OBITUÁRIO

Morre, aos 88 anos, Jean-Paul Belmondo astro francês da Nouvelle Vague

O francês Jean-Paul Belmondo se tornou emblema da Nouvelle Vague e deu vida a personagens imortais em Acossado e O demônio das onze horas

Ricardo Daehn
postado em 07/09/2021 06:00
Ator foi um ícones da renovação do cinema a partir do fim da década de 1950
 -  (crédito: PHILIPPE MERLE)
Ator foi um ícones da renovação do cinema a partir do fim da década de 1950 - (crédito: PHILIPPE MERLE)

Brasília recém-fundada foi sede para sequências clássicas nas quais um dos maiores ícones da renovação do cinema, o astro Jean-Paul Belmondo, que morreu ontem, aos 88 anos, extravasasse seu destemido talento. Foi no ano de 1963, ao estilo James Bond, que Belmondo pôs à prova o equilíbrio, na pele de Adrien, destacado para libertar a sequestrada Agnès (Françoise Dorléac), no clássico O homem do Rio, de Phillipe de Broca. Na aventura era possível identificar o traçado da Rodoviária, a Esplanada dos Ministérios e o Palácio da Alvorada. Com estrondoso sucesso, o filme integrou uma das 90 produções estreladas por Belmondo. De acordo com informações de seu advogado, o ator morreu “tranquilamente”, em Paris.

Formado pelo Conservatório de Artes Dramáticas e com ampla vivência teatral, ele ganhou as telas do cinema na espirituosa ruptura de convenções propostas pelo estreante cineasta Jean-Luc Godard, em Acossado (1959). A partir do roubo de um carro, o protagonista Michel mata um policial e, dando partida ao cunho da Nouvelle Vague, corre para o amor encontrado em Patrícia (Jean Seberg), candidata à intelectual que habita os Champs Élysées.

Na rota de fuga de Michel está o refúgio num apartamento parisiense e o remodelar (na tela) do ídolo dele: Humphrey Bogart. Entre o frescor da linguagem de cinema, a rebeldia constituída por Belomondo encontra pares em James Dean e Marlon Brando. Numa escalada estrondosa, o ator trintão assinou a autobiografia, em 1963, chamada de 30 anos e 25 filmes.

Até o acidente vascular cerebral que praticamente o tirou de cena, em 2001, Bébel, como era carinhosamente conhecido, se estabeleceu como um dos maiores ícones do cinema. Ex-candidato a boxeador, nascido em Neuilly-sur-Seine (nas adjacências de Paris), ele era filho de pai escultor e mãe pintora. Símbolo do que seja um anti-herói, Belmondo estrelou para Godard O demônio das onze horas (1965).

Ainda que Godard tenha pavimentado a carreira de Belmondo, com quem trabalhou no provocativo Uma mulher é uma mulher (1961), Belmondo abraçou a diversidade de papéis. Numa das interpretações mais emotivas, estrelou Um homem e seu cachorro (2008), que demarca a derrocada de um idoso numa sociedade cruel (e cujo roteiro já havia rendido o clássico Umberto D., de Vittorio de Sica). Esse mesmo diretor italiano escalou Belmondo para Duas mulheres (1961), capaz de render Oscar para Sophia Loren, e que, baseado em texto de Alberto Moravia, tratava da invasão à Itália na Segunda Guerra.

Potência cênica

Em 1966, sob a direção do gênio René Clement, Belmondo teve seu momento em Paris está em chamas?, no relato da ocupação nazista, com elenco estrelado, que trazia dezenas de astros como Kirk Douglas, Orson Welles e Jeannne Moreau, com quem Belmondo esteve novamente, sob a direção de Paul Brook, em Moderato contabile (1960), numa trama de amor e violência emanada por texto de Marguerite Duras.
Numa carreira seletiva, Belmondo filmou com gênios como Agnès Varda (One hundred and one nights) e Alain Resnais (Stavisky, 1974), tendo vencido prêmios como a Palma de Honra em Cannes (2011) e o tributo pela obra de uma vida, no Festival de Veneza (2016). Com o longa-metragem Itinerário de um aventureiro (1989, de Claude Chabrol) venceu o prestigiado César de melhor ator, encarando a trajetória de um empresário que repensa a vida a partir de uma viagem para a África.

Além de um retorno aos palcos, os anos de 1990 viram Belmondo brilhar como o clássico personagem Jean Valjean de Os miseráveis, sob direção de Claude Lelouch. O pai (na vida real) de Patricia, Florence, Stella e Paul, ele foi cogitado para uma releitura de Casablanca.

Exemplo de um astro capacitado a projetar insuspeita sensualidade, Jean-Paul Belmondo, seguiu pela carreira, estabelecendo tipos durões, como em Borsalino (1970), no qual dividiu a estilosa cena de gângster com o colega Alain Delon; brilhando ao lado de beldades como Jacqueline Bisset, em O magnífico (1973) ou dando vida a um agente especial traído, em O profissional (1981).

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Adeus ao mestre do piano

 (crédito: TV Brasil/Reprodução)
crédito: TV Brasil/Reprodução

Morreu, na manhã de ontem, aos 76 anos, o pianista João Carlos de Assis Brasil, em Niterói (RJ). O artista estava internado desde a sexta-feira, em decorrência de um infarto. Nascido em agosto de 1945, no Rio de Janeiro, sua trajetória do músico conhecido pela versatilidade começou ainda criança, quando iniciou os estudos no Conservatório Brasileiro de Música. Lá, se formou em piano, harmonia e teoria musical. Aos 15 anos, tocava acompanhado de orquestras. Foi aluno de Jacques Klein e estudou piano no exterior, em lugares como Londres e Paris.
Em Viena, foi o terceiro colocado no Concurso Internacional Beethoven de 1965. Aproveitou o período na capital austríaca para aperfeiçoar piano com os professores Richard Hauser e Dieter Weber, tocando ainda com a Filarmônica de Viena. Wigmore Hall de Londres, a Sala Brahms de Viena e o auditório da Família Meneghine, em Milão, são algumas das salas importantes da Europa que testemunharam a genialidade das apresentações de João na década de 1970.
De volta ao Brasil, na década seguinte, o contato com a pianista Clara Sverner fez com que ele começasse a interpretar sistematicamente autores brasileiros que, até então, eram vistos como menos importantes para a música, como Ernesto Nazareth, o que possibilitou uma forma de enxergar todo o período chamado Belle Époque carioca, do início do século 20.
Assis Brasil também exerceu a magistratura na música. Ministrava aulas no Conservatório Brasileiro de Música e no Conservatório de Niterói. Foi professor durante muitos anos na Escola de Música Villa-Lobos, no centro do Rio. Em 2019, gravou, em um dos auditórios da escola, o álbum João Carlos Assis Brasil Clássico, cujo repertório reúne compositores da música clássica como Chopin, Liszt, Debussy e Tchaikovsky. A instituição prestou homenagens ao pianista pelas redes sociais. “Era uma lenda viva do piano brasileiro”, diz a publicação.

*Estagiário sob a supervisão de José Carlos Vieira

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