Depois de um ano de isolamento, dúvidas sobre a capacidade de manter o espaço em funcionamento e muita angústia quanto ao futuro, os idealizadores da galeria Pé Vermelho, em Planaltina, inauguram a exposição Fazer caminhos, gestada graças ao auxílio emergencial proporcionado pela Lei Aldir Blanc.
Em cartaz até 26 de junho, e com obras de sete artistas, a exposição é fruto de discussões, pesquisas e reflexões que pautaram os autores desde o início da pandemia. Não há, como explica João Angelini, um dos integrantes do grupo, um recorte curatorial que alinhe as obras, mas é possível perceber uma preocupação comum entre os artistas. “Foi um ano de produção, discussão e acompanhamento”, avisa.
“Os trabalhos foram produzidos no processo de troca e cada artista disponibilizou o que interessava. Curiosamente, quando vimos tudo junto, percebemos as aproximações desdobradas do foco de nossas discussões, que têm a ver com produzir numa posição periférica no sistema de arte.”
Refletir sobre como artistas distantes dos grandes centros são excluídos do mercado e da cena nacional é um movimento constante entre os membros da Pé Vermelho. De Planaltina, uma periferia que também tem um contexto colonial e histórico forte no Centro-Oeste, eles observam as cenas hegemônicas com uma certa distância para extrair parte de suas narrativas. “Temos uma organização colonial bandeirante que sujeita o resto do Brasil à precariedade e os trabalhos falam muito desse lugar”, explica Angelini.
Para reforçar essa posição, eles convidaram Arnaldo de Castro, professor de história em Planaltina, correspondente da Mídia Ninja e criador de um podcast, para fazer o texto sobre a exposição. A intenção foi, mais uma vez, romper com rituais estabelecidos na cena artística contemporânea em que curadores são convidados a escolher obras de acordo com um recorte pessoal e a tecer entre elas laços que justifiquem a seleção. “Arnaldo sequer nos conhecia antes de ver a exposição montada, então ele tem uma perspectiva muito curiosa e preciosa”, destaca Angelini.
Alguns dos trabalhos mostrados em Fazer caminhos, como os de Angelini e de Luciana Paiva, são desdobramentos de uma pesquisa íntima que começa antes mesmo da situação pandêmica e passa por processo de amadurecimento e mudança técnica durante o período. As obras têm um aspecto íntimo fortemente ligado a questões biográficas dos autores. No caso de Shevan Lopes, a religião tem grande influência nas peças construídas com materiais recolhidos na rua, mesma sistemática adotada por Marcela Campos e suas elegantes esculturas de parede.
Raissa Studart tem o próprio corpo como ponto de partida para situações escultóricas que envolvem monotipias, bordados e molduras improvisadas, uma lembrança de que, isolada, ela ficou também privada dos acabamentos impecáveis de molduras encomendadas.
Douglas Ferreira trabalha com relações, memória e ancestralidade. “Como homem preto, piauiense que se muda para Planaltina, ele vai retratar essa memória da própria trajetória dele”, avisa Angelini. Rafael da Escóssia, que é formado em direito e traz dessa área boa parte da reflexão presente em suas produções, se apropria de um trabalho antigo e o apresenta junto a uma obra nova.
Fazer caminhos — Exposição com João Angelini, Luciana Paiva, Rafael da Escóssia, Douglas Ferreira, Shevan Lopes, Marcela Campos e Raissa Studart. Visitação até 26 de junho, na Galeria Pé Vermelho (Praça São Sebastião, Quadra 59, Lote 3, Planaltina)
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