Mulheres de comportamento muito arrojado, dissolução de valores da tradicional família patriarcal e ataques à estrutura da burguesia — todos elementos atualíssimos integram a cinematografia de Arnaldo Jabor.
Criador de poemas e peças, ainda nos bancos estudantis, Arnaldo estudou cinema com o sueco Arne Sucksdorff, tendo sido, em meados dos anos de 1960, técnico de som do longa Ganga Zumba (de Cacá Diegues) e de Maioria absoluta (Leon Hirszman), além de assistente de direção de Integração racial (fita de Paulo César Saraceni).
Antes de criticar valores da classe média, na maior parte das vezes impulsionado por análises sarcásticas, o cineasta alinhavou carreira com curtas-metragens, entre os quais O circo (1965), documentário com financiamento do Itamaraty, que mostrava a míngua relegada ao circo, e Os saltimbancos (1968), exame dos busker no país. Cineclubista desde a juventude, Jabor foi consagrado como agente participativo da sociedade. Junto a personalidades como Nara Leão, Ziraldo e Fernando Sabino, numa porção ator, integrou o elenco de Garota de Ipanema (1967).
Com ação situada numa colônia em que há disputas de poder (da parte de corruptos), além de extermínio de negros, no século 16, o longa Pindorama (1970), do diretor, disputou a Palma de Ouro no Festival de Cannes.
As intermináveis reformas num apartamento de Copacabana deram chão para os delírio que juntaram proletariado, suburbanos e emergentes, em Tudo bem (1978), com direito a Paulo Gracindo, Fernanda Montenegro e Zezé Motta no elenco.
Nos anos anteriores, personagens particularizaram a representação de instituições falidas, como no caso de Toda nudez será castigada (1973), vencedor de Urso de Prata (no Festival de Berlim), e O casamento (1975), inquietantes e ousadas adaptações de obras de Nelson Rodrigues. No exame impiedoso do desejo e das demandas sexuais, em que Darlene Glória entregou uma performance insuperável, Jabor escandalizou os conservadores de plantão. Tudo ao som de marcantes músicas de Astor Piazzolla.
Novamente sob a colaboração do roteirista Leopoldo Serran (de Tudo bem), Jabor se esmerou em Eu te amo (1980), estrelado por Sônia Braga e Paulo César Pereio. Com luxuosa fotografia de Murilo Salles, o longa revela novas pulsões amorosas para uma ciranda de personagens, há pouco, desiludidos.
Mordaz observador da decadência e da alienação, Jabor refinou a dramaturgia e alcançou sucesso em teatro, livro e longa, com Eu sei que vou te amar (1985), originalíssimo texto de Jabor, com magistrais embates entre Thales Pan Chacon e Fernanda Torres (premiada no Festival de Cannes, em empate com Barbara Sukowa, atriz de Rosa Luxemburgo).
Depois de 24 anos afastados da feitura de longas, em 2010, Arnaldo Jabor se aprumou para o virtual canto de cisne: A suprema felicidade, embebido de memórias próprias. Para a total surpresa de muitos, 2022 ainda trará o filme testamento de Jabor, sob o enigmático título Meu último desejo, tudo baseado em Rubem Fonseca.
Notícias pelo celular
Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.
Dê a sua opinião
O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.