Durante anos, os heróis, as princesas, os papéis principais das grandes histórias da animação eram personagens brancos, de origem europeia, ou animais. Aos poucos, o cinema foi abrindo espaço para que figuras como Tiana, a primeira princesa e protagonista negra, assumissem as telas da Disney. Assim, outras culturas foram apresentadas como a maori em Moana e a mexicana em Viva — A vida é uma festa. Porém as pessoas e a cultura da América do Sul ainda não tinham chegado às telas da produtora do Mickey Mouse. Esse fato muda hoje, com a chegada de Encanto, um das estreias da semana, ao lado de Casa Gucci (com Lady Gaga) e Deserto particular, filme nacional de trajetória bem-sucedida (leia críticas).
A animação apresenta a história da família Madrigal, moradores de uma vila protegida por montanhas na Colômbia, um espaço mágico que foi dado a eles após grande sacrifício de um antepassado. Todos da família, que vive em uma casa mágica, possuem habilidades especiais: superforça, audição além do alcance, controle da natureza e cura. Porém, a protagonista Mirabel é a única que não recebeu nenhum dom, mas também é a única capaz de ver que toda magia corre perigo. Dirigido por Jared Bush e Byron Howard, o filme conta com uma animação avançada, complexa e detalhada, além de músicas de Lin-Manuel Miranda, criador de Hamilton.
"Eu nunca seria capaz de imaginar que esse cenário aconteceria comigo, como chegar nesse ponto em que nós temos um filme sobre a Colômbia feito na mais alta qualidade de animação, com diretores do nível de Jared (Bush) e Byron (Howard) e as músicas com Lin-Manuel (Miranda)", conta John Leguizamo, ator que dubla Bruno, um misterioso, mas importante personagem da história. "A principal mensagem do filme é que, mesmo você não se sentindo especial, querido ou mesmo acha que não tem um dom, você vai achar em que é bom, todos são importantes na família", explica o artista ao Correio.
Leguizamo tem um extenso trabalho em Hollywood, onde fez papéis em Romeu Julieta (1996), De volta para o jogo e Chef (feitos em 2014), mas foi nas animações que ele obteve mais notoriedade, dando voz a Sid de Era do Gelo. Ele acredita que de quando começou até os dias de hoje, muito melhorou. "A animação evoluiu muito, eu comecei em 2000 com Era do gelo, quando o cabelo nem movia e a pela parecia plástico em animações. Agora chegamos num ponto em que está tudo muito detalhado e complexo, parece real", reflete.
Contudo, por mais que todos os aspectos técnicos sejam levados em conta, o ator vê a potência desse filme na representatividade. "A mensagem subliminar é que quando você vê todas as cores, os tons de pele do filme e as texturas de cabelo, você entende que todos nós somos bonitos, estamos todos incluídos e somos todos importantes. Isso é imprescindível, porque as crianças que vão sair do cinema sabem que elas têm relevância", pontua o dublador, que se lembra do próprio passado. "Quando assisti A Chorus Line (1985) com uma atriz porto-riquenha chamada Yamil Borges, que tinha músicas e era protagonista, foi uma mensagem para mim de que eu poderia me tornar ator. Isso foi muito importante e eu espero que Encanto possa passar o mesmo sentimento para todas as crianças latinas que assistirem", completa.