Na 74ª edição, o Festival de Cannes começa amanhã, numa dinâmica presencial, na qual as máscaras dos participantes só serão retiradas para o alvoroço dos fotógrafos que acompanharão as sessões prestigiadas por equipes de 24 filmes em competição. Diluída em várias mostras itinerantes pela Europa, ano passado, a seleção de 2020 não projetou a costumeira cobertura da imprensa internacional. Agora, com anunciada testagem em massa de convidados e deslocado para julho, o festival se recompõe, renovando o cenário de negociações de filmes por empresas globais. O evento ocorrerá até o dia 17.
A visibilidade brasileira está reservada para a sessão especial do longa O marinheiro das montanhas, do cearense Karim Aïnouz, formado na Universidade de Brasília (UnB). Ele, que já venceu a mostra Um Certo Olhar (com A vida invisível), comparece para exibir uma jornada biográfica rumo à Argélia em que nasceu o pai. Também do Nordeste, o diretor pernambucano Kleber Mendonça Filho (que competiu, em Cannes, por Aquarius, e venceu com o codiretor Juliano Dornelles, o Prêmio do Júri, em 2019, por Bacurau) está no corpo de nove jurados, junto com o senegalês Mati Diop e a atriz Maggie Gyllenhaal, todos capitaneados por Spike Lee. Na função de presidente do júri. Lee até estampa o cartaz de chamamento de Cannes. Com a projeção de dois filmes cancelada, ano passado, o cineasta negro Steve McQueen (12 anos de escravidão) desponta como convidado especial.
Com pouco espaço para cinematografias latino-americanas na competição, o evento trará mais Brasil, por meio das destacadas coproduções O empregado e o patrão (na Quinzena dos Realizadores) e Noche de fuego (no segmento Um Certo Olhar), este detido na violência de meninas roubadas no meio rural mexicano. Do México, La civil, assinado por Teodora Ana Mihai, leva o drama de sequestro motivado por drogas, em uma das mostras paralelas.
Na mostra central, poucas mulheres competirão pela Palma de Ouro, a mais destacada premiação de Cannes. Pelo conjunto da obra, a atriz e diretora Jodie Foster foi escolhida para honorária especial. Já na disputa por prêmios, competem a húngara Ildikó Enyedi (de The story of my wife, com Léa Seydoux e Louis Garrel) e três francesas. Catherine Corsini aborda uma crise dentro de hospital; Julia Ducournau traz uma trama de reencontro entre pai e filho e há Mia Hansen-Love que, associada ao produtor brasileiro Rodrigo Teixeira, trata de envolvimento e o fazer artístico de um casal de cineastas abrigado em Farö, a famosa morada do diretor sueco Ignmar Bergman.
Donos da bola?
Entre os 20 títulos comandados por homens, se repete o recorte de muitos dramas individuais e tramas que revelam o poder da arte e do jornalismo, casos de Wes Anderson e seu A crônica francesa, com estrelas como Frances McDormand e Benicio del Toro, e do novo longa de Bruno Dumont, que compete pela quinta vez. Outros recorrentes diretores que frequentam Cannes baterão ponto: Sean Penn (Flag day), Asghar Farhadi (A hero) e Nanni Moretti (Three floors).
O israelense Nadav Lapid trará dois filmes: The star (sobre uma fã obcecada em beijar uma atriz, mesmo em meio à pandemia), e, na competitiva Ahed´s knee, sobre um cineasta que depara com a morte da mãe. Também de Israel, Ari Folman (Valsa com Bashir) trará, fora de competição, a animação Where is Anne Frank, em torno de Kitty, a amiga imaginária da célebre escritora.
Personalidades e astros não faltarão em Cannes. Matt Damon estrela Stillwater (do ganhador do Oscar Tom McCarthy) e, in memoriam, o roteirista Jean-Claude Carrière estará representado pela parceria com Louis Garrel (The crusade), enquanto o diretor Marco Bellochio, a atriz e cantora Jane Birkin e o polêmico Oliver Stone (com mais um filme sobre o crime contra John F. Kennedy) estão previstos para comparecerem à festa.
Alguns destaques
Annette, de Leos Carax
Selecionado para a abertura, o longa francês mostra artistas (interpretados por Adam Driver Marion Cotillard) estarrecidos com a chegada da primeira filha, tudo numa narrativa musical embalada pela dupla pop Sparks.
Benedetta, de Paul Verhoeven
Depois de competir com os potentes Instinto selvagem e Elle, o holandês volta ao páreo contando, no elenco, com Charlotte Rampling envolta em enredo que revela os prazeres homossexuais de uma freira.
Tudo correu bem, de François Ozon
Na quarta corrida pela Palma de Ouro, o francês mostra o drama de uma filha (Sophie Marceau), cujo pai padece numa cama de hospital, após um derrame. No festival que traz filmes sobre aborto (Lingui) e bipolaridade (The restless), Ozon trata de eutanásia.
Les Olympiades, Jacques Audiard
Depois de vencer a Palma de Ouro (Dheepan) e o Grande Prêmio (O profeta), Audiard conta com roteiro apoiado por Céline Sciamma (Retrato de uma jovem em chamas).
O filme traz uma ciranda de sentimentos entre três mulheres e um homem.
Memoria, de Apichatpong Weerasethakul
Uma apaixonada por orquídeas e uma arqueóloga, durante temporada na Colômbia, se vêm impactadas pelas origens de atormentadores ruídos. Tilda Swinton estrela o longa do tailandês vencedor da Palma de Ouro em 2010.
Outras participações brasileiras
Longas
Medusa, de Anita Rocha da Silveira (Quinzena dos Realizadores)
Murina, de Antoneta Alamat Kusijanovic (Quinzena dos Realizadores / coprodução Brasil, Croácia, EUA e Eslovênia)
Curtas em competição
Céu de agosto, de Jasmin Tenucci
Sideral, de Carlos Segundo
Cantareira, de Rodrigo Ribeyro (Mostra Cinéfondation)
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