a primeira peça infantil da Andaime. Saci é uma peça estreou no Festival Internacional para Pequeno Público, em Almada (Portugal), em 2013. A realização do espetáculo em parques e espaços de convivência acaba facilitando a acessibilidade do público, uma das ideias centrais da pesquisa da Andaime. "Nossa vontade é ir de encontro às pessoas", avisa Larissa.
Programação da mostra
Apré Deprê
Hoje e amanhã, das 20h às 23h, no Velvet Pub (CLN 102, Lojas 28/32). Ingresso: R$ 15,00. Classificação Indicativa: 16 anos
Quando soltaram os cachorros loucos
16 e 17 de abril , no canal do YouTube da Andaime Cia de Teatro. Gratuito. Classificação Indicativa livre
Saci é uma Peça!
24 de abril, às 11h e às 16h, no Parque Olhos D'água. Gratuito. Classificação Indicativa: Livre
(des)esperar
29 e 30 de abril e 1 de maio, às 20h, no Teatro SESC Garagem 913 sul. Ingresso: R$ 40 e R$ 20 (meia-entrada). Classificação Indicativa: 12 anos
Poéticas Urbanas
5 de maio (quinta), às 12h, na parada de ônibus em frente ao Hospital de Base, ao lado do Eixo W (eixinho), e 6 de maio, às 16h, na Praça do Museu da República. Gratuito. Classificação Indicativa livre
Serpentes que Fumam
11, 18 e 20 de abril, e 8 de maio, em diferentes Regiões Administrativas do DF. O público está convidado a encontrar a companhia pela cidade. Gratuito. Classificação Indicativa livre
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