Com apenas 21 anos, em menos de seis deles, o ator Christian Malheiros construiu um currículo sólido: associado a profissionais como KondZilla, Fernando Meirelles e Selton Mello, ele vive um momento de evidência em séries e filmes. “Foi uma costurada louca que me trouxe o grande orgulho de estar na carreira e encontrar pessoas tão iluminadas”, observa ele, que tomou parte da série Sintonia, que chegará à segunda temporada, e Sessão de terapia, além de atuar em Colônia. Neste último, sob a direção de André Ristum, ele dá vida a um guerrilheiro “jogado num manicômio e que luta para escapar dos terrores psicológicos e físicos”.
Formado em teatro, Christian diz nunca ter almejado o cinema, mídia que, com o filme Sócrates, o colocou em vitrine internacional, e na disputa pelo prêmio Film Independent Spirit Awards, com Joaquin Phoenix e Ethan Hawke. “Era 2019: existia vida, existiam abraços e existiam beijos (risos). O evento foi em Santa Mônica, na praia, e eu não acreditava na magnitude daquilo. A celebração do encontro me deixou mais feliz do que a possibilidade de prêmio: fiquei mais de observador, estava nos Estados Unidos, bebendo champagne e estava ótimo”, diverte-se.
Atualmente, às terças-feiras, Christian desponta em Sessão de terapia, na pele do motoboy Tony, com episódios gravados no auge da pandemia. “É um personagem que veio para me transformar. Ao falar dele, percebi que falava de mim: com feridas, com invisibilização. Posso interpretar um menino de 21 anos, milionário. Mas sempre será: um menino de 22 anos, milionário, negro. Isso trará eternas discussões”, explica. Pelos olhos do ator, Tony revelou um serviço essencial, e cada vez mais precarizado. Também notou que distúrbios mentais não são elitizados.
De dentro de casa, Christian analisou fundo os motoboys imprescindíveis para o sustento de famílias. “Me acalmei, e vi os privilégios que tenho”, salienta. Em Sintonia (série da Netflix), o protagonista Nando, vivido pelo ator, que vai de uma vida “comum” na periferia ao mundo do crime, o que também aguça o espírito crítico de Christian. “Há jovens que querem se sentir alguém, e caem nesse mundo (da ilegalidade)”, pontua. Esbaldada no funk, a série também dá relevância para um movimento legítimo, o funk, que tem raízes e representa uma galera. A vala aberta na rua, que é cantada, está sendo vista; se eles vissem flores, cantariam de flores. Sou contra a gourmetização da parada do funk”, diz.
Escravidão e juventude
Ainda sem título definido, Alex Moratto dirigiu um filme para a Netflix, encerrado uma semana antes do estouro da pandemia, que coloca Christian Malheiros ao lado de Rodrigo Santoro, numa trama que trata de trabalho análogo à escravidão. Saído dos teatros de Santos até a chegada em São Paulo, Christian não pensava em virar um astro de cinema, daí a dose de identidade junto a alguns papéis. “Eu sabia das dificuldades. Sou da periferia, filho de retirantes nordestinos que saíram do interior da Bahia. Em Santos, era de periferia. O teatro me salvou, talvez tivesse seguido caminho de personagens que vemos no cinema nacional”, relata.
Aproveitando a boa fase, ele ainda deve estrelar a comédia do brasiliense Matheus Souza, A última festa, a primeira da carreira — em que jovens vivem dúvidas ao término do ensino médio — e acompanha o lançamento da série Os ausentes (pela HBO Max), que trata de uma organização na lida de casos criminais sem acionar a polícia. “É muito difícil a relação da polícia com a população negra, pobre e periférica. Vemos que a bala perdida sempre tem um alvo certo. Sempre é o corpo negro, o corpo marginalizado. Sem generalizações, sem a polícia, numa sociedade que não entende o limite de cada um, seria possível que a gente tivesse explodido. Mas, há uma filosofia do estado que é errada: o Estado está para matar, e a polícia executa”, conclui.
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