Tudo tem que ser feito com amor, define o sambista Martinho da Vila, que, aos 84 anos, lança seu novo álbum. O mais recente projeto que vem do coração de Martinho é Mistura homogênea, definido como um encontro sem fronteiras definidas entre poesia e música, rap e partido alto, samba rural e samba-enredo, reza e festa.
Mesmo com mais de meio século de carreira e incontáveis álbuns na discografia, o sambista revela que ainda sente o "friozinho na barriga" ao lançar um novo trabalho. "Antigamente, eu sentia mais, porque havia o disco físico. Aí, eu ficava torcendo para ver o disco logo, a capa, o encarte, essas coisas. Eu ia à gravadora, pegava o disco e era uma coisa que me dava uma grande sensação", relembra o cantor em entrevista ao Correio.
Agora, com as plataformas de streaming, o sentimento mudou, mas continua presente. "Eu ainda fico um pouquinho ansioso, como se eu fosse um iniciante. Fico ansioso para ver a capa estampada na internet, o que as pessoas estão achando", conta. "Esse disco eu projetei inteiramente desse jeito que está sendo lançado. Eu imaginei e consegui fazer, então foi muito legal", comemora.
Assim como nos projetos anteriores, Martinho da Vila chegou a afirmar que esse seria seu último álbum e que pretendia focar somente na gravação de singles avulsos. "Volta e meia eu falo que não vou mais gravar, que vou dar um tempo, mas aí vem uma ideia e eu falo: 'Epa, vou gravar sim'", admite Martinho. "O que eu falo não se escreve, porque eu falo e depois resolvo o contrário. Nesse sentido, eu sou um cara sem palavra", ri. "Eu tenho 84 anos e pretendo ficar aqui na Terra enquanto eu puder ser útil, enquanto eu puder criar coisas que sejam úteis para o coletivo. Esse é o sentido da vida", pontua.
"Eu sempre sou motivado pelo acontecimento, pela emoção, pela vontade de fazer coisas. A inspiração vem do meio, eu sou influenciado pelo meio que eu vivo e aproveito tudo isso para passar o meu pensamento, o que eu acho das coisas, de uma maneira tranquila", aponta.
A ideia do álbum Mistura homogênea surgiu a partir da faixa Unidos e misturados, parceria com Teresa Cristina, que abre o disco. "Eu fiquei pensando nessas misturas e, como eu estudei um pouquinho de química, eu lembrei das misturas químicas. Foi assim que veio à mente a mistura homogênea, que são essas misturas inseparáveis", explicita.
Na faixa, a dupla propõe se juntar para cortar as ervas daninhas "tais como as quais que estão lá no cerrado", referência aos políticos que ocupam o Palácio do Planalto, atualmente. "A música também tem que fazer pensar. Ela foi feita para satisfazer os ouvidos, mas, se ela levar à reflexão, é melhor ainda", assegura.
Como de costume nas obras de Martinho, Mistura homogênea conta com a presença de grandes nomes da música, contemplando do samba ao rap. Entre participações de artistas como Zeca Pagodinho, Djonga e Hamilton de Hollanda, a mais especial, definitivamente, é a de Alegria Ferreira, filha do sambista. O disco marca a estreia de Alegria como cantora, dividindo os vocais de Samba africano com o pai.
Com a presença da caçula, o novo álbum torna-se o primeiro trabalho de Martinho com a participação de todos os filhos, além da presença dos netos Raoni e Dandara. "Nunca consegui reunir a prole toda", destaca Martinho."Mas, desta vez, os familiares todos participam de Canta canta, minha gente! A vila é de Martinho, samba-enredo do desfile da Vila Isabel de 2022, que homenageará a vida e a carreira do sambista. "Meus filhos participam do coro, participam de tudo. É uma mistura mesmo, homogênea", garante.
Gravado como se fosse no Sambódromo da Marquês de Sapucaí, com direito a anúncio do locutor, fogos de artifício na abertura e participação da bateria da Vila, o samba descreve Martinho. "O samba é maneiro, é diferente. É uma conversa do componente com o homenageado", explica o músico. "Ferreira, chega aí / Abre logo uma gelada, vem curtir", são os versos que abrem a canção, se referindo ao cantor pelo sobrenome.
Originalmente, a homenagem tinha previsão para ser realizada no carnaval de 2021, mas foi adiada devido à pandemia da covid-19. "Eu não gosto desse vírus, porque já era para eu ter sido o homenageado da Vila Isabel. Vírus safado!", brinca. Agora, o desfile será realizado no próximo mês. "Vai haver o carnaval agora, mas eu preferia que o carnaval fosse só em fevereiro, que é o mês que tem o clima do carnaval. É verão, é outra coisa. Então, se dependesse de mim, não haveria em abril, só no outro ano", opina. Apesar do desejo de mais um adiamento, Martinho se mantém animado para a celebração no Sambódromo. "A Vila Isabel será um arraso. Nós vamos ganhar o carnaval", aposta.
*Estagiária sob a supervisão de Severino Francisco
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