É uma rotina aterradora a do solitário e inabalável protagonista de Halloween, uma das franquias mais retroalimentadas da história do terror no cinema. Criação de John Carpenter e Debra Hill, Michael Myers atormenta, desde 1978, os cinéfilos: sem expressão, sob uma máscara branca, acumula pilhas e pilhas de vítimas. Aparentemente, seus atos não apresentam claras motivações. Luto e medo assentam a trajetória de Myers.
Há três anos, mundo e bilheterias se dobraram à perspectiva do diretor David Gordon Green em reavivar o terror setentista. O sucesso rendeu o passaporte para que Myers ressurja em Halloween kills: O terror continua. De modo claro, o momento dos novos ataques de Myers, 40 anos depois, situam o espectador mais desavisado: o homem sem face, bastante associado ao bicho-papão, se vale do que estiver à mão, a favor da matança desenfreada. Quebra pescoços, usa da força extremada e até revida ataques com motosserra. Em suma, é um superpredador, incapaz de angariar empatia, pelo que sublinha um personagem central da fita.
Num recurso certeiro das continuações cinematográficas, um dos grandes chamarizes de Halloween é a atriz Jamie Lee Curtis, que vive a heroína Laurie Strode; mas, neste novo capítulo do filme de horror, ela fica no banco de reservas. Ao lado da filha Karen (Judy Greer) e da neta Allyson (Andi Matichak), Laurie desponta como a pessoa mais interessada na morte de Michael Myers. Moribunda, num hospital, porém, parece ter pouco a fazer.
Em compensação à lacuna, a pacata cidade de Haddonfield (Illinois) que tem Myers como persona non grata abriga uma lista de antigos desafetos do vilão, e que são realinhados em Halloween kills. Daí, a entrada em cena do ator Anthony Michael Hall, no papel de Tommy, o antigo menino traumatizado pela existência do mascarado. Ao lado de personagens como Lindsey, Marion e Lonnie, Tommy conclama os moradores, ao bradar coisas como “Ele precisa morrer” e “O mal morre hoje”. Tudo na linha de uma senha para a vingança com as próprias mãos.
A armação deste prometido massacre, que tem adesão de horda de moradores incontidos numa histeria coletiva, quase realoca o gênero do terror Halloween kills para um filme-catástrofe. O terror gráfico, estimulado pelo homem capaz de afundar olhos com as próprias mãos, encontra oposição à altura na multidão de exaltados. Uma das figuras bastante pertinentes, nas idas e vindas temporais do novo filme, segue sendo o policial Hawkins (em papel dividido por Thomas Mann e Will Paton).
Ao passo em que anuncia “as pessoas” estarem enlouquecidas, a própria personagem Karen assume uma postura nada pacífica. Com cenas brutais, em que despontam estilhaços de lâmpada, pessoas semivivas e uso violento de taco de beisebol, impressiona a capacidade de o diretor colocar em cena personagens divertidos como os gays Big John (Scott MacArthur) e Little John (Michael McDonald). Um pequeno aceno de trégua.