Navegação

Brasileira mais jovem a atravessar o Atlântico lança livro sobre vida no mar

A marinheira Tamara Klink, de 24 anos, lançou uma obra sobre a primeira aventura sozinha em um barco e um livro de poesias

Helena Dornelas*
postado em 10/11/2021 18:51
"Conheci o mar através do vazio que ele deixava na minha família. O mar era o motivo da ausência do meu pai em casa", relembra a jovem. - (crédito: Reprodução redes sociais)

"Só pude sonhar com o mar porque soube que ele existia. E sabia, inclusive, que ele poderia ser um caminho para mim mesma", conta a marinheira Tamara Klink, de 24 anos. Na última sexta-feira (5/11), ao desembarcar em Recife, capital pernambucana, ela tornou-se a brasileira mais jovem a cruzar o oceano Atlântico navegando sozinha. 

Natural de São Paulo, Tamara é filha do renomado navegador Amyr Klink. Ela vive atualmente na França, onde cursa arquitetura terrestre e naval pela Escola de Arquitetura de Nantes. Antes de se mudar, em 2018, Tamara entrou no curso de arquitetura na Universidade de São Paulo (USP), mas desistiu. Segundo ela, o sonho de projetar veleiros não tinha mais espaço na universidade nacional.

A primeira experiência de Tamara no mar ocorreu ainda cedo, como passageira do pai. Mas crescer em uma família de navegadores também a fez enxergar o mar como um sinônimo de solidão."Conheci o mar através do vazio que ele deixava na minha família. O mar era o motivo da ausência do meu pai em casa, porque ele viajava por longos períodos. Mas quando voltava, ele trazia histórias de lugares mágicos, de animais marinhos maiores que o barco, pedaços de gelo maiores que quarteirões e isso me fez sonhar em um dia estar nesses lugares.”

Crescer e Partir

A primeira aventura sozinha no mar começou em 2020, quando Tamara comprou o barco "Sardinha" na Noruega. A primeira pessoa da família a saber do sonho de atravessar o Atlântico foi a avó dela, Ana Francesca. "Nós éramos confidentes, eu guardava os segredos dela", diz a avó. Ana conta que sabia dos riscos e perigos de viajar sozinha em um veleiro, mas que mesmo assim decidiu apoiar o sonho da neta.

Por muito tempo, a avó foi a única a saber do plano da viagem. "Quando comprei o barco, tive muitos medos, muitas inseguranças. Tive medo de não conseguir completar a viagem. Mas decidi ao menos tentar", explica Tamara. 

A primeira travessia sozinha foi na Europa, um percurso entre a Noruega e a França. A aventura não foi fácil, o Sardinha enfrentou um caminho com muitas pedras e navios. O relato da viagem virou um livro, o Mil Milhas, que está em pré-venda. A obra será lançada no próximo dia 10 de dezembro, e estará disponível também no box Crescer e Partir, que conta ainda com um livro de poesias escritas pela navegadora, chamado Um mundo em poucas linhas.

"Eles falam sobre crescer, sobre tomar coragem de seguir os nosso sonhos e se afastar dos pais para perceber quais sonhos são deles e quais são realmente nossos", explica. "Sinto agora que eu já não sou mais dona das palavras, elas estão com vida própria. Eu sinto muito isso quando abro o Instagram. Vejo pessoas pegando frases e dando significados a elas que eu nem poderia pensar.” explica Klink.


A travessia do Atlântico

Após desembarcar em Recife, a brasileira mais jovem a cruzar o Atlântico sozinha tem muito a contar. A viagem começou na França e durou três meses, passando por mais três países antes de chegar ao Brasil. Ao todo, foram 4.600 milhas percorridas. 

Tamara considera que a aventura foi um sucesso, mas destaca eventuais sustos e preocupações, como ventanias, medo de piratas e animais marinhos, e, principalmente, a passagem pelas Ilhas Canárias, que ocorreu durante a erupção de um vulcão. "Eu me dei o direito de ir aprendendo ao longo do caminho", relata. "Acho que um dos momentos mais difíceis foi na partida. Ficar pronto para partir é uma travessia em si. São muitos desincentivos e dificuldades que podem colocar todo percurso em risco", completa. 


Ser uma mulher no mar 

“Me sinto responsável também pelas mudanças de referências do que é possível para uma mulher”, diz Tamara. Ela conta que nem sempre foi fácil encontrar mulheres no mar para se inspirar, e por mais que o mundo tenha melhorado em inúmeros sentidos, mesmo hoje, ver uma mulher navegando sozinha ainda é algo novo. 

Tamara explica que a hashtag #longejuntas foi muito importante para essa percepção. “Eu levo isso bem a sério, porque eu só consegui chegar onde cheguei porque outras mulheres vieram antes", diz. 

O apoio que recebeu de muitas mulheres também foi essencial quando Tamara chegou em terra firme, no Brasil. Em Recife, ela disse ter recebido algumas mensagens de "parabéns" que a fizeram questionar como as mulheres são vistas. "Dois navegadores que eu respeitava e me inspirava, olharam para mim e falaram: ‘Não achei que você fosse passar de Cabo Verde’, e o outro ‘não achei nem que chegaria lá’”, relata.

Para Tamara, isso mostra que, mesmo tendo completado o percurso, muitas pessoas ainda continuam duvidando da capacidade de mulheres superarem desafios como o dela. “A única certeza que eu tenho é de que para o mar não importa se eu sou grande ou pequena, forte e fraca, homem ou mulher”, garante. 

Estagiária sob supervisão de Pedro Grigori

 

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