Elza Gomes da Conceição, nascida em 23 de junho de 1930, foi tantas mulheres em uma só vida que dificilmente terá sua história contada a contento. Eleita pela BBC de Londres ‘A voz do milênio’ na virada de 1999 para 2000, a cantora deixa um país inteiro órfão neste 20 de janeiro de 2022, curiosamente, o mesmo dia em que morria o ex-marido, Garrincha, há 39 anos.
Segundo nota da equipe de imprensa, Elza morreu em casa de causas naturais. Sem sofrimento, por tanto, é possível imaginar. Nada mais justo para alguém que viveu tão de perto algumas das piores coisas que se pode presenciar na Terra. O nome de seu trabalho mais recente, Planeta fome, faz referência a uma frase dita por ela na primeira vez em que se apresentou publicamente como cantora.
Aos 21 anos de idade, recém-viúva, poucos anos depois de perder dois filhos para a desnutrição e com outros quatro para criar, ela foi recebida com gargalhadas pelo auditório no programa de Ary Barroso. O próprio apresentador fez graça com a figura simples, vestida com roupas muito largas e penteada com uma maria chiquinha, ele perguntou: ‘De qual planeta você veio minha filha?’, ao que Elza sempre afiada respondeu: ‘Do mesmo planeta que o senhor, Seu Ary. Do planeta fome’.
A chacota cessou depois que a cantora soltou o vozeirão ao som de Lama, Paulo Marques e Aylce Chaves, ainda hoje conhecida pelas interpretações dela. Apesar disso, o pouco dinheiro que ganhou durante a apresentação foi todo para pagar remédios para o filho de dois anos que estava doente. O sucesso só veio anos depois e, mesmo no topo das paradas de sucesso, ela precisava enfrentar o racismo e o sexismo que não escapam ao meio artístico.
Lutou contra uma campanha difamatória no início dos anos 1960, por conta de seu envolvimento com Garrincha enquanto o atleta ainda era casado. Seguiu falando de romance, ativismo e sobre as cruezas da vida até o fim, como cantou em A mulher do fim do mundo: “A minha casa, minha solidão. Joguei do alto do terceiro andar. Quebrei a cara e me livrei do resto dessa vida. Na avenida, dura até o fim”.
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