Eram 15h30 quando a equipe do Corpo de Bombeiros da zona rural de Piedade de Caratinga, no interior de Minas Gerais, recebeu a ligação. O telefonema informava a queda de um bimotor King Air da Beech Aircraft próximo ao curso d’água de uma cachoeira. Em questão de minutos, a notícia se espalhou pela internet. Em seguida, ocupou todas as redes de televisão. No fim da tarde, veio a confirmação. O avião de pequeno porte transportava a cantora Marília Mendonça, uma das estrelas em maior evidência na música brasileira. Além da artista, estavam a bordo o tio e assessor dela, Abicieli Silveira Dias Filho; o produtor Henrique Ribeiro; o piloto da aeronave, Geraldo Martins de Medeiros; e o copiloto, Tarciso Pessoa Viana. Todos morreram.
O médico-legista Pedro Fernandes, do Instituto Médico Legal de Caratinga, afirmou que os ocupantes da aeronave sofreram politraumatismos cranianos. Em uma queda de avião, esse tipo de lesão ocorre quando o corpo sofre múltiplos impactos, de diversos lados e de muita intensidade. Esses choques atingem regiões vitais do corpo, como abdômen, tórax, cabeça e pescoço. “Os ocupantes têm lesões contundentes. É difícil determinar uma causa ou um evento letal de cada óbito. São diversos fatores que contribuem para a morte deles. É um politraumatismo craniano”, acrescentou o legista.
A cantora decolou de Goiânia no início da tarde, por volta de 13h. Passaria o fim de semana em Minas Gerais, onde se apresentaria em Caratinga e em outras cidades da região. O avião caiu em um condomínio que abriga uma cachoeira, a 4 quilômetros da pista onde faria o pouso no aeroporto de Caratinga. Por volta das 16h30, a assessora de imprensa de Marília Mendonça informou que a cantora e os ocupantes do avião haviam sido resgatados. No entanto, após a retirada dos corpos no local do acidente, o Corpo de Bombeiros de Minas Gerais confirmou a morte da artista. Eram 17h45.
O avião de prefixo PT-ONJ tinha capacidade para seis passageiros. Estava em situação regular, segundo a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). O Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) informou que abrirá uma investigação para apurar as condições da aeronave. Segundo os primeiros relatos acerca da tragédia, a aeronave colidiu em um local rochoso, após se chocar com uma instalação de rede elétrica na região.
“Na ação inicial, os investigadores identificam indícios, fotografam cenas, retiram partes da aeronave para análise, ouvem relatos de testemunhas, reúnem documentos, etc. Não existe um tempo previsto para essa atividade ocorrer, dependendo sempre da complexidade da ocorrência”. O Cenipa informou, ainda, que o objetivo das investigações é prevenir que novos acidentes com características semelhantes ocorram.
Já a Polícia Civil de Minas Gerais enviou equipes de perícia criminal, investigadores e delegados ao local. O capitão Jefferson Luiz Ribeiro, chefe da comunicação da Polícia Militar na cidade, disse que o avião teve dificuldades pouco antes de chegar ao aeroporto local. O militar não deu mais detalhes sobre qual teria sido o problema. “Infelizmente, essa aeronave, quando estava próxima do aeroporto de Ubaporanga, em Caratinga, teve dificuldade para aterrissar e tentou um pouso forçado”.
Em nota, a Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) relatou que o bimotor atingiu um cabo de uma torre de distribuição da empresa, no Vale do Rio Doce. Segundo a companhia, 33 mil clientes ficaram sem energia devido à colisão. “A Cemig está reativando a Linha de Distribuição (LD) Caratinga 1 – Ipanema 69KV, que interrompeu a energia para cerca de 33 mil clientes dos municípios de Ipanema, Conceição de Ipanema, Taparuba, Pocrane, Mutum e São José do Mantimento, devido a um acidente aéreo”, informou a empresa energética. “O fornecimento de energia já foi restabelecido nas sedes municipais de São José do Mantimento e Conceição de Ipanema, permanecendo interrompido para cerca de 24 mil clientes”, acrescentou o texto.
O sistema de informações aeronáuticas do aeroporto de Ubaporanga apontava a existência de torres de alta-tensão em montagem, oferecendo risco à aproximação. Um relatório divulgado nos dias 3 de julho e 13 de setembro, chamado Infotemp, apontou que as torres que estavam sendo instaladas violavam o plano básico de zona de proteção do aeroporto local.
Segundo a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), o avião da empresa da PEC Táxi Aéreo estava com a situação regular e com o Certificado de Verificação de Aeronavegabilidade (CVA) válido até 01/07/2022. A empresa tinha autorização para operar táxi-aéreo.
Jorge Leal Medeiros, professor de transporte aéreo e engenheiro aeronáutico, afirma que o bimotor King Air, um modelo que é produzido há quase 40 anos, funciona em perfeitas condições se estiver com a manutenção em dia. Ele elenca uma série de hipóteses para explicar a queda de um avião desse porte. “Dentre outros fatores, um avião pode cair por erro humano, questão meteorológica. Aparentemente, se parece com uma pane mecânica. O King Air é excelente se bem cuidado. Voa muito bem”, descreve. A partir das informações disponíveis até o momento, Medeiros acredita que o piloto pode ter tentado um pouso de emergência. “Pelo que consta, não tinha nevoeiro nem chuva forte. Parece que o piloto tentou posar de modo emergencial”, especula.
Medeiros lembra, ainda, que aeronaves de táxi-aéreo normalmente não têm caixa-preta, o que pode dificultar a investigação.
Irregularidades
A empresa de táxi-aéreo e o avião que transportou Marília Mendonça de prefixo PT-ONJ são alvo de denúncias. Tanto o Ministério Público Federal (MPF) em Goiás quanto a Agência Nacional de Aviação Civil receberam relatos de irregularidades. Em maio deste ano, procuradores elaboraram um documento a respeito da PEC Táxi Aéreo. “A empresa acumula irregularidades que coloca (sic) em risco tripulantes e passageiros, mesmo diante de denúncias repetidas à Anac, a empresa nunca passou por auditoria a fim de serem averiguadas as irregularidades”, diz trecho da manifestação do MPF.
Entre outros pontos, o texto indica ser “recorrente que a empresa coloque pilotos com jornada de voo estourada para voar, lançando mão do código da Anac de outro piloto com hora voo liberada”. Descreve, ainda, que “a aeronave PT-ONJ está desde o início do ano realizando voos com problemas no para-brisa, ocorrendo que o vidro fica embaçado com prejuízo visual em pousos e decolagens, fato conhecido pela empresa, porém ignorado, já denunciado à Anac, porém sem vistoria feita”.
O Correio tentou contato com a PEC Táxi Aéreo, mas não obteve sucesso.
Memória
Acidentes fatais com artistas
Cristiano Araújo
Em 2015, o cantor Cristiano Araújo, 29 anos, morreu após capotamento do carro onde estava com a namorada, Allana Moraes. Eles voltavam de um show em Itumbiara (GO). Os dois faleceram em Morrinhos. O motorista e o empresário do artistas sobreviveram. Uma multidão acompanhou o sepultamento. As investigações apontaram que Cristiano e a namorada estavam sem cinto, e o veículo trafegava a cerca de 180km/h quando o pneu estourou. Henrique Bahia, um dos produtores de Cristiano Araújo, trabalhava com Marília Mendonça e está entre as vítimas do acidente aéreo que matou a cantora.
Gabriel Diniz
Em 27 maio de 2019, a queda de um avião em Sergipe pôs fim à vida do cantor e compositor Gabriel Diniz, 28, intérprete do sucesso Jenifer. Em outubro de 2020, um relatório do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) apontou que as condições meteorológicas adversas e a indisciplina dos pilotos levaram à queda da aeronave. Na ocasião, morreram também os pilotos Linaldo Xavier e Abraão Farias.
Mamonas Assassinas
Os Mamonas Assassinas, banda formada por Dinho, Bento, Samuel, Sérgio e Júlio, também tiveram a vida interrompida de forma abrupta em um acidente aéreo. O grupo viajava em um jato executivo Learjet 25D, que caiu em São Paulo, em 2 de março de 1996. Eles voltavam de um show em Brasília e iam para o aeroporto de Guarulhos, mas, na aterrissagem, o avião arremeteu e se chocou contra a Serra da Cantareira. Em consequência do violento impacto, a aeronave explodiu. O enterro dos músicos reuniu 65 mil fãs.
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